SE É QUE NÃO CONTINUA A FAZÊ-LO AINDA HOJE
Agora começo a entender por que é que o Antigo Testamento não figura na maior parte das bíblias que andam por aí.
É que aquilo (o Antigo Testamento), pelo menos na sua parte inicial, o Génesis, é um forrobodó desgraçado com truca-truca a torto e a direito: irmão com irmã, filhas com pai, cunhado com cunhada, patrão com serva, enfim... uma cegada dos diabos capaz de pôr a cabeça à roda a qualquer praticante religioso e a afastá-lo definitivamente de qualquer ideia moral veiculada pelas religiões que conhecemos hoje. Mal um homem via uma mulher soltava-se-lhe o verbo e a "espada": quero possuí-la (quando não a possuía de imediato). O verbo possuir (significando truca-truca) é, aliás, frequentemente empregue nesta parte do Génesis. Mas tudo acontecia sob o olhar atento do SENHOR que muitas vezes falava com os seus filhos; como quando falou a Abrão: Far-te-ei fecundo extraordinariamente, de ti farei nações, e reis procederão de ti [Génesis 17.6].
Eis apenas dois exemplos paradigmáticos do que acabámos de dizer:
Génesis 19 [Descrição de um incesto]
30 Subiu Ló de Zoar e habitou no monte, ele e suas duas filhas, porque receavam permanecer em Zoar; e habitou numa caverna, e com ele as duas filhas.
31 Então, a primogénita disse à mais moça: Nosso pai está velho, e não há homem na terra que venha unir-se connosco, segundo o costume de toda a terra.
32 Vem, façamo-lo beber vinho, deitemo-nos com ele e conservemos a descendência de nosso pai.
33 Naquela noite, pois, deram a beber vinho a seu pai, e, entretanto a primogénita, se deitou com ele, sem que ele o notasse, nem quando ela se deitou, nem quando se levantou.
34 No dia seguinte, disse a primogénita à mais nova: Deitei-me, ontem, à noite, com o meu pai. Demos-lhe a beber vinho também esta noite; entra e deita-te com ele, para que preservemos a descendência de nosso pai.
35 De novo, pois, deram, aquela noite, a beber vinho a seu pai, e, entrando a mais nova, se deitou com ele, sem que ele o notasse, nem quando ela se deitou, nem quando se levantou.
36 E assim as duas filhas de Ló conceberam do próprio pai.
Génesis 34 [Descrição de uma violação]
1 Ora, Diná, filha que Lia dera à luz a Jacó, saiu para ver as filhas da terra.
2 Viu-a Siquém, filho do heveu Hamor, que era príncipe daquela terra, e, tomando-a, a possuiu e assim a humilhou.
Mas este arrebate do príncipe Siquém não ficou em águas de bacalhau: dois dos muitos irmãos de Diná, Simeão e Levi, armaram-lhe uma cilada e comandaram um pequeno exército que vingou a honra da irmã violada: entraram na cidade, dizimaram todos os homens que lá habitavam, incluindo o fogoso príncipe Siquém e o rei Hamor, seu pai.
Bem, vamos continuar a leitura da bíblia...
De todo o modo pensemos no seguinte: naquele tempo, vivendo aquelas tribos nómadas, de pastores, em tendas ou debaixo das árvores, tendo por actividade a caça e a pastorícia com a finalidade principal de se alimentarem; ficando ao fim do dia uns a olhar para os outros, sem cinema, sem televisão, sem livros para ler, sem música para ouvir, sem nada de nada para fazer; o que é que seria de esperar senão um pensamento ― truca-truca.
Pois então!...
quinta-feira, 31 de maio de 2007
terça-feira, 29 de maio de 2007
domingo, 27 de maio de 2007
OS TEMPOS DO MEDO
Decretos-lei do Salazarismo
O decreto 27 003 de 15 de Setembro de 1936 determinava: «Para admissão a concurso nomeação efectiva ou interina, assalariamento, recondução, promoção ou acesso, comissão de serviço, concessão de diuturnidades e transferência voluntária, em relação aos lugares do estado e serviços autónomos, bem como dos corpos e corporações administrativos, é exigido o seguinte documento com assinatura reconhecida: Declaro por minha honra que estou integrado na ordem social estabelecida pela Constituição Política de 1933, com activo repúdio do comunismo e de todas as ideias subversivas».
E, mais adiante: «Os directores e chefes dos serviços serão demitidos, reformados ou aposentados compulsivamente sempre que algum dos respectivos funcionários ou empregados professe doutrinas subversivas, e se verifique que não usaram da sua autoridade ou não informaram superiormente».
O decreto 27 003 de 15 de Setembro de 1936 determinava: «Para admissão a concurso nomeação efectiva ou interina, assalariamento, recondução, promoção ou acesso, comissão de serviço, concessão de diuturnidades e transferência voluntária, em relação aos lugares do estado e serviços autónomos, bem como dos corpos e corporações administrativos, é exigido o seguinte documento com assinatura reconhecida: Declaro por minha honra que estou integrado na ordem social estabelecida pela Constituição Política de 1933, com activo repúdio do comunismo e de todas as ideias subversivas».
E, mais adiante: «Os directores e chefes dos serviços serão demitidos, reformados ou aposentados compulsivamente sempre que algum dos respectivos funcionários ou empregados professe doutrinas subversivas, e se verifique que não usaram da sua autoridade ou não informaram superiormente».
sexta-feira, 25 de maio de 2007
CAVACO – 1 VITAL – 0
O Presidente da República, questionado sobre as declarações do ministro Mário Lino, não esteve com paninhos quentes e disse esperar:
«Que seja feito um esforço para que se alcance um consenso técnico para a localização mais adequada do novo aeroporto». Que «Seria altamente benéfico para o país que a Assembleia da República realizasse um debate aprofundado sobre este projecto com base em estudos realizados por organizações e instituições competentes, dado o impacto para gerações futuras.»
Estas declarações do Presidente da República contrastam radicalmente com as posições do Governo e com declarações de Vital Moreira, apoiante visivelmente incondicional do Governo, que disse isto:
«esta é uma decisão essencialmente política. O aeroporto é uma decisão demasiado importante para ser decidida por técnicos.»
As declarações do Presidente da República vêm colocar a discussão sobre a localização do futuro aeroporto no ponto de equilíbrio que Governo e Vital diziam de há muito já ter sido ultrapassado.
Como se vê, para Cavaco Silva, a decisão não é iminentemente política coisa nenhuma. Mas técnica. E parece que não confere aos estudos já feitos o carácter definitivo que Governo e seus apaniguados parecem querer impor à opinião pública.
«Que seja feito um esforço para que se alcance um consenso técnico para a localização mais adequada do novo aeroporto». Que «Seria altamente benéfico para o país que a Assembleia da República realizasse um debate aprofundado sobre este projecto com base em estudos realizados por organizações e instituições competentes, dado o impacto para gerações futuras.»
Estas declarações do Presidente da República contrastam radicalmente com as posições do Governo e com declarações de Vital Moreira, apoiante visivelmente incondicional do Governo, que disse isto:
«esta é uma decisão essencialmente política. O aeroporto é uma decisão demasiado importante para ser decidida por técnicos.»
As declarações do Presidente da República vêm colocar a discussão sobre a localização do futuro aeroporto no ponto de equilíbrio que Governo e Vital diziam de há muito já ter sido ultrapassado.
Como se vê, para Cavaco Silva, a decisão não é iminentemente política coisa nenhuma. Mas técnica. E parece que não confere aos estudos já feitos o carácter definitivo que Governo e seus apaniguados parecem querer impor à opinião pública.
BIZARRO OU TALVEZ NÃO
Isto até dá vontade de aplaudir masoquistamente o Governo e dizer-lhe: acaba já connosco que a gente agradece.
Mas também é caso para dizer, parafraseando Bertolt Brecht:
Porque manifestamente há uma nítida dicotomia entre o povo que escreve e fala e o povo que vota,
Dissolva-se o povo e eleja-se outro.
Mas também é caso para dizer, parafraseando Bertolt Brecht:
Porque manifestamente há uma nítida dicotomia entre o povo que escreve e fala e o povo que vota,
Dissolva-se o povo e eleja-se outro.
quinta-feira, 24 de maio de 2007
AI PORTUGAL PORTUGAL
Com a etiqueta «Coisas que vão ser proibidas» Francisco José Viegas escreve isto no A Origem das Espécies:
Bons tempos em que «as donas de casa» tinham listas de compras sensatas e compreensivas. Isto sim, era harmonia familiar. (Maria Cabral, em 1969, no anúncio ao brandy Macieira: «Até o brandy é ela quem escolhe... e bom!»)
Vá até lá e veja também a fotografia que ilustra a posta.
Bons tempos em que «as donas de casa» tinham listas de compras sensatas e compreensivas. Isto sim, era harmonia familiar. (Maria Cabral, em 1969, no anúncio ao brandy Macieira: «Até o brandy é ela quem escolhe... e bom!»)
Vá até lá e veja também a fotografia que ilustra a posta.
ERA SÓ O QUE FALTAVA
TER MEDO DE ESCREVER OU DE FALAR
António Lobo Xavier disse-o ontem para quem o quis ouvir, no programa da SIC Notícias, “Quadratura do Círculo”: que tem relatos de empresas e de serviços onde o correio electrónico e a actividade “teclada” (o verbo é meu, não dele, mas sintetiza o que ele disse) do pessoal que neles trabalha são rastreados sendo que certas decisões sobre esse mesmo pessoal são tomadas tendo em conta o perfil traçado a partir dessa devassa (devassa criminosa, digo eu ― ia escrever “inominável”, certamente com o medo inconsciente de agravar ainda mais o meu perfil, cujo estará talvez a ser traçado por um serviço qualquer destinado a “fotografar” a blogosfera e a catalogar os “blogadores” segundo uma taxonomia política e doutrinariamente, senão inspirada nas, pelo menos parecida às cartilhas de Hitler e de Salazar ― ).
Mas... que se lixe! Não tive medo nos tempos do Fascismo e do Colonialismo; e não é hoje, em pleno regime cada vez mais dito democrático, que vou ter medo de escrever o que penso.
E digo daqui a Lobo Xavier: olhe que conheço pessoas que têm hoje medo de dizer o que pensam. É triste, é revoltante e é inadmissível ― é, sim senhor ― mas é uma realidade neste Portugal que há 33 anos se libertou do fascismo.
É precisa muita testosterona para se viver hoje de coluna direita em Portugal.
E é preciso não esquecer que desde sempre grandes inimigos da liberdade foram pessoas que se diziam sua defensora.
E termino esta posta citando Almeida Garrett (sublinhado meu):
«O exemplo da grande nação, e nossas proprias desgraças nos devem convencer de que sem liberdade de imprensa (e jurados para os seus processos) e sem grandes nacionaes (para a defenderem), a liberdade é chimerica; e todas as instituições, por mais livres que sejam, em vez de beneficio, são uma calamidade pública, um laço armado ao patriotismo, um novo instrumento dado á oppressão, um escudo traidor que só cobre os inimigos da liberdade, e a seus amigos só esmaga.»
Almeida Garrett,
in "Portugal na Balança da Europa".
1830
António Lobo Xavier disse-o ontem para quem o quis ouvir, no programa da SIC Notícias, “Quadratura do Círculo”: que tem relatos de empresas e de serviços onde o correio electrónico e a actividade “teclada” (o verbo é meu, não dele, mas sintetiza o que ele disse) do pessoal que neles trabalha são rastreados sendo que certas decisões sobre esse mesmo pessoal são tomadas tendo em conta o perfil traçado a partir dessa devassa (devassa criminosa, digo eu ― ia escrever “inominável”, certamente com o medo inconsciente de agravar ainda mais o meu perfil, cujo estará talvez a ser traçado por um serviço qualquer destinado a “fotografar” a blogosfera e a catalogar os “blogadores” segundo uma taxonomia política e doutrinariamente, senão inspirada nas, pelo menos parecida às cartilhas de Hitler e de Salazar ― ).
Mas... que se lixe! Não tive medo nos tempos do Fascismo e do Colonialismo; e não é hoje, em pleno regime cada vez mais dito democrático, que vou ter medo de escrever o que penso.
E digo daqui a Lobo Xavier: olhe que conheço pessoas que têm hoje medo de dizer o que pensam. É triste, é revoltante e é inadmissível ― é, sim senhor ― mas é uma realidade neste Portugal que há 33 anos se libertou do fascismo.
É precisa muita testosterona para se viver hoje de coluna direita em Portugal.
E é preciso não esquecer que desde sempre grandes inimigos da liberdade foram pessoas que se diziam sua defensora.
E termino esta posta citando Almeida Garrett (sublinhado meu):
«O exemplo da grande nação, e nossas proprias desgraças nos devem convencer de que sem liberdade de imprensa (e jurados para os seus processos) e sem grandes nacionaes (para a defenderem), a liberdade é chimerica; e todas as instituições, por mais livres que sejam, em vez de beneficio, são uma calamidade pública, um laço armado ao patriotismo, um novo instrumento dado á oppressão, um escudo traidor que só cobre os inimigos da liberdade, e a seus amigos só esmaga.»
Almeida Garrett,
in "Portugal na Balança da Europa".
1830
quarta-feira, 23 de maio de 2007
LÓGICA MAIS LÓGICA NÃO HÁ
É sabido que as maiorias absolutas tendem a levar ao poder absoluto; que o poder absoluto tende a levar à auto-suficiência; que a auto-suficiência, por sua vez, pode levar ao autismo e mesmo à reinvenção da realidade.
Hoje ouvi o ministro, Eng. Mário Lino, justificar mais ou menos assim a não construção de um aeroporto na Margem Sul ― cito de cor ―: não se pode construir um aeroporto na Margem Sul porque a Margem Sul não tem cidades; a Margem Sul não tem hospitais; a Margem Sul não tem gente.
Segundo os noticiários da tarde, terá ainda dito que a Margem Sul é um deserto e ninguém constrói um aeroporto num deserto.
Agora, você que me lê, considere os seguintes casos em que se aplica a lógica do senhor ministro Mário Lino e conclua por si:
1. Ninguém vai construir um aeroporto na Margem Sul porque a Margem Sul não tem cidades, não tem hospitais e não tem gente.
2. Ninguém vai construir uma cidade na Margem Sul porque a Margem Sul não tem hospitais, não tem tem gente e não tem aeroporto.
3. Ninguém vai construir um hospital na Margem Sul porque a Margem Sul não tem cidades, não tem gente e não tem aeroporto.
4. Ninguém vai morar para a Margem Sul porque a Margem Sul não tem cidades, não tem hospitais, não tem aeroporto e não tem gente.
Quase apetece perguntar: por quem me toma, hein? Por quem me toma!?
Nota para os que não conhecem Portugal: a Margem Sul é a margem sul do rio Tejo. Tem gente, tem muita gente; tem cidades, tem hotéis, tem comércio e tem hospitais.
Hoje ouvi o ministro, Eng. Mário Lino, justificar mais ou menos assim a não construção de um aeroporto na Margem Sul ― cito de cor ―: não se pode construir um aeroporto na Margem Sul porque a Margem Sul não tem cidades; a Margem Sul não tem hospitais; a Margem Sul não tem gente.
Segundo os noticiários da tarde, terá ainda dito que a Margem Sul é um deserto e ninguém constrói um aeroporto num deserto.
Agora, você que me lê, considere os seguintes casos em que se aplica a lógica do senhor ministro Mário Lino e conclua por si:
1. Ninguém vai construir um aeroporto na Margem Sul porque a Margem Sul não tem cidades, não tem hospitais e não tem gente.
2. Ninguém vai construir uma cidade na Margem Sul porque a Margem Sul não tem hospitais, não tem tem gente e não tem aeroporto.
3. Ninguém vai construir um hospital na Margem Sul porque a Margem Sul não tem cidades, não tem gente e não tem aeroporto.
4. Ninguém vai morar para a Margem Sul porque a Margem Sul não tem cidades, não tem hospitais, não tem aeroporto e não tem gente.
Quase apetece perguntar: por quem me toma, hein? Por quem me toma!?
Nota para os que não conhecem Portugal: a Margem Sul é a margem sul do rio Tejo. Tem gente, tem muita gente; tem cidades, tem hotéis, tem comércio e tem hospitais.
terça-feira, 22 de maio de 2007
JÁ CONHECI ESTE AR DE OUTROS TEMPOS
INFELIZMENTE
A sociedade comporta de tudo, como bem sabemos. Comporta, por exemplo, aqueles que lambem, lambem, lambem as botas do poder até a língua lhes cair ― à espera de uma benesse, uma prebenda, uma migalha do poder ― acabando muitas vezes por levar para casa... em vez de uma recompensa o desprezo a que o poder os vota.
Consta que Salazar referindo-se às vezes aos PIDES os chamava “aqueles sabujos”.
A sociedade comporta de tudo, como bem sabemos. Comporta, por exemplo, aqueles que lambem, lambem, lambem as botas do poder até a língua lhes cair ― à espera de uma benesse, uma prebenda, uma migalha do poder ― acabando muitas vezes por levar para casa... em vez de uma recompensa o desprezo a que o poder os vota.
Consta que Salazar referindo-se às vezes aos PIDES os chamava “aqueles sabujos”.
segunda-feira, 21 de maio de 2007
AH CÂ DI RÊÊÊÊÊÊ! . . . (*)
DELITO DE OPINIÃO PRIVADA. Leu bem: PRI – VA - DA
Afinal a coisa é ainda mais sórdida do que se pensava: a punição do professor que terá feito um comentário jocoso sobre a licenciatura do primeiro-ministro teve como causa a delação de que o mesmo foi alvo por parte de um colega com quem falara particularmente quando produziu o comentário proibido. O professor foi, portanto, punido com base numa conversa privada (tida A DOIS). Fiquei a saber isto agora mesmo através de Miguel Relvas, militante do PSD, intervindo no noticiário das 21 horas da SIC Notícias.
Isto é medonho.
Tenho a memória dos tempos de Salazar e Caetano em que a gente escolhia muito bem com quem falar porque senão poderia ser denunciado por um bufo qualquer como sendo «contra a situação» ou «contra a nação» e ser por isso preso e interrogado pela PIDE; e ou “julgado” e punido por delito de opinião.
O caso deste professor é semelhante mas mais sórdido ainda porque ao que parece cometeu um delito de opinião privada. Ou privadamente um delito de opinião. Em pleno Regime Democrático.
Isto é assustador.
Eu nem quero acreditar que possa ter acontecido.
E não quero acreditar que estou a viver no mesmo país onde isso se passou e se passa.
Isto é terrível.
Ah Câ Di Rêêêêêê! (*)
(*) Aqui D’el Rei.
Afinal a coisa é ainda mais sórdida do que se pensava: a punição do professor que terá feito um comentário jocoso sobre a licenciatura do primeiro-ministro teve como causa a delação de que o mesmo foi alvo por parte de um colega com quem falara particularmente quando produziu o comentário proibido. O professor foi, portanto, punido com base numa conversa privada (tida A DOIS). Fiquei a saber isto agora mesmo através de Miguel Relvas, militante do PSD, intervindo no noticiário das 21 horas da SIC Notícias.
Isto é medonho.
Tenho a memória dos tempos de Salazar e Caetano em que a gente escolhia muito bem com quem falar porque senão poderia ser denunciado por um bufo qualquer como sendo «contra a situação» ou «contra a nação» e ser por isso preso e interrogado pela PIDE; e ou “julgado” e punido por delito de opinião.
O caso deste professor é semelhante mas mais sórdido ainda porque ao que parece cometeu um delito de opinião privada. Ou privadamente um delito de opinião. Em pleno Regime Democrático.
Isto é assustador.
Eu nem quero acreditar que possa ter acontecido.
E não quero acreditar que estou a viver no mesmo país onde isso se passou e se passa.
Isto é terrível.
Ah Câ Di Rêêêêêê! (*)
(*) Aqui D’el Rei.
sábado, 19 de maio de 2007
DA NATUREZA HUMANA
No tempo da ditadura e da PIDE não se fazia melhor, quero dizer, pior do que isto: mostrar serviço sujo para cair nas boas graças de quem tem as rédeas do poder.
Para quem estiver distraído sempre lembro que estamos a 19 de Maio de 2007. Em pleno século XXI, portanto. E que no poder está um Governo de um partido político que se diz Socialista.
A terem as coisas passado como o relatado aqui, o comportamento desta tal de Margarida Elisa Santos Teixeira Moreira, directora regional de educação do Norte, bem como o do delator, é no mínimo retrógrado, abjecto, nojento e desprezível. E a mim dá-me vontade de vomitar para cima deles.
Para quem estiver distraído sempre lembro que estamos a 19 de Maio de 2007. Em pleno século XXI, portanto. E que no poder está um Governo de um partido político que se diz Socialista.
A terem as coisas passado como o relatado aqui, o comportamento desta tal de Margarida Elisa Santos Teixeira Moreira, directora regional de educação do Norte, bem como o do delator, é no mínimo retrógrado, abjecto, nojento e desprezível. E a mim dá-me vontade de vomitar para cima deles.
AI COMO É TRISTE A IGNORÂNCIA
Esta nossa formação cristã, que nos impregna a todos subtilmente até ao osso, quer queiramos ou não, é tramada como o diabo, sobretudo para os de nós que como eu são (leia bem isto que é Português correcto) ― dizia então ― é tramada como o diabo, sobretudo para os de nós que como eu são ignorantes dos “textos sagrados”, em última instância, da Bíblia, pois passamos certamente a vida a comportarmo-nos e a falarmos como cristãos sem nos darmos verdadeiramente conta de que o estamos a fazer. E convinha, no meu entender, que soubéssemos um pouco sobre este nosso comportamento de cristãos para melhor nos conhecermos e nos relacionarmos entre nós e com os outros que o não são.
Desconhecedor quase total de qualquer texto bíblico ― confesso, envergonhado, triste e humildemente, esta lacuna imperdoável na minha formação como pessoa humana e como cidadão do mundo ― fui objecto da oferta de uma Bíblia de Estudo Almeida, que em princípio abordará o Antigo e o Novo Testamentos (digo isto porque sabia que há outras bíblias que omitem o Antigo Testamento), editada pela Sociedade Bíblica do Brasil.
Pois bem, logo no início da leitura deste livro fiquei a saber que a conhecidíssima frase «separação das águas», por mim vastamente utilizada (e creio que por toda a gente), cuja origem e significado primordial eu desconhecia em absoluto, é uma frase bíblica que se encontra no Génesis:
«E disse Deus: Haja firmamento no meio das águas e separação entre águas e águas. Fez pois Deus o firmamento e separação entre as águas debaixo do firmamento e as águas sobre o firmamento. E assim se fez.»
Sabendo-me desde pequeno um produto do cristianismo, mas desconhecendo-me vergonhosamente nesta vertente, quero aqui agradecer penhoradamente à Susana a oferta desta bíblia, pois tenho a certeza que vai contribuir muito significativamente para a minha formação.
O meu muito obrigado, mais uma vez.
Desconhecedor quase total de qualquer texto bíblico ― confesso, envergonhado, triste e humildemente, esta lacuna imperdoável na minha formação como pessoa humana e como cidadão do mundo ― fui objecto da oferta de uma Bíblia de Estudo Almeida, que em princípio abordará o Antigo e o Novo Testamentos (digo isto porque sabia que há outras bíblias que omitem o Antigo Testamento), editada pela Sociedade Bíblica do Brasil.
Pois bem, logo no início da leitura deste livro fiquei a saber que a conhecidíssima frase «separação das águas», por mim vastamente utilizada (e creio que por toda a gente), cuja origem e significado primordial eu desconhecia em absoluto, é uma frase bíblica que se encontra no Génesis:
«E disse Deus: Haja firmamento no meio das águas e separação entre águas e águas. Fez pois Deus o firmamento e separação entre as águas debaixo do firmamento e as águas sobre o firmamento. E assim se fez.»
Sabendo-me desde pequeno um produto do cristianismo, mas desconhecendo-me vergonhosamente nesta vertente, quero aqui agradecer penhoradamente à Susana a oferta desta bíblia, pois tenho a certeza que vai contribuir muito significativamente para a minha formação.
O meu muito obrigado, mais uma vez.
UMA PORCA DE RABO TORCIDO
Como Vital Moreira tece loas quase diárias ao Governo e farta-se de lhe dar dicas sobre os mais variados assuntos (embora não se tenha pronunciado sobre a eventual ilegalidade na marcação das eleições para Lisboa ― vá-se lá saber porquê lhe tenha escapado o assunto ― mas isso também não é da conta do governo), esperemos que tenha tido o cuidado de enviar o texto desta sua posta no Causa Nossa ao Primeiro-ministro, mas também nos diga como é que concilia o seu eventual apoio à política de Saúde (baseada no modelo americano), do Governo Sócrates, com o reconhecimento implícito das graves imperfeições apresentadas pelo modelo americano que se infere da leitura de dita posta .
sexta-feira, 18 de maio de 2007
GOLPADA DESFEITA
O tribunal Constitucional, em apreciação a um requerimento do Movimento Partido da Terra, acaba de anular a data de 1 de Julho para a realização das eleições autárquicas intercalares em Lisboa desfazendo assim a golpada que os partidos do Bloco Central (PS e PSD) queriam dar, por interposta Governadora Civil de Lisboa, para impedir as candidaturas independentes à Câmara Municipal.
É uma decisão justa que os eleitores lisboetas devem saudar com agrado pois deve-se-lhes apresentar todas as hipóteses antes de se lhes pedir que votem.
Venha então daí a nova data para a gente poder programar as férias e o voto.
É uma decisão justa que os eleitores lisboetas devem saudar com agrado pois deve-se-lhes apresentar todas as hipóteses antes de se lhes pedir que votem.
Venha então daí a nova data para a gente poder programar as férias e o voto.
GOLPE BAIXO E SUJO
E MEDO. TAMBÉM HÁ MEDO.
Eu não sei se votarei em Helena Roseta ou em Sá Fernandes.
Para já, além de contribuir com a minha assinatura para a propositura da candidatura de Roseta à Câmara de Lisboa, ainda angariei mais duas para o efeito.
Porque não gostei mesmo nada de ver aquela jogada suja dos partidos (em que terá entrado também o Bloco de Esquerda, ao que ouvi dizer) levando ao encurtamento dos prazos de apresentação de candidaturas só para impedir os independentes de concorrer.
Espero que o eleitorado lisboeta saiba punir os chicos-espertos e faça com que a Câmara de Lisboa seja futuramente imune a certos regabofes de que se tem falado, elegendo independentes como vereadores.
Ao menos isso.
Eu não sei se votarei em Helena Roseta ou em Sá Fernandes.
Para já, além de contribuir com a minha assinatura para a propositura da candidatura de Roseta à Câmara de Lisboa, ainda angariei mais duas para o efeito.
Porque não gostei mesmo nada de ver aquela jogada suja dos partidos (em que terá entrado também o Bloco de Esquerda, ao que ouvi dizer) levando ao encurtamento dos prazos de apresentação de candidaturas só para impedir os independentes de concorrer.
Espero que o eleitorado lisboeta saiba punir os chicos-espertos e faça com que a Câmara de Lisboa seja futuramente imune a certos regabofes de que se tem falado, elegendo independentes como vereadores.
Ao menos isso.
SEM COMENTÁRIOS
O Director Geral da Saúde veio ontem informar o país ― e garantir ― que, quando entrar em vigor a lei do aborto, os hospitais e demais unidades de saúde envolvidos no esquema atenderão atempadamente a pretendente ao aborto numa consulta e terão que lhe garantir uma segunda consulta para 5 (cinco) dias depois.
Lembro ou informo a quem me está a ler que os doentes com cancro não têm esta facilidade. Nem nada ― nadinha mesmo ― que se pareça com isto.
É este o país em que estamos.
Entretanto adivinha-se grande tensão entre administrações hospitalares e serviços de Obstetrícia cuja maioria dos médicos opte pela objecção de consciência. É que parece que os hospitais que não realizem os abortos que lhes são pedidos vão ter que pagar, do seu orçamento, a outros que os façam.
Não sei é se isto só funcionará entre os hospitais públicos ou se também ainda veremos circular dinheiro dos parcos orçamentos dos hospitais públicos para os privados que vierem a realizar os abortos.
A festa promete.
Lembro ou informo a quem me está a ler que os doentes com cancro não têm esta facilidade. Nem nada ― nadinha mesmo ― que se pareça com isto.
É este o país em que estamos.
Entretanto adivinha-se grande tensão entre administrações hospitalares e serviços de Obstetrícia cuja maioria dos médicos opte pela objecção de consciência. É que parece que os hospitais que não realizem os abortos que lhes são pedidos vão ter que pagar, do seu orçamento, a outros que os façam.
Não sei é se isto só funcionará entre os hospitais públicos ou se também ainda veremos circular dinheiro dos parcos orçamentos dos hospitais públicos para os privados que vierem a realizar os abortos.
A festa promete.
sábado, 12 de maio de 2007
UMA ANÁLISE CONTUNDENTE
DE UMA REALIDADE DESCOROÇOANTE
O Professor Universitário, Paulo Morais, explica aqui no Diário de Notícias, como se mexem os vermes no pântano autárquico, e quais as razões por que ninguém quer alterar o estado da coisa.
O Professor Universitário, Paulo Morais, explica aqui no Diário de Notícias, como se mexem os vermes no pântano autárquico, e quais as razões por que ninguém quer alterar o estado da coisa.
sexta-feira, 11 de maio de 2007
JORNALISMO DE SARJETA
Não é novidade para ninguém que hoje em dia o “trabalho jornalístico” ― quer na rádio, quer na televisão e nos jornais ― se limita ao tratamento (em Português de pé quebrado) de temas como o futebol, os casos policiais e criminais e as peripécias políticas de figuras menores (que já não há grandes figuras) da cena político-partidária portuguesa.
Para esses “jornalistas” nada mais acontece que mereça atenção em Portugal. O futebol é que leva a parte de leão no bombardeio noticioso pátrio.
Por isso gostei muito de ler o escritor e jornalista (sem aspas), Batista Bastos, quando, neste artigo, no Diário de Notícias, chama «empregados de jornais» aos “jornalistas”. É uma designação feliz para esses escribas incultos, esses preguiçosos mentais que pululam nos jornais, rádios e televisões onde produzem toda a espécie de lixo jornalístico que nos é impingido através dos órgãos de comunicação social.
Para esses “jornalistas” nada mais acontece que mereça atenção em Portugal. O futebol é que leva a parte de leão no bombardeio noticioso pátrio.
Por isso gostei muito de ler o escritor e jornalista (sem aspas), Batista Bastos, quando, neste artigo, no Diário de Notícias, chama «empregados de jornais» aos “jornalistas”. É uma designação feliz para esses escribas incultos, esses preguiçosos mentais que pululam nos jornais, rádios e televisões onde produzem toda a espécie de lixo jornalístico que nos é impingido através dos órgãos de comunicação social.
quinta-feira, 10 de maio de 2007
CENTRÃO BADALÃO
A crise na Câmara Municipal de Lisboa trouxe a lume uma evidência cada vez mais clara para todo e qualquer observador: a Câmara de Lisboa, no fundo, no fundo, é mas é uma grande agência de emprego para os partidos do bloco central (PS e PSD), mas também para o PCP. E é por isso mesmo que nenhum deles queria eleições intercalares em Lisboa.
Com aquilo que já se sabe, penso que os candidatos independentes são essenciais para mudar a vida naquela Câmara. É que mesmo que nenhum deles ganhe a presidência da Câmara, ao menos algum ou alguns poderão ser eleitos vereadores e fazerem, dentro da Câmara, a vigilância democrática necessária para parar de vez com as negociatas e a delapidação do património municipal de Lisboa.
Li hoje que António Costa é desejado no PS como candidato.
Sá Fernandes! Ó Sá Fernandes! Acode aqui à gente!
Com aquilo que já se sabe, penso que os candidatos independentes são essenciais para mudar a vida naquela Câmara. É que mesmo que nenhum deles ganhe a presidência da Câmara, ao menos algum ou alguns poderão ser eleitos vereadores e fazerem, dentro da Câmara, a vigilância democrática necessária para parar de vez com as negociatas e a delapidação do património municipal de Lisboa.
Li hoje que António Costa é desejado no PS como candidato.
Sá Fernandes! Ó Sá Fernandes! Acode aqui à gente!
terça-feira, 8 de maio de 2007
DE PROFUNDIS
Hoje apetece-me homenagear Arnaldo Jabor, um dos meus gurus, publicando na íntegra um artigo dele saído no jornal O Globo, do Rio de Janeiro.
Eu já fiz filmes de amor. Talvez por isso, e também pela música de Rita Lee com texto que escrevi, pessoas que encontro na rua me agarram e perguntam: “Mas... afinal, o que é o amor?”. E esperam, de olho muito aberto, uma resposta “profunda”.
Eu penso, penso, e digo: “Sei lá...” Não sei, ninguém sabe, mas há no ar um lamento profundo pelo fim do sonho platônico de harmonia, de felicidade, de happy end. Sinto dizer, mas não há mais espaço para o happy end, nem no amor, nem na política, em nada.
Quando eu era jovem, nos anos 60/70, o amor era um desejo romântico. Depois, nos anos 80/90, foi ficando um amor de consumo, um amor de mercado. O ritmo do tempo acelerou o amor, o dinheiro contabilizou o amor, matando seu mistério impalpável. O amor, e tudo mais, está perdendo a transcendência.
Não existe mais o amante definhando de solidão, nem romeus nem julietas, nem pactos de morte, não existe mais o amor nos levando para uma galáxia remota, nem a sagrada simbiose que nos traria a eternidade feliz.
O amor não tem mais porto, não tem onde ancorar, não tem mais a família nuclear para se abrigar. O amor ficou pelas ruas, em busca de objeto, esfarrapado, sem rumo. Não temos mais músicas românticas, nem o lento perder-se dentro de “olhos de ressaca”, nem o formicida com guaraná. Mas, mesmo assim, continuamos ansiando por uma paixão impossível.
Existe o amor, claro. O que chamamos de “amor” vive dentro de nós como uma fome “celular”. Está entranhado no DNA, no fundo da matéria. É uma pulsão inevitável, é uma reprodução ampliada da cópula entre o espermatozóide e o óvulo, interpenetrando-se. Somos grandes células que querem se re-unir, separadas pelo sexo que as dividiu. O resto é literatura. Se bem que grandes poetas como John Donne sabiam que não viramos “anjos” com o amor; sabiam que o amor é uma demanda da Terra, para atingirmos a calma felicidade dos animais.
Mas, onde anda hoje em dia esta pulsão chamada “amor”? Bem... vamos lá: Uma das marcas do século XXI é o fim da crença na plenitude, na inteireza, seja no sexo, no amor e na política. Não adianta nos lamentarmos, pois estamos diante de um mundo afetivo e sexual muito novo, que muda veloz como a tecnologia.
Se isso é um bem ou um mal, não sei. Mas é inevitável.
Temos de parar de sofrer romanticamente porque “acabou o amor ” (ou mesmo o paraíso social...) ou, ao menos, o antigo amor.
O pensamento afetivo, amoroso, ou filosófico continua lamentando uma unidade perdida.
Continuamos — amantes ou filósofos — a sonhar como uma volta ao passado Harmónico
Temos uma nostalgia lírica por alguma coisa que pode voltar atrás. Não volta. Nada volta atrás. Há que perder esperanças antigas e talvez celebrar um sonho mais trágico, efêmero.
Em tudo.
Não adianta lamentar a impossibilidade do amor. Temos de celebrar o neo-amor. Cada vez mais só o parcial, o fortuito é gozoso. Só o parcial nos excita. Temos de parar de sofrer por uma plenitude que não chega nunca.
Hoje, há que assumir a incompletude talvez como única possibilidade humana. E achar isso bom. E gozar com isso.
Em todas as revistas, fotos, filmes, a imagerie do erotismo contemporâneo “esquarteja” o corpo humano. Vejam as artes gráficas, fotos de revistas de arte, como “Photo” (ou em Tarantino), onde tudo é (reparem) decepado, dividido, pés, sapatos escarpins negros, unhas pintadas, bocas vermelhas, paus, seios, corpos imitando coisas, tudo solto como num abstrato painel. Tudo evoca a impossibilidade saudosa de um “objeto total”, da pessoa inteira. À primeira vista parece uma louvação da perversão, do fetichismo, do erotismo das “partes”, do “amor em pedaços”. No entanto, estamos além do fetichismo, além da perversão — conceitos do século XIX.
Não há mais “todo”; só partes. O verdadeiro amor total fica cada vez mais impossível, como as narrativas romanescas.
Hoje em dia, não há mais noção do que seria a felicidade, como antigamente. O que é ser feliz? Onde está a felicidade no amor e sexo? No casamento? Sem a promessa de amor eterno, tudo vira uma aventura. Em vez da felicidade, o gozo rápido do sexo ou o longo sofrimento gozoso do amor, só as fortes emoções, a deliciosa dor, as lágrimas, hotéis, motéis, perdas, retornos, desertos, luzes brilhantes ou mortiças, a chuva, o sol, o nada.
O amor hoje é um cultivo da “intensidade” contra a “eternidade”. É o fim do happy end. É bom que acabe esta mentira do idealismo romântico americano, para legitimar a família e a produção, pois, na verdade, tudo acaba mal na vida. Não se chega a lugar nenhum porque não há onde chegar. O amor, para ser eterno, tem de ficar eternamente irrealizado. A droga não pode parar de fazer efeito e, para isso, a prise não pode passar. Aí, a dor vem como prazer, a saudade como excitação, a parte como o todo, o instante como eterno. E, atenção, não falo de masoquismo; falo de um espírito do tempo. É bom sofrer numa metafísica passional, é bom a saudade, a perda, tudo, menos a insuportável felicidade.
Tudo bem, buscarmos paz e sossego. Tudo bem nos contentarmos com o calmo amor, com um “agapê”, uma doce amizade dolorida e nostálgica do tesão, tudo bem... Mas a chama emocionante só vem com a droga pesada do século XXI: a paixão. E isso é bom. Temos que acabar com a idéia de felicidade fácil. Enquanto sonharmos com a plenitude seremos infelizes. A felicidade não é sair do mundo, como privilegiados seres, como estrelas de cinema, mas é entrar em contato com a trágica substância de tudo, com o não-sentido, das galáxias até o orgasmo. Temos de ser felizes sem esperanças.
E tem mais: este artigo não é pessimista.
Eu já fiz filmes de amor. Talvez por isso, e também pela música de Rita Lee com texto que escrevi, pessoas que encontro na rua me agarram e perguntam: “Mas... afinal, o que é o amor?”. E esperam, de olho muito aberto, uma resposta “profunda”.
Eu penso, penso, e digo: “Sei lá...” Não sei, ninguém sabe, mas há no ar um lamento profundo pelo fim do sonho platônico de harmonia, de felicidade, de happy end. Sinto dizer, mas não há mais espaço para o happy end, nem no amor, nem na política, em nada.
Quando eu era jovem, nos anos 60/70, o amor era um desejo romântico. Depois, nos anos 80/90, foi ficando um amor de consumo, um amor de mercado. O ritmo do tempo acelerou o amor, o dinheiro contabilizou o amor, matando seu mistério impalpável. O amor, e tudo mais, está perdendo a transcendência.
Não existe mais o amante definhando de solidão, nem romeus nem julietas, nem pactos de morte, não existe mais o amor nos levando para uma galáxia remota, nem a sagrada simbiose que nos traria a eternidade feliz.
O amor não tem mais porto, não tem onde ancorar, não tem mais a família nuclear para se abrigar. O amor ficou pelas ruas, em busca de objeto, esfarrapado, sem rumo. Não temos mais músicas românticas, nem o lento perder-se dentro de “olhos de ressaca”, nem o formicida com guaraná. Mas, mesmo assim, continuamos ansiando por uma paixão impossível.
Existe o amor, claro. O que chamamos de “amor” vive dentro de nós como uma fome “celular”. Está entranhado no DNA, no fundo da matéria. É uma pulsão inevitável, é uma reprodução ampliada da cópula entre o espermatozóide e o óvulo, interpenetrando-se. Somos grandes células que querem se re-unir, separadas pelo sexo que as dividiu. O resto é literatura. Se bem que grandes poetas como John Donne sabiam que não viramos “anjos” com o amor; sabiam que o amor é uma demanda da Terra, para atingirmos a calma felicidade dos animais.
Mas, onde anda hoje em dia esta pulsão chamada “amor”? Bem... vamos lá: Uma das marcas do século XXI é o fim da crença na plenitude, na inteireza, seja no sexo, no amor e na política. Não adianta nos lamentarmos, pois estamos diante de um mundo afetivo e sexual muito novo, que muda veloz como a tecnologia.
Se isso é um bem ou um mal, não sei. Mas é inevitável.
Temos de parar de sofrer romanticamente porque “acabou o amor ” (ou mesmo o paraíso social...) ou, ao menos, o antigo amor.
O pensamento afetivo, amoroso, ou filosófico continua lamentando uma unidade perdida.
Continuamos — amantes ou filósofos — a sonhar como uma volta ao passado Harmónico
Temos uma nostalgia lírica por alguma coisa que pode voltar atrás. Não volta. Nada volta atrás. Há que perder esperanças antigas e talvez celebrar um sonho mais trágico, efêmero.
Em tudo.
Não adianta lamentar a impossibilidade do amor. Temos de celebrar o neo-amor. Cada vez mais só o parcial, o fortuito é gozoso. Só o parcial nos excita. Temos de parar de sofrer por uma plenitude que não chega nunca.
Hoje, há que assumir a incompletude talvez como única possibilidade humana. E achar isso bom. E gozar com isso.
Em todas as revistas, fotos, filmes, a imagerie do erotismo contemporâneo “esquarteja” o corpo humano. Vejam as artes gráficas, fotos de revistas de arte, como “Photo” (ou em Tarantino), onde tudo é (reparem) decepado, dividido, pés, sapatos escarpins negros, unhas pintadas, bocas vermelhas, paus, seios, corpos imitando coisas, tudo solto como num abstrato painel. Tudo evoca a impossibilidade saudosa de um “objeto total”, da pessoa inteira. À primeira vista parece uma louvação da perversão, do fetichismo, do erotismo das “partes”, do “amor em pedaços”. No entanto, estamos além do fetichismo, além da perversão — conceitos do século XIX.
Não há mais “todo”; só partes. O verdadeiro amor total fica cada vez mais impossível, como as narrativas romanescas.
Hoje em dia, não há mais noção do que seria a felicidade, como antigamente. O que é ser feliz? Onde está a felicidade no amor e sexo? No casamento? Sem a promessa de amor eterno, tudo vira uma aventura. Em vez da felicidade, o gozo rápido do sexo ou o longo sofrimento gozoso do amor, só as fortes emoções, a deliciosa dor, as lágrimas, hotéis, motéis, perdas, retornos, desertos, luzes brilhantes ou mortiças, a chuva, o sol, o nada.
O amor hoje é um cultivo da “intensidade” contra a “eternidade”. É o fim do happy end. É bom que acabe esta mentira do idealismo romântico americano, para legitimar a família e a produção, pois, na verdade, tudo acaba mal na vida. Não se chega a lugar nenhum porque não há onde chegar. O amor, para ser eterno, tem de ficar eternamente irrealizado. A droga não pode parar de fazer efeito e, para isso, a prise não pode passar. Aí, a dor vem como prazer, a saudade como excitação, a parte como o todo, o instante como eterno. E, atenção, não falo de masoquismo; falo de um espírito do tempo. É bom sofrer numa metafísica passional, é bom a saudade, a perda, tudo, menos a insuportável felicidade.
Tudo bem, buscarmos paz e sossego. Tudo bem nos contentarmos com o calmo amor, com um “agapê”, uma doce amizade dolorida e nostálgica do tesão, tudo bem... Mas a chama emocionante só vem com a droga pesada do século XXI: a paixão. E isso é bom. Temos que acabar com a idéia de felicidade fácil. Enquanto sonharmos com a plenitude seremos infelizes. A felicidade não é sair do mundo, como privilegiados seres, como estrelas de cinema, mas é entrar em contato com a trágica substância de tudo, com o não-sentido, das galáxias até o orgasmo. Temos de ser felizes sem esperanças.
E tem mais: este artigo não é pessimista.
quinta-feira, 3 de maio de 2007
MAIS UM «De consciência tranquila»
terça-feira, 1 de maio de 2007
THE DEFINITIVE SPELL
Diga-se o que se disser, acho que não há hoje em dia um único português que olhe para José Sócrates da mesma maneira que olhava antes da polémica sobre a sua carreira académica e das trapalhadas com os seus “papéis”.
E, no meu entender, quem teve uma frase certeira e feliz para sintetizar tudo isso foi Pacheco Pereira ao escrever:
«Ele parece ter um toque de Midas especial: qualquer documento que lhe diz respeito tem alguma coisa de errado.»
E, no meu entender, quem teve uma frase certeira e feliz para sintetizar tudo isso foi Pacheco Pereira ao escrever:
«Ele parece ter um toque de Midas especial: qualquer documento que lhe diz respeito tem alguma coisa de errado.»
GRAÇAS A DEUS
A LUCIDEZ NÃO É SEQUESTRÁVEL
Pouco me interessa neste caso que o João Miranda seja da direita, do centro, ou de qualquer outra orientação política.
A verdade é que eu gostaria de ter escrito isto que ele escreveu:
«Alguém se lembraria de limitar o número de jornais diários nacionais a 7 por se entender que o 8º não é economicamente viável? Então porque é que se usa esse argumento para limitar o número de televisões de sinal aberto a duas? Três televisões privadas de sinal aberto não são viáveis? Who cares? O Estado não tem obrigação de garantir o sucesso comercial de projectos televisivos. Quem tem que se preocupar com isso são os empreendedores privados. Mas acho interessante que seja a esquerda a defender o Estado como garante do lucro.»
Nota: No título eu louvo a Deus, mas é apenas como figura de estilo. Graças a Ele eu sou ateu.
Pouco me interessa neste caso que o João Miranda seja da direita, do centro, ou de qualquer outra orientação política.
A verdade é que eu gostaria de ter escrito isto que ele escreveu:
«Alguém se lembraria de limitar o número de jornais diários nacionais a 7 por se entender que o 8º não é economicamente viável? Então porque é que se usa esse argumento para limitar o número de televisões de sinal aberto a duas? Três televisões privadas de sinal aberto não são viáveis? Who cares? O Estado não tem obrigação de garantir o sucesso comercial de projectos televisivos. Quem tem que se preocupar com isso são os empreendedores privados. Mas acho interessante que seja a esquerda a defender o Estado como garante do lucro.»
Nota: No título eu louvo a Deus, mas é apenas como figura de estilo. Graças a Ele eu sou ateu.
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