Num artigo de opinião intitulado "A integração de Cabo Verde na Europa", saído em Lisboa, no Diário de Notícias, no dia 08/02/2005, o Professor Adriano Moreira alerta-nos a todos, mas sobretudo a Portugal, a Cabo verde e à União Europeia, para a importância de se começar a pensar já na possibilidade da integração de Cabo Verde na Europa.
Porque - e vamos citar Adriano Moreira:
«Talvez seja oportuno, e necessário, [a Europa] olhar criticamente para o Atlântico de onde partiu o movimento [do alargamento da União Europeia], dando atenção ao risco de afastamento entre o europeísmo e o americanismo, considerar a necessidade de continuar a tentar modelar a articulação entre a segurança do Atlântico Norte e a do Atlântico Sul, e repensar o estatuto dos arquipélagos que pontuam a linha divisória.»
«Mas, por outro lado, e voltando às questões da segurança, não é possível sugerir qualquer modelo de organização do Atlântico Sul, e de articulação entre a sua segurança e a do Atlântico Norte, sem incluir Cabo Verde no processo, supondo que não recusará o consentimento e a colaboração.»
Trata-se de um alerta importantíssimo - este que o Professor Adriano Moreira nos faz -. Trata-se de uma análise/proposta de integração que o Professor faz, ao mesmo tempo: a Portugal, à União Europeia e a Cabo Verde.
Nós não sabemos o que pensam as actuais autoridades de Cabo Verde sobre este assunto e gostaríamos que se pronunciassem com alguma brevidade sobre o mesmo. Mas pensamos que o que interessa mesmo é sabermos desde já o que pensa o Presidente da República de Cabo Verde sobre tão importante questão.
Tratando-se de um tema relativo à soberania de Cabo Verde e, portanto, de um tema constitucional (que implica a Constituição da República de Cabo Verde), cremos que é exigível que o Presidente da República diga aos nacionais de Cabo Verde (os que vivem dentro e os que vivem fora de Cabo Verde) qual o seu entendimento desta proposta/análise de Adriano Moreira.
Esta é uma oportunidade excepcional que Pedro Pires tem, desde que tomou posse, até hoje, para dizer algo de muito válido aos cabo-verdianos.
Sem pretender recriminar a postura demasiado low profile que Pedro Pires adoptou desde que assumiu o cargo de Presidente da República de Cabo Verde, achamos, muito sinceramente, que este assunto de uma possível integração de Cabo Verde na União Europeia - que é disso que se trata quando Adriano Moreira diz "Europa" - deve despertá-lo para falar à nação e ser ele a marcar o compasso do debate público que sobre este tema por certo se não deixará de fazer. Quer em Cabo Verde, quer fora dele.
De outro modo estaria a faltar, no nosso entender, a um dos seus deveres principais: o de ter e de emitir opinião sobre temas tão importantes como são os que se referem à Constituição da República, à Soberania e, no fim e em resumo, ao destino colectivo dos cidadãos: o destino da nação. Nesse caso seria legítimo, então, pedirmos-lhe que se não recandidate e abra espaço, dentro da área política a que pertence, para que surjam outros candidatos que disputem com os de outras áreas o lugar de quem deve, para além de representar o Estado, pronunciar-se dirigindo-se aos cidadãos, sobre matérias de interesse colectivo, sobretudo quando está em causa (como neste caso está) a Soberania do País. Porque, sendo este um tema de grandíssima importância e bastante melindre - tema para mais que uma geração discutir, interiorizar, promover, decidir, negociar e concretizar - cabe, sem a mais pequena dúvida, ao Presidente da República falar à nação e marcar a agenda da sua discussão pública. E durante todo o tempo que isso se vier a passar, a batuta do Presidente da República terá que estar activa na direcção da orquestra - sabendo nós bem que a partitura será composta pelos cidadãos cabendo ao maestro (Presidente) apenas fazer interpretá-la -.
É que, que nos lembremos, desde a sua posse no alto cargo de Presidente da República, até hoje, Pedro Pires, ao contrário do que seria desejável, não fez comunicações ao país nas quais focasse de forma clara os grandes temas estruturantes da sociedade: organização da família; educação dos jovens; formulação de desígnios nacionais que mobilizassem a nação e lhe dessem um rumo face às grandes dificuldades que se levantam à afirmação da identidade pátria de um país tão pequeno e com tantos cidadãos dispersos pelos quatro cantos do mundo, como é Cabo Verde; no fundo, dizer, ao menos, aos cabo-verdianos, o que pensa o Presidente da República acerca dos caminhos (e quais são esses caminhos possíveis) que Cabo Verde pode trilhar para sobreviver e prosperar no mundo globalizado e cada vez menos solidário em que vivemos hoje. Por tudo isso esta é a oportunidade de ouro de o Comandante Pedro Pires, Presidente da República de Cabo Verde, vir a terreiro comunicar com a nação.
Não nos esqueçamos também que cabe aos principais partidos políticos cabo-verdianos e aos grupos organizados de cidadãos (aos grupos existentes e aos em formação) uma quota-parte importante de responsabilidade na dinamização do debate e no contributo para o seu enriquecimento e clarificação.
Todos seremos poucos para uma definição clara de objectivos e uma escolha acertada do caminho do futuro para a nação cabo-verdiana. Um caminho que nos afaste de vez da dependência da "ajuda" alheia nos moldes actuais (das geminações de municípios, das ofertas materiais de equipamentos quantas vezes obsoletos, das bolsas de estudo e de formação, dos projectos de cooperação em que a fatia de leão muitas vezes fica em casa de quem "oferece", etc.). Não é que essas geminações, essas ofertas, essas bolsas, esses projectos de cooperação sejam coisas sem importância e de desprezar - nada disso -. Reconhecemos-lhes a sua importância e estamos agradecidos por eles. Mas o que queremos mesmo é que um dia possamos conviver com outros povos num espaço em que os nossos proventos advenham da importância do nosso trabalho e do nosso esforço, integrados que estejamos num colectivo harmonioso de nações que nos reconheça o lugar de parceiro eficiente e de plenos direitos. Não mais parceiro menor; amigo em dificuldades; por vezes pedinte envergonhado da sua pobreza material. Não mais a situação de condenados, sobretudo pelo isolamento geográfico, ao destino de povo solitário, eterno produtor de diásporas-âncora, sobrevivente de todas as tempestades e, parafraseando o poeta, «comendo pedras para não perecer».
Não ignorando que a proposta de Adriano Moreira é uma proposta incómoda para certos espíritos cujas opiniões conhecemos bem, ela é, contudo, uma proposta suficientemente importante para merecer ser ponderada ao mais alto nível e merecer daí uma resposta pública clara. Sem subterfúgios ou meias palavras. Merece ainda toda a atenção por parte dos analistas políticos e demais fazedores de opinião, em Cabo Verde e no exterior; dos intelectuais que habitualmente evitam opinar politicamente; dos cidadãos em geral. É uma proposta muito importante que não podemos deixar cair em saco roto.
E não nos venham dizer que um Presidente da República não se pronuncia sobre problemas individualmente levantados por esta ou aquela pessoa (no caso Adriano Moreira). Porque o que deve mover um Presidente em casos semelhantes é a ideia em si e não apenas a fonte da ideia. Se bem que Adriano Moreira tem um currículo invejável e uma autoridade indesmentível como analista e teorizador de questões estratégicas globais, o que, por si só, faz com que deva ser escutado com toda a atenção por qualquer Chefe de Estado devendo por isso esta sua propostas de integração de Cabo Verde na Europa merecer toda a atenção por parte das autoridades cabo-verdianas, em particular do Chefe de Estado de Cabo Verde.
(*) O título é uma provocação que esperemos espevite a discussão.
Eis aqui o artigo de Adriano Moreira.
sábado, 12 de fevereiro de 2005
domingo, 6 de fevereiro de 2005
DJARFOGO PÂ RIBA TUDO
Confesso que quando publiquei aqui a fotografia do miúdo transportando peixe à cabeça (ver mais abaixo) para ganhar o suã para alimentação da família, eu pensava que essa prática se tinha extinto com a independência de Cabo Verde. Mas Rui Guilherme veio provar(-me) aqui que as dificuldades dos tempos idos de sessenta se mantiveram ainda até pelo menos 1999. Só espero que a contrapartida de tal tarefa já fosse outra nessa altura. Isto é o meu orgulho de cabo-verdiano a falar.
Quanto a barões trepadores, claro que sempre os houve e haverá em grandes quantidades na ilha do Fogo. Subir, mesmo que seja apenas a uma árvore, é o apelo irresistível de qualquer miúdo da ilha do vulcão: não nos contentamos em observar a humanidade ao nível rasteiro em que ela normalmente vive. Não é por acaso que existe a célebérrima frase «Djarfogo pâ riba tudo». E não foi por acaso que a fotografia de Bila Baxo (aqui em baixo) foi tirada de cima para baixo. É uma propensão quase genética: não há volta a dar-lhe.
Quanto a barões trepadores, claro que sempre os houve e haverá em grandes quantidades na ilha do Fogo. Subir, mesmo que seja apenas a uma árvore, é o apelo irresistível de qualquer miúdo da ilha do vulcão: não nos contentamos em observar a humanidade ao nível rasteiro em que ela normalmente vive. Não é por acaso que existe a célebérrima frase «Djarfogo pâ riba tudo». E não foi por acaso que a fotografia de Bila Baxo (aqui em baixo) foi tirada de cima para baixo. É uma propensão quase genética: não há volta a dar-lhe.
domingo, 16 de janeiro de 2005
TRISTEZA

(Foto by Djibla)
Era de um guarda-redes desta categoria que o Sporting precisava hoje na sua deslocação à Madeira: o guarda-redes menos batido em rês campeonatos sucessivos em S. Vicente, nos finais dos anos sessenta; conhecido por defender grandes penalidades e que jogava sempre fora da baliza quando havia cruzamentos e cantos atrasados disputando com vantagem (porque com as mãos) os lances aéreos na grande área com os avançados adversários - tudo o que Ricardo hoje devia fazer e não fez. Enfim!...
Com efeito o Sporting acaba de perder com o Nacional da Madeira por três bolas a duas.
É no mínimo curioso constatar, desde há três anos (pelo menos) a esta parte, que o Sporting, de cada vez que tem a oportunidade de se distanciar do Porto e do Benfica na classificação, deixa-a perder-se ao realizar exibições medíocres (como a de hoje) em que a defesa é quase sempre a maior culpada.
Hoje Ricardo voltou a comprometer sendo culpado em todos os três golos do Nacional. É obra!
Se calhar não é ainda desta que lá vamos, oh caros amigos, Cau e Adalberto.
domingo, 9 de janeiro de 2005
FELICIDADE

Ontem nem um golo em posição de fora-de-jogo, nem uma expulsão injusta, nem o louco festival de amarelos oferecido pelo árbitro impediram o Sporting de dar uma coça à equipa dos enfermos e tontinhos do Benfica.
Fiquei contente. E só não fiquei mais porque tendo Liedson marcado os dois golos do Sporting, agora é que o rapaz já se acha no direito de passar a semana no Brasil e regressar só aos sábados para marcar golos, introduzindo assim a indisciplina no seio da equipa.
Lá na América estou a ver o Cau Pires e o Adalberto também eles contentes e a pensar numa churrascada para quando for a vitória no campeonato.
Um abraço, meus amigos! Prometo aí estar se for caso disso.
sábado, 1 de janeiro de 2005
UMA PAUSA DO BARÃO TREPADOR

No dia do meu segundo aniversário desci por instantes das árvores para ser imortalizado pela Leica manual do meu tio, Joaquim Monteiro de Macedo.
A pose inocente não disfarça, contudo, o olhar mortífero de um blogueiro potencial.
Com uma cabeçorra enorme para a idade - o artesão contratado por meu pai, para confecionar um capacete colonial de miolo de cana de milho, revestido de Kaki, falhara a estimativa do meu perímetro cefálico e perante o fracasso em contribuir para me abrigar do sol inclemente, pois o capacete ficava-me no cocuruto, só dizia: «esta cabeça afinal não é a de um miúdo, caramba» - eu sei o que todos pensavam: «ou ele sofre de hidrocefalia, ou então tem mesmo um cérebro grande demais para uma criança desta idade».
Para ser do Sporting; regressar de Macau quando podia lá continuar a trabalhar; suportar sem morrer um Governo Santana Lopes ; e dar em blogueiro… se calhar era mesmo hidrocefalia que eu tinha.
quarta-feira, 29 de dezembro de 2004
A PROVA QUE FALTAVA

Como qualquer africano que se presa, em garoto vivia nas árvores qual Barão Trepador. Esta fotografia é da autoria de Augusto Monteiro, então gerente comercial da Casa Vasconcelos, no Fogo, e imortaliza o dia em que cometi a grossa asneira de descer das árvores para iniciar a vida entre os humanos.
terça-feira, 28 de dezembro de 2004
A LUTA PELA SOBREVIVÊNCIA

Naquele tempo a luta pela sobrevivência era bem mais dura que nos dias de hoje, e assumia por vezes aspectos de todo em todo chocantes no contexto histórico em que tinha lugar - como no caso aqui retratado, datado da década de sessenta do século XX.
Durante décadas e décadas, nas praias da ilha do Fogo, à hora da chegada dos pequeninos botes de pesca, lá estava sempre um magote de crianças com idades entre os dez e os catorze anos, cujas, depois de ajudarem a arrastar o bote para areia seca, disputavam entre si, arduamente, o transporte do atum e da serra, à cabeça, desde a praia até ao mercado do peixe (uma longa e dura caminhada ao sol), subindo a íngreme estrada de Fonte Vila, de chão de basalto escaldante, ou palmilhando os quatro quilómetros da estrada da Praia de Nossa Senhora.
E todo esse trabalho para receberem o quê como pagamento?
Para receberem o suã do peixe transportado e garantirem assim que à noitinha haveria lá em casa uns fiapos de peixe na catchupa da única refeição do dia.
Para quem não sabe, suã de peixe é o esqueleto, a espinha, que resta depois de separada a cabeça do animal e cortados rente à espinha os dois filetes do mesmo.
Convenhamos que o heroísmo de um povo se constrói de milhentas formas, algumas quase impensáveis para o tempo em que ocorreram.
segunda-feira, 27 de dezembro de 2004
SEMPRE COM OS MAIS VELHOS
Estes foram os primeiros e firmes passos como boémio. Na companhia do Lourenço (que até aí nem sequer podia sentir o cheiro do álcool), do João de Muná, Lili de Benvinda, Augusto de Gudjermina e do Ovídio Scróbia. Depois de passar por esta escola, já nada mais havia a aprender; agora era só ligar o piloto automático e deixar vogar o barco da boémia.

Estes foram os primeiros e firmes passos como boémio. Na companhia do Lourenço (que até aí nem sequer podia sentir o cheiro do álcool), do João de Muná, Lili de Benvinda, Augusto de Gudjermina e do Ovídio Scróbia. Depois de passar por esta escola, já nada mais havia a aprender; agora era só ligar o piloto automático e deixar vogar o barco da boémia.
SEMPRE COM OS MAIS VELHOS
Era e é uma constante na minha vida - andar na companhia dos mais velhos.
Esta é uma fotografia tirada num dia de Natal da década de cinquenta, na Praceta Pedro Monteiro Cardoso, ao pé da casa de nhô Quirino, na companhia de dois grandes amigos, Roberto de Carolina e Xixino. Com o Roberto a amizade estreitar-se-ia ao longo do tempo e a aprendizagem da vida far-se-ia pelo lado mundano e boémio; com o Xixino (falecido há já quase vinte anos), manteve-se a amizade em velocidade de cruzeiro sendo a poesia e a música os dois temas dominantes dessa ligação.

Era e é uma constante na minha vida - andar na companhia dos mais velhos.
Esta é uma fotografia tirada num dia de Natal da década de cinquenta, na Praceta Pedro Monteiro Cardoso, ao pé da casa de nhô Quirino, na companhia de dois grandes amigos, Roberto de Carolina e Xixino. Com o Roberto a amizade estreitar-se-ia ao longo do tempo e a aprendizagem da vida far-se-ia pelo lado mundano e boémio; com o Xixino (falecido há já quase vinte anos), manteve-se a amizade em velocidade de cruzeiro sendo a poesia e a música os dois temas dominantes dessa ligação.
quarta-feira, 20 de outubro de 2004
domingo, 17 de outubro de 2004
CHOVER NO MOLHADO
Não queria escrever sobre isto, mas… o que é que se pode fazer quando a reincidência em comportamentos criminosos continua a conduzir a Guiné Bissau rumo ao abismo e ao desaparecimento do Estado (ia dizer “Nação”).
Como é amplamente sabido, desde há menos de um mês, os militares guineenses resolveram dar mais alguns passos na sua tarefa suicida de destruir o pouco que ainda resta daquilo que em tempos não muito recuados foi um País.
Aqueles militares pretenderam agora dar um golpe de Estado para – imagine-se! – exigirem que lhes fossem pagos salários e outras subvenções pecuniárias em atraso. No meio disso assassinaram o seu chefe máximo, general Veríssimo Seabra, um coronel e mais não sei quantos civis. Agora exigem assinar um acordo em que a condição primeira é esta: “amnistia para todos os militares revoltosos”, desde não sei que data a esta parte. O que querem agora não é mais do que isto: o não julgamento dos assassinos do general Seabra e de mais umas quantas vítimas das atrocidades cometidas durante o golpe; a lavagem dos crimes do passado e a legitimação do regabofe macabro de que se têm alimentado.
Não nos esqueçamos, contudo, que o general Seabra, ora assassinado, pertencia ao grupo de militares que derrubara e assassinara o seu chefe de então, Ansumane Mané, matando-o com a brutalidade habitual empregue nesses rituais de poder armado. Naquela altura, um acordo em tudo semelhante ao agora assinado, fora rubricado garantindo assim a amnistia aos assassinos de Ansumane Mané, grupo no qual, como já disse, se incluía o general Seabra ora sumariamente “justiçado”.
Como se vê, na Guiné Bissau, continua tudo como dantes e seguindo tranquilamente o mesmo rumo: caos, miséria, crime e impunidade.
Até quando?
Não queria escrever sobre isto, mas… o que é que se pode fazer quando a reincidência em comportamentos criminosos continua a conduzir a Guiné Bissau rumo ao abismo e ao desaparecimento do Estado (ia dizer “Nação”).
Como é amplamente sabido, desde há menos de um mês, os militares guineenses resolveram dar mais alguns passos na sua tarefa suicida de destruir o pouco que ainda resta daquilo que em tempos não muito recuados foi um País.
Aqueles militares pretenderam agora dar um golpe de Estado para – imagine-se! – exigirem que lhes fossem pagos salários e outras subvenções pecuniárias em atraso. No meio disso assassinaram o seu chefe máximo, general Veríssimo Seabra, um coronel e mais não sei quantos civis. Agora exigem assinar um acordo em que a condição primeira é esta: “amnistia para todos os militares revoltosos”, desde não sei que data a esta parte. O que querem agora não é mais do que isto: o não julgamento dos assassinos do general Seabra e de mais umas quantas vítimas das atrocidades cometidas durante o golpe; a lavagem dos crimes do passado e a legitimação do regabofe macabro de que se têm alimentado.
Não nos esqueçamos, contudo, que o general Seabra, ora assassinado, pertencia ao grupo de militares que derrubara e assassinara o seu chefe de então, Ansumane Mané, matando-o com a brutalidade habitual empregue nesses rituais de poder armado. Naquela altura, um acordo em tudo semelhante ao agora assinado, fora rubricado garantindo assim a amnistia aos assassinos de Ansumane Mané, grupo no qual, como já disse, se incluía o general Seabra ora sumariamente “justiçado”.
Como se vê, na Guiné Bissau, continua tudo como dantes e seguindo tranquilamente o mesmo rumo: caos, miséria, crime e impunidade.
Até quando?
sábado, 9 de outubro de 2004
O PASSADO REVISITADO
Hoje passei uma boa parte da tarde a rever fotografias que fiz há vinte, trinta e mais anos.
Meu Deus! Santíssimo Senhor: quão grande fui então (bonito, forte, inteligente, rico, indestrutível e imortal). E quão pequenino sou agora (velho, fraco, medroso, vulnerável e altamente finito).
Descobri, pelas fotografias que fiz nesse tempo, que o tamanho do mundo cresceu incontroladamente desde então, e que hoje a minha insignificância nem sequer tem existência.
E descobri uma coisa espantosa e deprimente: afora as pessoas retratadas que já morreram (e foram algumas), as que, como eu, se mantêm vivas - também estão de certa forma mortas -. Não têm quase nada a ver com a pessoa que foram no passado. Não temos nada a ver com a pessoa que fomos no passado.
Eu, confesso-me deslocado; fora de tempo; na última curva antes da meta, enfrentando a certeza de que a vitória não será minha.
Mas antes de atingir a recta da meta, penso deixar aqui a maior parte das fotografias de que falo. Esperem só mais algumas semanas que poderão constatar da inexorabilidade do tempo.
Hoje passei uma boa parte da tarde a rever fotografias que fiz há vinte, trinta e mais anos.
Meu Deus! Santíssimo Senhor: quão grande fui então (bonito, forte, inteligente, rico, indestrutível e imortal). E quão pequenino sou agora (velho, fraco, medroso, vulnerável e altamente finito).
Descobri, pelas fotografias que fiz nesse tempo, que o tamanho do mundo cresceu incontroladamente desde então, e que hoje a minha insignificância nem sequer tem existência.
E descobri uma coisa espantosa e deprimente: afora as pessoas retratadas que já morreram (e foram algumas), as que, como eu, se mantêm vivas - também estão de certa forma mortas -. Não têm quase nada a ver com a pessoa que foram no passado. Não temos nada a ver com a pessoa que fomos no passado.
Eu, confesso-me deslocado; fora de tempo; na última curva antes da meta, enfrentando a certeza de que a vitória não será minha.
Mas antes de atingir a recta da meta, penso deixar aqui a maior parte das fotografias de que falo. Esperem só mais algumas semanas que poderão constatar da inexorabilidade do tempo.
sexta-feira, 10 de outubro de 2003
MAIS UMA FOTGRAFIA
(Legenda ctualizada hoje 28/10/2003)

Anos trinta do século XX.
Fotografia de família, tendo no centro "Nha Cristina Escrava" (assim chamada por ser descendente de escravos) a qual, depois do almoço, tinha por hábito fazer a sesta durante duas horas, tempo durante o qual nem mosca zumbia lá em casa, tal o respeito que os miúdos tinham por ela.
Destaques na foto:
1- Joaquim Botelho Monteiro (nhô Botedjo) o primeiro engenheiro electrotécnico cabo-verdiano. Licenciado em Paris, instalou a primeira central eléctrica na ilha do Fogo.
2- Miguel do Sacramento Monteiro, pai deste blogueador .
3- Manuel do Sacramento Monteiro, pai da Amélia, a depositária destas fotografias.
4- Luisa Macedo Barbosa S. Monteiro, mãe da Amélia.
Actualização:
Meu irmão, João do Sacramento Monteiro, enviou-me hoje, 28/10/2003, desde os Estados Unidos, um e-mail com a legenda completa desta fotografia. Ei-la:
De cima para baixo temos
Fila 1, de pé: tio Tadeu, Miguel nosso pai, tio Nelinho (Manuel) e tio Alberto,
Fila 2: Iracema, tio Antoninho, nhô Botelho e Bia nossa prima
Fila 3: tia Nhanhá (Leonarda), suas filhas Ana e Lilica (ao colo), nha Cristina, tia Dinora e prima Ana.
Fila 4: Primos Lencó (Lourenço), Totóne di nhô Botedjo, Tonas e Agnelo di nhô Botedjo.
(Legenda ctualizada hoje 28/10/2003)

Anos trinta do século XX.
Fotografia de família, tendo no centro "Nha Cristina Escrava" (assim chamada por ser descendente de escravos) a qual, depois do almoço, tinha por hábito fazer a sesta durante duas horas, tempo durante o qual nem mosca zumbia lá em casa, tal o respeito que os miúdos tinham por ela.
Destaques na foto:
1- Joaquim Botelho Monteiro (nhô Botedjo) o primeiro engenheiro electrotécnico cabo-verdiano. Licenciado em Paris, instalou a primeira central eléctrica na ilha do Fogo.
2- Miguel do Sacramento Monteiro, pai deste blogueador .
3- Manuel do Sacramento Monteiro, pai da Amélia, a depositária destas fotografias.
4- Luisa Macedo Barbosa S. Monteiro, mãe da Amélia.
Actualização:
Meu irmão, João do Sacramento Monteiro, enviou-me hoje, 28/10/2003, desde os Estados Unidos, um e-mail com a legenda completa desta fotografia. Ei-la:
De cima para baixo temos
Fila 1, de pé: tio Tadeu, Miguel nosso pai, tio Nelinho (Manuel) e tio Alberto,
Fila 2: Iracema, tio Antoninho, nhô Botelho e Bia nossa prima
Fila 3: tia Nhanhá (Leonarda), suas filhas Ana e Lilica (ao colo), nha Cristina, tia Dinora e prima Ana.
Fila 4: Primos Lencó (Lourenço), Totóne di nhô Botedjo, Tonas e Agnelo di nhô Botedjo.
sexta-feira, 3 de outubro de 2003
AI DJARFOGO, DJARFOGO!
De minha prima, Amélia Sacramento Monteiro, recebi esta fotografia que retrata a burguesia do Fogo nos anos trinta do século passado.

Temos aqui, da esquerda para a direita, Nilo Henriques (filho de Agnelo Henriques), Agnelo Henriques (sentado) e Manuel do Sacramento Monteiro (nhô Nelinho di nha Bia).
De minha prima, Amélia Sacramento Monteiro, recebi esta fotografia que retrata a burguesia do Fogo nos anos trinta do século passado.

Temos aqui, da esquerda para a direita, Nilo Henriques (filho de Agnelo Henriques), Agnelo Henriques (sentado) e Manuel do Sacramento Monteiro (nhô Nelinho di nha Bia).
sexta-feira, 19 de setembro de 2003
PARA ESCREVER TRITEZAS DESTAS ERA MELHOR ESTAR CALADO
Quando criei este blogue pensei que viria aqui falar também da África do presente. Mas o nosso continente só tem, hoje em dia, coisas tristes de que se possa falar. Está mais infecto que o Iraque, o Médio Oriente ou o Afeganistão: guerras, assassinatos, ladroeira generalizada, miséria, doença, fome e o mais que o diabo ainda nem sequer se lembrou de inventar. Mas que já há em África.
O terceiro país mais pobre de África é hoje a Guiné-Bissau.
A Guiné-Bissau, cuja independência uma elite cabo-verdiana ajudou a conquistar e a construir, deixou já de ser um país na verdadeira acepção da palavra.
Hoje a Guiné-Bissau não passa de um espaço verde habitado. Não passa de uma reserva natural em adiantado estado de degradação. Nada do que define um país funciona nesse espaço: governo, bancos, escolas, tribunais, repartições públicas, central eléctrica, rede de comunicações. Nenhuma destas estruturas funciona verdadeiramente, hoje, na Guiné.
Deixou de haver o Estado da Guiné-Bissau poucos anos depois de os cabo-verdianos, por escolha sua ou a isso forçados e obrigados, se terem afastado do poder e da administração pública daquele território.
O certo é que a Guiné só com guineenses transformou-se em nada.
Perdeu toda a credibilidade internacional e tem passado por vexames inomináveis sem que se veja o dia em que poderá entrar no rumo certo.
Para cúmulo do descrédito teve, até há poucos dias, um presidente bêbado, doido e autoritário que passava tardes inteiras sentado à porta do palácio presidencial (em plena rua) a jogar às cartas com amigos e a “mandar bocas” aos adversários políticos que passavam por perto. Uma chacota sem paralelo em qualquer parte do mundo.
Quando criei este blogue pensei que viria aqui falar também da África do presente. Mas o nosso continente só tem, hoje em dia, coisas tristes de que se possa falar. Está mais infecto que o Iraque, o Médio Oriente ou o Afeganistão: guerras, assassinatos, ladroeira generalizada, miséria, doença, fome e o mais que o diabo ainda nem sequer se lembrou de inventar. Mas que já há em África.
O terceiro país mais pobre de África é hoje a Guiné-Bissau.
A Guiné-Bissau, cuja independência uma elite cabo-verdiana ajudou a conquistar e a construir, deixou já de ser um país na verdadeira acepção da palavra.
Hoje a Guiné-Bissau não passa de um espaço verde habitado. Não passa de uma reserva natural em adiantado estado de degradação. Nada do que define um país funciona nesse espaço: governo, bancos, escolas, tribunais, repartições públicas, central eléctrica, rede de comunicações. Nenhuma destas estruturas funciona verdadeiramente, hoje, na Guiné.
Deixou de haver o Estado da Guiné-Bissau poucos anos depois de os cabo-verdianos, por escolha sua ou a isso forçados e obrigados, se terem afastado do poder e da administração pública daquele território.
O certo é que a Guiné só com guineenses transformou-se em nada.
Perdeu toda a credibilidade internacional e tem passado por vexames inomináveis sem que se veja o dia em que poderá entrar no rumo certo.
Para cúmulo do descrédito teve, até há poucos dias, um presidente bêbado, doido e autoritário que passava tardes inteiras sentado à porta do palácio presidencial (em plena rua) a jogar às cartas com amigos e a “mandar bocas” aos adversários políticos que passavam por perto. Uma chacota sem paralelo em qualquer parte do mundo.
domingo, 7 de setembro de 2003
TRADUÇÃO DE PORTUGUÊS PARA PORTUGUÊS
O treinador brasileiro da selecção portuguesa, Luís Felipe Scolari, disse ontem aos jornalistas, em conferência de imprensa, após a derrota dos portugueses frente à selecção espanhola por 3-0, o seguinte:
«Fui eu que joguei mal, fui eu que errei tacticamente, tomei três golos e um banho de bola. Os jogadores fizeram o que lhes foi pedido, por isso o culpado sou eu».
Ora bem, perante esta ironia tão descarada quão sarcástica, o que é que fizeram os repórteres (da TSF pelo menos pois eu estava a ouvi-los em directo)?
Disseram aos seus ouvintes que «Scolari assumiu todas as culpas pela derrota».
Meus caros senhores repórteres e jornalistas.
Deixem que este luso-cabo-verdiano vos traduza o português do brasileiro Scolari.
O que esse homem disse foi que:
Os jogadores portugueses não cumpriram minimamente as suas obrigações profissionais;
Não fizeram o que o treinador lhes pediu que fizessem;
E foi muito bem feita terem tomado três golos e um banho de bola.
Não era Fernando Pessoa que dizia que «a ironia é própria dos seres inteligentes»?
O treinador brasileiro da selecção portuguesa, Luís Felipe Scolari, disse ontem aos jornalistas, em conferência de imprensa, após a derrota dos portugueses frente à selecção espanhola por 3-0, o seguinte:
«Fui eu que joguei mal, fui eu que errei tacticamente, tomei três golos e um banho de bola. Os jogadores fizeram o que lhes foi pedido, por isso o culpado sou eu».
Ora bem, perante esta ironia tão descarada quão sarcástica, o que é que fizeram os repórteres (da TSF pelo menos pois eu estava a ouvi-los em directo)?
Disseram aos seus ouvintes que «Scolari assumiu todas as culpas pela derrota».
Meus caros senhores repórteres e jornalistas.
Deixem que este luso-cabo-verdiano vos traduza o português do brasileiro Scolari.
O que esse homem disse foi que:
Os jogadores portugueses não cumpriram minimamente as suas obrigações profissionais;
Não fizeram o que o treinador lhes pediu que fizessem;
E foi muito bem feita terem tomado três golos e um banho de bola.
Não era Fernando Pessoa que dizia que «a ironia é própria dos seres inteligentes»?
terça-feira, 26 de agosto de 2003
AI DJARFOGO, DJARFOGO
Estava a ler o poema “ILHAS” de Jorge Barbosa e ao chegar à parte que fala do Fogo expirei todo o ar que tinha nos pulmões e engoli estes versos que me transmudaram para o berço da ilha e me fizeram reviver em toda a plenitude o sentimento único de ter nascido naquela terra tão austera que produz homens – gentes tão especiais – que só de olhar para eles acreditamos que tudo é possível; que, como disse um poeta popular, «mi si n’pegâ mundo n’tâ dâ cu’él na tchon».
Escreve Jorge Barbosa:
«No Fogo há fumo ainda
A sair do vulcão!
…
No sangue rebelde e másculo
das gentes
revive
o ardor das lavas incandescentes!»
Estava a ler o poema “ILHAS” de Jorge Barbosa e ao chegar à parte que fala do Fogo expirei todo o ar que tinha nos pulmões e engoli estes versos que me transmudaram para o berço da ilha e me fizeram reviver em toda a plenitude o sentimento único de ter nascido naquela terra tão austera que produz homens – gentes tão especiais – que só de olhar para eles acreditamos que tudo é possível; que, como disse um poeta popular, «mi si n’pegâ mundo n’tâ dâ cu’él na tchon».
Escreve Jorge Barbosa:
A sair do vulcão!
…
No sangue rebelde e másculo
das gentes
revive
o ardor das lavas incandescentes!»
domingo, 24 de agosto de 2003
DOENTE À FORÇA
Numa tarde de sexta-feira um médico que habitava o mesmo apartamento que um seu irmão doente psiquiátrico achou que este estava bastante descompensado e iria estragar-lhe completamente o fim de semana. Achou ainda que uma boa solução para o problema seria: levar o irmão doente à urgência do Hospital Júlio de Matos em Lisboa e pedir ao colega de serviço que desse um jeito para que o irmão fosse internado ao menos durante o sábado e o domingo.
Convenceu o irmão psicótico a acompanhá-lo ao hospital e, uma vez lá chegados, enquanto andou à procura do local onde se localizava a urgência, o irmão doente, que conhecia os cantos à casa, deslocou-se rapidamente e foi falar com o médico de serviço perante quem se apresentou como colega pedindo-lhe um favor. Disse então o verdadeiro doente ao médico: «colega, daqui a pouco aparece por aqui um irmão meu doente mental psicótico que tem a mania de se dizer médico e que me quer internar à força. Acompanhei-o até aqui porque me está a dar uma trabalheira bestial em casa e queria pedir ao colega que o internasse até que se acalmasse, pelo menos este fim de semana».
Assim, quando o irmão médico conseguiu finalmente falar com o clínico de serviço e começou por se apresentar como colega pedindo àquele que lhe internasse o irmão doente, o clínico chamou logo o enfermeiro a quem encarregou de acompanhar “este doente” à enfermaria onde ele iria passar o fim de semana internado. E não se esqueceu de dizer ao enfermeiro: «se ele estiver agitado dê-lhe um sedativo que depois eu faço a prescrição».
Numa tarde de sexta-feira um médico que habitava o mesmo apartamento que um seu irmão doente psiquiátrico achou que este estava bastante descompensado e iria estragar-lhe completamente o fim de semana. Achou ainda que uma boa solução para o problema seria: levar o irmão doente à urgência do Hospital Júlio de Matos em Lisboa e pedir ao colega de serviço que desse um jeito para que o irmão fosse internado ao menos durante o sábado e o domingo.
Convenceu o irmão psicótico a acompanhá-lo ao hospital e, uma vez lá chegados, enquanto andou à procura do local onde se localizava a urgência, o irmão doente, que conhecia os cantos à casa, deslocou-se rapidamente e foi falar com o médico de serviço perante quem se apresentou como colega pedindo-lhe um favor. Disse então o verdadeiro doente ao médico: «colega, daqui a pouco aparece por aqui um irmão meu doente mental psicótico que tem a mania de se dizer médico e que me quer internar à força. Acompanhei-o até aqui porque me está a dar uma trabalheira bestial em casa e queria pedir ao colega que o internasse até que se acalmasse, pelo menos este fim de semana».
Assim, quando o irmão médico conseguiu finalmente falar com o clínico de serviço e começou por se apresentar como colega pedindo àquele que lhe internasse o irmão doente, o clínico chamou logo o enfermeiro a quem encarregou de acompanhar “este doente” à enfermaria onde ele iria passar o fim de semana internado. E não se esqueceu de dizer ao enfermeiro: «se ele estiver agitado dê-lhe um sedativo que depois eu faço a prescrição».
terça-feira, 5 de agosto de 2003
VIVA O PROFESSOR ADRIANO MOREIRA! VIVAAAAAAA!
COISAS DA JUVENTUDE
Em 1962 o Professor Adriano Moreira, então ministro do ultramar, visitou Cabo Verde tendo-se hospedado na ilha do Fogo na casa do administrador do concelho, Ildo Maria Feijóo.
Fumador inveterado - ao que se dizia - o professor Adriano Moreira deve ter ficado muito arreliado com a carteira de dez maços de cigarros que alguém surripiou do quarto dele e mais tarde distribuiu pela rapaziada de S. Filipe que numa noite tropical de serenata acompanhou as mornas e o violão fazendo arder pela madrugada fora os saborosos cigarros "Parliament" de filtro longo, entre copos de gróg e de brandy.
O nosso saudoso Tita (que descanse em paz) foi quem recebeu no ar o pacote atirado desde a varanda do primeiro andar da casa do administrador. E foi ele que se encarregou da distribuição do material com a consciência plena de que se tratava de um acto revolucionário.
Desculpe, professor. Não fui eu quem "desviou" os cigarros. Mas fumei-os. E gostei. E também me senti revolucionário como os outros.
Nesse tempo ouvíamos muito a "Rádio Moscovo" e depois ouvíamos o programa da "Emissora Nacional", "Rádio Moscovo Não Fala Verdade", para nos rirmos até às lágrimas.
De facto não havia outra solução senão a descolonização. Mal ou bem feita.
Eu, por mim choro. E um dia, se tiver coragem, explicarei porquê.
COISAS DA JUVENTUDE
Em 1962 o Professor Adriano Moreira, então ministro do ultramar, visitou Cabo Verde tendo-se hospedado na ilha do Fogo na casa do administrador do concelho, Ildo Maria Feijóo.
Fumador inveterado - ao que se dizia - o professor Adriano Moreira deve ter ficado muito arreliado com a carteira de dez maços de cigarros que alguém surripiou do quarto dele e mais tarde distribuiu pela rapaziada de S. Filipe que numa noite tropical de serenata acompanhou as mornas e o violão fazendo arder pela madrugada fora os saborosos cigarros "Parliament" de filtro longo, entre copos de gróg e de brandy.
O nosso saudoso Tita (que descanse em paz) foi quem recebeu no ar o pacote atirado desde a varanda do primeiro andar da casa do administrador. E foi ele que se encarregou da distribuição do material com a consciência plena de que se tratava de um acto revolucionário.
Desculpe, professor. Não fui eu quem "desviou" os cigarros. Mas fumei-os. E gostei. E também me senti revolucionário como os outros.
Nesse tempo ouvíamos muito a "Rádio Moscovo" e depois ouvíamos o programa da "Emissora Nacional", "Rádio Moscovo Não Fala Verdade", para nos rirmos até às lágrimas.
De facto não havia outra solução senão a descolonização. Mal ou bem feita.
Eu, por mim choro. E um dia, se tiver coragem, explicarei porquê.
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