quarta-feira, 28 de março de 2012

O SENTIDO DA VIDA E O SUICÍDIO


Só há um problema filosófico verdadeiramente sério: é o suicídio. Julgar se a vida merece ou não ser vivida, é responder a uma questão fundamental da filosofia. [...] O resto, se o mundo tem três dimensões, se o espírito tem nove ou doze categorias, vem depois. São apenas jogos; primeiro é necessário responder.

Galileu, que possuía uma verdade cientifica importante, dela abjurou com a maior das facilidades deste mundo, logo que tal verdade pôs a sua vida em perigo. Fez bem, em certo sentido. Essa verdade não valia a fogueira.

Em contrapartida, vejo que muitas pessoas morrem por considerarem que a vida não merece ser vivida. Outros vejo que se fazem paradoxalmente matar pelas ideias ou pelas ilusões que lhes dão uma razão de viver (o que se chama uma razão de viver é ao mesmo tempo uma excelente razão de morrer). Julgo pois que o sentido da vida é o mais premente dos assuntos — das interrogações. Como responder-lhe? Em todos os problemas essenciais (e por tal entendo os que podem fazer morrer e os que decuplicam a paixão de viver) só há provavelmente dois métodos de pensamento, o de La Palisse e o de Don Quixote.

É o equilíbrio da evidência e do lirismo o único que nos faculta ao mesmo tempo o acesso à emoção e à clareza. Num assunto ao mesmo tempo tão humilde e tão cheio de patético, a dialéctica sábia e clássica deve pois ceder o seu lugar, é fácil de conceber, a uma atitude de espírito mais modesta que deriva ao mesmo tempo do bom senso e da simpatia.

[Albert Camus in O Mito de Sísifo]