sábado, 15 de outubro de 2011

(VI) Alors Que faire?

                        Prática de Actuação Sexta:

Ser culto es el único modo de ser libre
José MARTÍ (1853-1895)

Quiçá a “arte do presente”!

(1)           É o tropo do nosso tempo: Situar a questão da cultura  no domínio do além. Na viragem do século, encontramo-nos menos preocupados com o exício (a morte do autor) ou com a epifania (o nascimento do sujeito). A nossa existência é marcada (presentemente), por um sentimento obscuro da sobrevivência, uma vida nas mãos do “presente” para a qual (se nos afigura), não ter outro nome que astúcia (tão clássica) como controvertida do prefixo “pós”: pós-moderno, pós-colonialismo, pós-feminismo...
(2)           Com efeito (et pour cause), o “além” não é (nem) um novo horizonte (nem) um modo de deixar atrás de si o passado... O princípio e o fim podem ser mitos núncios  para os anos medianos. Todavia, neste fim de século, encontramos (neste momento de trânsito): Em que o espaço e o tempo se intersectam para produzir figuras complexas de diferença e de identidade (de passado e de presente), de interior e de exterior (de inclusão e de exclusão). Existe (com efeito), no “além” um sentimento de desorientação, uma perturbação da direcção: um movimento incessante de exploração. Ou seja: (aqui e acolá, de todos os sentidos, aqui e ali, para frente e para trás).
(3)           Por seu turno, o abandono das singularidades de “classe” ou de “género”, enquanto categorias conceptuais e organizacionais primárias acarretou uma tomada de consciência das posições do sujeito(raça, género, geração, posicionamento institucional, lugar geopolítico, orientação sexual), que perseguem toda afirmação de identidade do mundo hodierno.

(4)           De sublinhar (antes de mais), que o que é inovador no plano teórico (e crucial, no plano político), é a necessidade de superar as narrativas de subjectividades originárias e iniciais para concentrar nos momentos ou nos processos produzidos na articulação das diferenças culturais. Estes espaços “intersticiais” oferecem um terreno para a elaboração destas estratégias do Si (singular ou comum), que iniciam novos sinais de identidade e dos sítios inovadores de colaboração e de contestação, no âmbito do próprio acto de definir a ideia de Sociedade.
(5)           Demais, é na emergência dos interstícios (no cavalgamento e na deslocação dos domínios de diferença), que se negoceiam as experiências intersubjectivas e colectivas de pertença à nação (de interesse comum ou de valor cultural).
(6)           Do arrazoado (acima expendido), se arvoram as (oportunas e pertinentes), questões, que podem ser formuladas, nos seguintes termos:
a.     Como são formados sujeitos no “interstício” ou no excesso da soma das “partes” de diferença (em geral concebidas como raça/classe/género, etc.)?
b.    Como as estratégias de representação ou de tomada de poder advêm (elas) formular-se nas revindicações concorrentes de comunidades no seio das quais, a despeito de histórias partilhadas de privação e de discriminação, as permutas de valores, de significações e de prioridades não se operam (sempre) na colaboração e no diálogo, podem, porém, ser (profundamente) antagonistas, conflituais e mesmo incomensuráveis?
(7)           De anotar (antes de mais), que (na verdade), o poder destas questões é corroborado pela “linguagem” das recentes crises sociais provocadas pelas histórias de diferença cultural. Os conflitos em Los Angeles entre Coreanos, Mexicanos-Americanos e Afro-Americanos giram (em torno) do conceito de “irrespeito” (um termo/expressão)forjado nas mãos da privação étnica que é (ao mesmo tempo), o sinal de uma violência racializada e o sintoma de vitimização social.
(8)           Enfim, de referir, que na sequência do caso dos Versículos satânicos, em Grã-Bretanha, as feministas negras e irlandesas (a despeito das suas diferenças) uniram-se numa causa comum contra a “racialização da religião” considerada como discurso dominante, pelo qual o Estado representa os seus conflitos e os seus combates (fossem) seculares ou mesmo “sexuais”.
Lisboa, 09 Outubro 2011
KWAME KONDÉ
(Intelectual/Internacionalista --- Cidadão do Mundo).