sábado, 15 de outubro de 2011

(VII) Alors Que faire?

Prática de Actuação Sétima:

No cerne dos termos do
“engajamento” cultural:

Ser culto es el único modo de ser libre
José MARTÍ (1853-1895)

“Hello America
this is the voice of Gran Vato Cherollero
broadcasting from the deserts of Nogales, Arizona
zona de libre cogercio
2000 megahertz en todas direciones

you are celebrating Labor Da in Seattle
while the klan demonstrates
against Mexicans in Georgia
ironia, 100% ironia
                                    GUILLERMO GOMEZ-PENA
(Artista de performance que vive---designadamente entre outros tempos e lugares---na fronteira do México e dos Estados Unidos).

(A)       Não há dúvida nenhuma, que os termos do compromisso cultural (antagonistas ou filiados), são produzidos, num modo performativo. Eis porque, a representação da diferença não deve ser lida (precipitadamente), como o reflexo de caracteres culturais ou étnicos preexistentes, gravados no mármore da tradição estabelecida. De anotar (aliás), que (do ponto de vista da minoria), a articulação social da diferença constitui uma negociação complexa e incessante que envida em autorizar hibridações sociais (que emergem), nos momentos de transformação histórica.
(B)       E, já agora, impõe sublinhar (antes de tudo), que o “direito” de significar, desde a periferia dos poderes e dos privilégios estabelecidos não se apoia na persistência da tradição. Sim (efectivamente), recupera vigor pelo poder da tradição para se reinscrever nas condições contingentes e contraditórias que constituem o quinhão dos que se situam “na minoria”.

(C)       Eis porque, no âmbito desta dinâmica e perspectiva, o reconhecimento que confere a tradição é uma forma parcial de identificação. De facto, reencenando o passado  (ela) introduz temporalidades outras (incomensuráveis), na invenção da tradição.


(D)       De salientar, que este processo (por seu turno) aliena todo acesso imediato à uma identidade originária ou à uma tradição “transmitida”. Por seu turno, as lutas situadas nos limites da diferença cultural podem ser (tão frequentemente), consensuais como conflituais. Elas podem assumir (por defeito), as nossas definições da tradição e da modernidade; realinhar as fronteiras clássicas entre privado e público, entre alto e baixo e pôr em causa as espectativas normativas de desenvolvimento e de progresso.
(E)       Na verdade (et pour cause), colocar as questões de solidariedade e de comunidade (do ponto de vista intersticial), permite uma escalada (em força política) e o alargamento da causa multicultural. As diferenças sociais não são (meramente), dadas à viver, no quadro de uma tradição cultural (já autentificada). Elas constituem o sinal de emergência de uma comunidade encarada como um projecto (visão e construção, simultaneamente), que nos conduz “ao “além” para melhor voltar, num espírito de revisão e de reconstrução, nas condições políticas do presente. Ou seja:
(F)       Com efeito
a.     “Mesmo (então), e ainda uma luta de poder entre dissemelhantes grupos no seio dos étnicos para saber o que é dito, quem disse e quem representa quem.
b.    O que é uma comunidade (seja como for)?
c.     O que é uma comunidade negra?
d.    O que é uma comunidade latino?
No fundo (no fundo), é assaz difícil encarar todas estas coisas como categorias assentes e monolíticas.

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            Donde e daí, uma vez posto as ideias de fundo, temos (então):
(a)           O além significa a distância espacial. Marca o progresso e promete o futuro. Todavia, as nossas interpelações para transpor a barreira ou a fronteira (o próprio acto de ir além),  são irreconhecíveis, inconcebíveis (sem retorno no “presente”, vazio e deslocado), por este processo de repetição. Por seu turno, o imaginário da distância espacial (viver, por assim dizer, fora dos limites do nosso tempo), põe em evidência as diferenças temporais e sociais que interrompem o nosso sentimento de colusão com a coetaneidade cultural.
(b)           De feito, o presente (já não) pode ser encarado como uma mera ruptura ou um mero vínculo/elo com o passado e o futuro. Já não é uma presença sincrónica, pois que (efectivamente), a nossa presença imediata (à nós próprios), a nossa imagem pública se revelam nas suas descontinuidades, nas suas desigualdades, nas suas minorias.
(c)           Finalmente (ao invés), no âmbito do impasse da História (desenredada), o tempo sequencial como os grãos de um rosário (esforçando-se) estabelecer conexões seriais e causais.

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            Com efeito, se o jargão do nosso tempo (pós-modernidade, pós-colonialismo, pós-feminismo), possui uma insignificante significação (ela), não se apoia no uso corrente do “pós” para indicar o sequencial (o após feminismo), ou a polaridade (anti-modernismo). Estes termos que designam o além com tanta insistência, só podem encarnar a sua infatigável energia revisionista se fazem do presente um sítio dilatado de excêntrico de experiência e de tomada de poder. Deste modo, se o interesse para o pós-modernismo se limitar em celebrar a fragmentação das “grandes narrativas” do racionalismo pós-Luzes, permanece (qualquer que seja) a excitação intelectual que suscita, um empreendimento (profundamente) provinciano.

                        Enfim e, em suma:
            A significação (mais lata) da condição pós-moderna apoia-se na consciência que os “limites” epistemológicos destas ideias etnocêntricas constituem (outrossim), as fronteiras enunciativas de toda uma gama de outras histórias e de outras vozes dissonantes, até dissidentes (as mulheres, os colonizados, os grupos étnicos, os grupos minoritários, os portadores de sexualidades sob vigilância).
            Demais (e tendo em conta), que a demografia do novo internacionalismo é a história da migração pós-colonial, dos relatos da diáspora cultural e política, dos vastos movimentos sociais de comunidades camponesas e aborígenes, da poesia do exilo, da sombria prosa dos refugiados políticos e económicos.
            É, neste sentido (de facto), que a fronteira se torna no lugar, à partir do qual algo começa à constituir um movimento comparável à articulação ambulante e ambivalente do além (já mencionado):
Sempre e de modo (cada vez mais), dissemelhante, a ponte
aqui ou acolá, conduz os caminhos hesitantes ou apressados
para que os homens possam ir para outras margens (...). A
ponte agregada visto que constitui o impulso que dá
passagem (...)”.

Lisboa, 11 Outubro 2011
KWAME KONDÉ
(Intelectual/Internacionalista --- Cidadão do Mundo).