“Ser culto es el único modo de ser libre”
José MARTÍ (1853-1895).
Como complemento oportuno das duas últimas Epístolas,
Se nos afigura pertinente expender o seguinte:
(1) A China mantém (enfim), relações diplomáticas (estreitas) com muitos Países sub sarianos. Ela utiliza o seu assento permanente no Conselho de Segurança para se fazer de porta-voz, até de protector de regimes amigos. Em virtude do Princípio de não ingerência, Pequim abandonou (deste modo) várias párias da Comunidade Internacional. O Sudão de Omar el-Béchir e o Zimbabwe de Robert Magabe, expostos às sanções da Comunidade Internacional, beneficiaram de apoios preciosos da parte das autoridades chinesas, enquanto conduziam assaltos (em regra) contra os direitos humanos dos seus cidadãos.
(2) Quiçá, o mais surpreendente é que a China agiu (por vezes) contra os seus próprios interesses para conservar a sua legitimidade de porta-voz do Terceiro Mundo. Foi (precisamente), no caso das negociações do ciclo de DOHA, em que Pequim se opôs à uma baixa das tarifas aduaneiras nos Países do Sul (afim de não se dissociar do bloco dos países em vias de desenvolvimento), conduzido pela Índia. Outro símbolo marcante é o “presente especial” oferecido (graciosamente) à União Africana (UA). Estamos a referir (obviamente) ao gigantesco complexo de Conferência em Adis-Abeba, um elevado Edifício de 25 andares, opulento e contendo 500 gabinetes, que foi concebido, construído e financiado (integralmente), pela China.
(3) A “China amarela”, a dos camponeses, dos grandes espaços continentais e das tradições, foi (muito tempo) oposta à “China azul”, a dos mandarins, do mar e das permutas com o Mundo. A fulminante ascensão da China em África parece confirmar a ascendência da China azul, neste início de século. Através do encorajamento do seu Sector privado no sub continente, a formação de jovens africanos, o estabelecimento de centros culturais chineses, a sua ajuda ao desenvolvimento e a sua ofensiva de canal diplomático, Pequim experimenta em África uma nova política estrangeira (profundamente) internacionalista. Sinal dos tempos que mudam, em que o viajante, transitando de Pequim a Lagos (Nigéria), já não passa por Londres, Bruxelas ou Paris. Novas linhas aéreas florescem entre os dois continentes.
(4) Donde (avisadamente) se pode questionar: Se este “soft power” (este modelo chinês) constitui as premissas de uma era de liderança asiática? Na verdade, o balbucio da China África (que se nos depara) ao alvorecer do Século XXI inicia (então) uma nova Época, a em que os Europeus e Americanos perderiam o “monopólio da História”.
E, em jeito de Remate, vale a pena, elucidar (outrossim e, ainda), alguns factos (assaz relevantes), no âmbito desta actual temática:
--- Não é do interesse chinês aliar-se ao que a África tem de “pior”, aparecer como usurário do Continente, a ponto de se tornar o génio mau (corrupto).
--- Pequim tem uma consciência aguda que um dos maiores desafios da parceria nascente será não decepcionar as imensas expectativas dos Africanos.
--- Igualdade entre parceiros, prossecução de benefícios recíprocos, respeito da soberania nacional (a retórica não insignificante, obviamente).
--- Os Africanos são sensíveis aos pilares sobre os quais se estabelecem as suas relações com a China e não falecerão de os lembrar aos seus interlocutores em caso de alheamento a estes princípios.
--- A despeito dos receios que transparecem em alguns discursos europeus é (por conseguinte) provável que a liberdade reencontrada pelos Estados Africanos de escolher as suas relações, não os impele a se lançar na goela do dragão. De feito, os Africanos (já) perderam o fruto das suas independências uma vez. Donde, uma vez reencontrado (eles) não se o deixam roubar de novo.
Enfim e, em suma:
-- A penhora chinesa sobre a África, resgate da África pelos petro-dólares do Golfo, novo colonialismo asiático, o perigo amarelo…os fantasmas acerca da irrupção de novos parceiros (pouco escrupulosos) mascaram uma evolução bem real: Como se fosse o Brasil, a Índia e muitos Estados árabes, a China absorveu a dimensão das mudanças (em curso), no sub continente e reconsiderou a natureza das suas relações com a África. Estas novas colaborações são ricas em ensinamentos e lições para a Europa e os Estados Unidos da América do norte, pois que entram em concorrência com os discursos, visões e projectos ocidentais perante o Continente. Elas obrigam os parceiros tradicionais da África a reflectir na relação que (eles) lhe propõem. Os seus êxitos ensinam (avisadamente) que os Africanos desejam falar do futuro, como parceiros e (outrossim, sobretudo) de interesses mútuos, a longo prazo.
Lisboa, 31 Março 2011
KWAME KONDÉ
(Intelectual/Internacionalista --- Cidadão do Mundo).