quarta-feira, 12 de maio de 2010

NA peugada de NOVOS RUMOS:

Kwame Kondé inicia hoje um novo ciclo de colaboração com este blogue que em parte também é seu.


Estudo Primeiro:

Ser culto es el único modo de ser libre

José MARTÍ (1853-1895)

Acerca da Génese da Sociedade Civil:

Peça ensaística Primeira:

(1) Face às dissemelhantes formas de coerção e de exploração, se vê constituir, movimentos, que visam exprimir as aspirações dos que aparecem como vítimas da globalização, na sua assunção, a mais deletéria.

(2) Face ao establishement, nos elóquios das elites e das instituições, a referência ao conceito de Sociedade Civil é, frequentemente utilizada para denominar o que é, por excelência, da ordem do “não-governamental”.

(3) No entanto, a Sociedade Civil é uma noção relativamente delicada, à qual se associa as redes e as ONG (Organizações não governamentais) que se desfraldam através do Planeta. Deste modo e, no âmbito desta dinâmica e, visando uma melhor reflexão sobre esta percuciente temática, se impõe considerar, algumas questões de ordem genealógica (assaz pertinentes).

a. Em primeiro lugar, tem-se, demasiado, frequentemente tendência a ver na expressão Sociedade Civil, um conceito eminentemente hegeliano. Na verdade, se o autor dos Princípios da Filosofia do Direito popularizou a expressão, ele próprio, a emprestou à uma tradição mais antiga, que remonta ao koimona politiké de Aristóteles (384-322 a C), em latim (Societas civis) e que foi amplamente utilizada, no âmbito da Filosofia Política dos séculos XVII e XVIII, respectivamente.

b. Por sua Vez, o filósofo empirista inglês, Jonh LOCKE (1632-1704), consagra um capítulo inteiro, à esta questão, em análise e estudo, concretamente, no seu Segundo Tratado do Governo civil, onde opõe a sociedade ao Estado de Natureza: ela se submete às leis, marca o triunfo da civilização sobre a “selvajaria”. A acepção que LOCKE outorga à noção, tem, muito a ver com uma sociedade dotada de uma organização Jurídica e Política. Aliás, não é, por um mero acaso, que o filósofo intitula o capítulo VII do seu Tratado: “Da Sociedade Política ou da Sociedade civil”.

c. E, mais geralmente, autores tão dissemelhantes como o filósofo e escritor francês, de origem suíça, Jean-Jacques ROUSSEAU (1712-1778) e o filósofo inglês (o primeiro dos empiristas ingleses), Thomas HOBBES (1588-1679), identicamente, legitimaram a formulação: sociedade civil e sociedade política, pois o que lhes importa é sublinhar a diferença deste “estado civil” em relação ao estado de natureza, que se caracteriza pela ausência de vínculo político.

d. Por seu turno, o filósofo, pensador e político canadiano, Charles TAYLOR (n-1931), ao retraçar a genealogia do conceito moderno de sociedade civil, atribui-lhe uma dupla origem, por um lado, em LOCKE e, por outro, em MONTESQUIEU (o crítico e moralista francês---1695-1755).

e. LOCKE, por sua vez, considera, que a sociedade civil assenta num contrato social inviolável, que precede o Estado. Ela (a Sociedade) é, por conseguinte, assaz independente e, existe, por assim dizer (de algum modo) “para além” dele e pode lutar contra a sua influência e ascendente respectivo. Existe, de feito, uma diferença entre o pacto de união e o pacto de sujeição pelo qual, se aceitam submeter a um poder.

f. Já para MONTESQUIEU, em contrapartida, a sociedade civil não é separável da autoridade política. Nesta perspectiva, o que interessa ao autor De l’esprit des lois (obra de 1748, aliás, a sua grande obra política) é o modo cujo o poder, coluna vertebral da sociedade, se diversifica e gera corpos intermediários, que desempenham o papel de contra-poderes, ou, pelo menos, permitem o exercício do check and balance fundamental para que o estado de direito seja efectivo.

g. De feito, importa sublinhar, que na versão de LOCKE, a sociedade civil seria, por conseguinte, um espaço público susceptível de preservar a sua autonomia em relação ao poder político, enquanto, na versão de MONTESQUIEU, os organismos e as associações, que a constituem prolongam o político, de forma não unívoca, visto que podem ser, outrossim, contestatários como instrumentalizados por este último.

h. Evidentemente, acrescenta TAYLOR, ao longo do tempo, as duas correntes confluíram. Se mesclaram e, eis porque, uma distinção rígida não é defensável. O que é seguro é que se pode, presentemente, ainda interpretar a referência ao conceito, utilizando esta grelha. Ou seja:

i. Por um lado, permite compreender em quê a questão da articulação entre política e sociedade permanece central para pensar o ataviamento do conceito.

ii. Por outro, ajuda a problematizar o carácter, frequentemente ambivalente das organizações, que se reclamam da sociedade civil, quando afirmam a sua independência dos poderes, a sua “não governamentabilização” e, que, em outros contextos, fazem influir todo o seu peso sobre estes poderes.

Lisboa, 10 Maio 2010

KWAME KONDÉ

(Intelectual/Internacionalista --- Cidadão do Mundo)

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