INTERVENÇÃO TRIGÉSIMA QUINTA:
(II):
(II):
O Pensamento sengoriano conheceu no período da sua juventude um episódio de racismo, quão breve e, quão efémero, conceptualizado sob a famigerada fórmula sartriana designada de “racisme antiraciste”. De anotar, em jeito de precisão oportuna, que esta fórmula em apreço e análise, foi assumida, num determinado momento por SENGHOR e rejeitada noutras ocasiões, tais como, por exemplo, no seu discurso pronunciado, a 21 Abril 1961, na Sorbone. Nesse dia, SENGHOR, no atinente à referida fórmula asseverá que:”Sartre n’a pas tout à fait raison”. Todavia, opostamente, na sua obra Négritude et humanisme (1964, p. 8) SENGHOR se fez exacto, ou seja:”La Négritude – asseverou – n’est donc pas racisme; si elle s’est faite d’abord raciste, c’était par antiracisme, comme l’a remarqué Jean-Paul Sartre, dans Orphée noir ».
De feito, SARTRE tinha forjado esta noção, em 1948, no prefácio que escreveu para uma antologia da poesia negra e malgaxe organizada então por SENGHOR, em que outorgou uma interpretação dialéctica da ideologia nascente: “En fait – asseverá SARTRE – la négritude apparaît comme le temps faible d’une progression dialectique; l’affirmation théorique et pratique de la suprématie du Blanc est la thèse; la position de la négritude comme valeur antithétique est le moment de la négativité. Mais ce moment négatif n’a pas de suffisance par lui-même et les Noirs qui en usent le savent for bien ; ils savent qu’il vise à préparer la synthèse ou réalisation de l’humain dans une société sans race. »
De sublinhar, porém, o que podia ser denominado racismo antiracista em SENGHOR legitimava duas coisas, designadamente:
---Primeiramente, pelo facto de desde a primeira Guerra Mundial, a questão racial e, mais precisamente, a “questão negra” se politizou, apoiada nesta dinâmica, pela rejuvenescência intelectual do panafricanismo que se organiza desde o início do século e da revolução de OUTUBRO na Rússia.
Ulteriormente, porque, em torno, do ano de 1929, a ideia de consciência racial desenvolvida por revistas especializadas e, não só, outrossim, revezada, através de uma nova literatura negra em gestação, vai determinar posturas e atitudes reivindicativas e militantes voltadas para a busca ou para a conquista da dignidade racial ao nível da intelligentsia negra na Europa.
(III):
E, no âmbito desta dinâmica e perspectiva, em SENGHOR, que vai lançar com os intelectuais antilhanos, Aimé CÉSAIRE (1913-2008) e Léon Gontran DAMAS (1912-1978), respectivamente, o movimento da négritude a patir do ano de 1932, o culto dos valores da raça e do “sang noir” vai se traduzir numa Literatura que se prolongará, ulteriormente, em elaborações teóricas mais ponderadas.
E, outrossim, mais tarde, o teórico da négritude dirá: “Je le confesse, toute orgueil se transforma vite en racisme; il n’est pas jusqu’au nazisme qui ne fut accepté pour renforcer notre refus de coopération…Nous avions alors la sincérité de la jeunesse et de la passion ». SENGHOR in Pierre Teilhard de Chardin et la politique africaine, Paris, Seuil, 1965, p. 20 et sq.
Deste modo, como corolário lógico, SENGHOR instalará num racialismo não racista.
Eis porque, a sua problemática de civilização do Universal só podia resultar de um pensamento da exclusão, de preferência, porém da complementaridade. Esta problemática em questão será desenvolvida através de um recurso a metáforas agronómicas e ópticas.
SENGHOR principia, destarte, por se servir dos ensinamentos oriundos da lavra do humanista francês, o reverendo/padre Francis AUPIAIS (1877-1945), recorrendo a imagem do enxerto do “scion sur le sauvageon”. Será questão de “lumière” e de “nuit”, de “levain” necessário para a “farine blanche”. Todavia, é sobretudo o pensamento do padre Teilhard de CHARDIN que fornecerá a SENGHOR a trama teórica permitindo ordenar de modo coerente, as suas ideias acerca da complementaridade das raças. Assim, o humanismo universalista e um determinado evolucionismo de tipo biologista constituem os factores de desconexão ou de libertação do pensamento sengoriano de toda lógica racista.
Demais, SENGHOR encontrará na linguagem “metabiológica” (oriunda de BERGSON e de Teilhard de CHARDIN), um meio de expressão apropriado e, outrossim, um pólo de ancoragem para um elóquio fundamentalmente biologista, pelo facto de se encontrar estruturado, em torno, de um determinismo racial além dos enunciados culturalistas.
Com efeito, a cultura ela própria é outrossim definida pelo teórico da négritude como uma “reacção racial” do homem sobre o seu meio.
Eis porque, a raça em SENGHOR se converte no lugar de verdade de toda cultura. É por ela que se explica a existência de invariantes culturais observados no Negro Africano transplantado para outros meios geográficos (América do Norte e do Sul entre demais outros).
Enfim e, em suma, na verdade, a despeito das condições sociais e económicas dissemelhantes do meio de origem, SENGHOR preservaria, no entanto, a mesma cultura pelo constrangimento da biologia racial: “Ce qui me frappe – assevera SENGHOR – chez les Nègres d’Amérique, c’est la permanence des caractères non pas physiques mais psychiques du Negro-Africain malgré le métissage, malgré le milieu nouveau”. SENGHOR, Liberte I, Paris, Seuil, 1964, p. 254. E, avisadamente prossegue: Que não me falem de “segregação”: seguramente a segregação explica, em parte, a permanência dos caracteres psíquicos, singularmente o dom de emoção. Ela não explica tudo, sobretudo nos Negros da América latina, onde a segregação é menos real.
E remata: “J’ai dit malgré le milieu, car le milieu agit à la longue. C’est d’abord lui qui informe l’économie, puis la société, et finit par provoquer ces mutations qui deviennent héréditaires. »
Donde e daí, a presença do paradigma biologista se afigura francamente manifesto no cerne do seu pensamento.
Finalmente, por outro, não há dúvida nenhuma, que a divisão racial das aptidões culturais se assume, no pensamento de SENGHOR, uma convicção teórica indiscutível. Ou seja:
“Il ne faut pas méconnaître et forcer son génie – assevera -, même, surtout dans le domaine de l’âme et de l’esprit.
« Croyez-vous que nous puissions jamais battre les Européens dans la mathématique, les hommes singuliers exceptés, qui confirment que nous ne sommes pas une race abstraite. » SENGHOR, Liberté II, Paris, Seuil, 1968, p. 154.
De feito, SARTRE tinha forjado esta noção, em 1948, no prefácio que escreveu para uma antologia da poesia negra e malgaxe organizada então por SENGHOR, em que outorgou uma interpretação dialéctica da ideologia nascente: “En fait – asseverá SARTRE – la négritude apparaît comme le temps faible d’une progression dialectique; l’affirmation théorique et pratique de la suprématie du Blanc est la thèse; la position de la négritude comme valeur antithétique est le moment de la négativité. Mais ce moment négatif n’a pas de suffisance par lui-même et les Noirs qui en usent le savent for bien ; ils savent qu’il vise à préparer la synthèse ou réalisation de l’humain dans une société sans race. »
De sublinhar, porém, o que podia ser denominado racismo antiracista em SENGHOR legitimava duas coisas, designadamente:
---Primeiramente, pelo facto de desde a primeira Guerra Mundial, a questão racial e, mais precisamente, a “questão negra” se politizou, apoiada nesta dinâmica, pela rejuvenescência intelectual do panafricanismo que se organiza desde o início do século e da revolução de OUTUBRO na Rússia.
Ulteriormente, porque, em torno, do ano de 1929, a ideia de consciência racial desenvolvida por revistas especializadas e, não só, outrossim, revezada, através de uma nova literatura negra em gestação, vai determinar posturas e atitudes reivindicativas e militantes voltadas para a busca ou para a conquista da dignidade racial ao nível da intelligentsia negra na Europa.
(III):
E, no âmbito desta dinâmica e perspectiva, em SENGHOR, que vai lançar com os intelectuais antilhanos, Aimé CÉSAIRE (1913-2008) e Léon Gontran DAMAS (1912-1978), respectivamente, o movimento da négritude a patir do ano de 1932, o culto dos valores da raça e do “sang noir” vai se traduzir numa Literatura que se prolongará, ulteriormente, em elaborações teóricas mais ponderadas.
E, outrossim, mais tarde, o teórico da négritude dirá: “Je le confesse, toute orgueil se transforma vite en racisme; il n’est pas jusqu’au nazisme qui ne fut accepté pour renforcer notre refus de coopération…Nous avions alors la sincérité de la jeunesse et de la passion ». SENGHOR in Pierre Teilhard de Chardin et la politique africaine, Paris, Seuil, 1965, p. 20 et sq.
Deste modo, como corolário lógico, SENGHOR instalará num racialismo não racista.
Eis porque, a sua problemática de civilização do Universal só podia resultar de um pensamento da exclusão, de preferência, porém da complementaridade. Esta problemática em questão será desenvolvida através de um recurso a metáforas agronómicas e ópticas.
SENGHOR principia, destarte, por se servir dos ensinamentos oriundos da lavra do humanista francês, o reverendo/padre Francis AUPIAIS (1877-1945), recorrendo a imagem do enxerto do “scion sur le sauvageon”. Será questão de “lumière” e de “nuit”, de “levain” necessário para a “farine blanche”. Todavia, é sobretudo o pensamento do padre Teilhard de CHARDIN que fornecerá a SENGHOR a trama teórica permitindo ordenar de modo coerente, as suas ideias acerca da complementaridade das raças. Assim, o humanismo universalista e um determinado evolucionismo de tipo biologista constituem os factores de desconexão ou de libertação do pensamento sengoriano de toda lógica racista.
Demais, SENGHOR encontrará na linguagem “metabiológica” (oriunda de BERGSON e de Teilhard de CHARDIN), um meio de expressão apropriado e, outrossim, um pólo de ancoragem para um elóquio fundamentalmente biologista, pelo facto de se encontrar estruturado, em torno, de um determinismo racial além dos enunciados culturalistas.
Com efeito, a cultura ela própria é outrossim definida pelo teórico da négritude como uma “reacção racial” do homem sobre o seu meio.
Eis porque, a raça em SENGHOR se converte no lugar de verdade de toda cultura. É por ela que se explica a existência de invariantes culturais observados no Negro Africano transplantado para outros meios geográficos (América do Norte e do Sul entre demais outros).
Enfim e, em suma, na verdade, a despeito das condições sociais e económicas dissemelhantes do meio de origem, SENGHOR preservaria, no entanto, a mesma cultura pelo constrangimento da biologia racial: “Ce qui me frappe – assevera SENGHOR – chez les Nègres d’Amérique, c’est la permanence des caractères non pas physiques mais psychiques du Negro-Africain malgré le métissage, malgré le milieu nouveau”. SENGHOR, Liberte I, Paris, Seuil, 1964, p. 254. E, avisadamente prossegue: Que não me falem de “segregação”: seguramente a segregação explica, em parte, a permanência dos caracteres psíquicos, singularmente o dom de emoção. Ela não explica tudo, sobretudo nos Negros da América latina, onde a segregação é menos real.
E remata: “J’ai dit malgré le milieu, car le milieu agit à la longue. C’est d’abord lui qui informe l’économie, puis la société, et finit par provoquer ces mutations qui deviennent héréditaires. »
Donde e daí, a presença do paradigma biologista se afigura francamente manifesto no cerne do seu pensamento.
Finalmente, por outro, não há dúvida nenhuma, que a divisão racial das aptidões culturais se assume, no pensamento de SENGHOR, uma convicção teórica indiscutível. Ou seja:
“Il ne faut pas méconnaître et forcer son génie – assevera -, même, surtout dans le domaine de l’âme et de l’esprit.
« Croyez-vous que nous puissions jamais battre les Européens dans la mathématique, les hommes singuliers exceptés, qui confirment que nous ne sommes pas une race abstraite. » SENGHOR, Liberté II, Paris, Seuil, 1968, p. 154.
Lisboa, 10 de Maio 2009
KWAME KONDÉ
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KWAME KONDÉ