A SEDES publicou este comunicado em que diz (sublinhados de nossa responsabilidade):
«Sente-se hoje na sociedade portuguesa um mal estar difuso, que alastra e mina a confiança essencial à coesão nacional.»
«Nem todas as causas desse sentimento são exclusivamente portuguesas, na medida em que reflectem tendências culturais do espaço civilizacional em que nos inserimos. Mas uma boa parte são questões internas à nossa sociedade e às nossas circunstâncias. Não podemos, por isso, ceder à resignação sem recusarmos a liberdade com que assumimos a responsabilidade pelo nosso destino.»
«Assumindo o dever cívico decorrente de uma ética da responsabilidade, a SEDES entende ser oportuno chamar a atenção para os sinais de degradação da qualidade da vida cívica que, não constituindo um fenómeno inteiramente novo, estão por detrás do referido mal estar.»
De facto parece-me (parece) que algo de mal se passa hoje na sociedade portuguesa sem que se perceba muito bem o que é que isso pode originar em termos de bem-estar e de paz social.
O General Garcia Leandro disse há dias na televisão e escreveu no Expresso que tem sido abordado por carta pedindo-lhe para liderar uma revolta (não percebi bem de que cariz).
Alguém terá dito há dias a Pacheco Pereira, num supermercado, “Vai haver uma explosão”. Pois, eu também já ouvi, da boca de um reformado com uma pensão de trezentos e cinquenta e tal euros mensais «Isto só lá vai com um levantamento popular». O velhote referia-se aos problemas diários que eram relatados sobre as reformas (?) de Correia de Campos, na Saúde.
Se pararmos um pouco para pensar e rebobinar episódios vários a que temos assistido, somos capazes de ficar com algumas ideias mais claras e de ver alguma coisa no meio do nevoeiro.
Entre várias coisas:
Vejo um primeiro-ministro que me dá a ideia (sei que não é elegante dizê-lo, mas é a ideia que me dá) de ser capaz de passar por entre os pingos da chuva sem se molhar, sem que se saiba (e isto é ainda pior) se sabe que toda aquela chuva que cai e que ele vai driblando com saber e mestria, vai molhar, vai encharcar até ao osso a grande maioria dos portugueses ― sobretudo os mais pobres ― e se se importa alguma coisa (ou não se importa mesmo nada) com isso.
(Eu não estou a dizer que as coisas são assim; eu estou a dizer como é que eu estou a ver as coisas com os dados que vou tendo através dos meios de comunicação social. E admito estar total e completamente errado na minha maneira de ver.)
Vejo um primeiro-ministro que quando interrogado sobre se foi ele que fez uns projectos de arquitectura responde dizendo «Eu assumo a autoria e a responsabilidade de todos os projectos que assinei» quando nós sabemos, quando toda a gente sabe, que a frase: “Eu assumo a autoria e a responsabilidade” não que dizer “FUI EU QUE FIZ”; não quer dizer isso, não quer dizer e não quer dizer mesmo. Por mais que essa frase seja repetida. Deixando as pessoas a pensar que se não diz “fui eu que fiz”, talvez então (e isto é benigno) não tenha sido ele o verdadeiro autor material de todos os projectos.
(Eu não estou a dizer que as coisas são assim; eu estou a dizer como é que eu estou a ver as coisas com os dados que vou tendo através dos meios de comunicação social. E admito estar total e completamente errado na minha maneira de ver.)
Vejo um Governo que me dá a ideia de ser também um grupo de representantes do grande capital tomando várias decisões a favor dos ricos e poderosos, contra os mais fracos, parecendo (parecendo) não se importar com as consequências presentes e futuras para a economia e a coesão social do país, dando a impressão de que os grandes grupos económicos se apropriaram do Estado e do património comum, e tudo podem e tudo fazem a seu bel-prazer.
(Eu não estou a dizer que as coisas são assim; eu estou a dizer como é que eu estou a ver as coisas com os dados que vou tendo através dos meios de comunicação social. E admito estar total e completamente errado na minha maneira de ver.)
Vejo uma justiça descredibilizada e inerte que demora tempos infindos para concluir investigações e processos, chegando a arquivar processos como o do “caso Bexiga”, por exemplo, por não se ter produzido prova. O que me parece um escândalo de todo o tamanho que até dá vontade de emigrar e nunca mais aparecer por cá ― isto, no mínimo.
(Eu não estou a dizer que as coisas são assim; eu estou a dizer como é que eu estou a ver as coisas com os dados que vou tendo através dos meios de comunicação social. E admito estar total e completamente errado na minha maneira de ver.)
Vejo um Serviço Nacional de Saúde cada vez menos Nacional; cada vez mais atrofiado; em definhamento progressivo apesar da propaganda que Correia de Campos andou a fazer a ver se convencia o país do contrário. Vejo hospitais cada vez com menos médicos e menos enfermeiros, cada vez com menos médicos capazes e cada vez com MAIS médicos tarefeiros contratados à hora, muitos deles contratados a empresas de prestação de serviços, empresas sem alvará para o efeito, médicos muitas vezes trabalhando nos hospitais sem qualquer avaliação prévia idónea capaz de assegurar a sua capacidade de intervenção para a especialidade para que são contratados; contratados através de uma Central de Compras ― como se fossem compressas, material cirúrgico, papel higiénico ou sabão; mobiliário ou material vário descartável.
(Eu estou a dizer que as coisas me parecem ser assim; estou a dizer como é que eu as tenho visto. E aqui não admito estar muito errado na minha maneira de ver.)
Vejo um Serviço Nacional de Saúde com hospitais onde se deixa sair médicos com provas dadas, mas onde se contrata médicos reformados para trabalharem e receberem o salário/hora por inteiro, que acumulam com a reforma por inteiro. Uma situação que me parece totalmente ilegal pois estou em crer que teriam que optar por receber ou um terço da reforma e o salário por inteiro, ou um terço do salário e a reforma por inteiro. Mas não: recebem as duas coisas por inteiro. Oficialmente. Quem estará a falhar aqui?
(Aqui já digo que as coisas são mesmo assim. Estou a vê-las como elas são).
Mas vejo mais noutros domínios:
Vejo um futebol de resultados escandalosamente manipulados em que os manipuladores, apesar da existência do aparelho judicial, vivem parodiando os julgamentos a que estão sendo submetidos augurando retumbantes vitórias contra a Justiça pela simples manipulação de testemunhos e a quase inversão dos valores em causa. Valentim Loureiro já disse que por ora já está a ganhar à Justiça «Por treze a zero».
(Eu não estou a dizer que as coisas são assim; eu estou a dizer como é que eu estou a ver as coisas com os dados que vou tendo através dos meios de comunicação social. E admito estar total e completamente errado na minha maneira de ver.)
No meio disto tudo olho para o segundo partido político mais votado e o que é que vejo?
Vejo um PSD com um líder que, certamente seguindo as indicações do seu gabinete de comunicações e de imagem, começou primeiro por aparecer ao público sempre sonolento e anémico debitando frases curtas com pouco sentido e nenhuma acutilância; que depois, nestes últimos dias, vestido com um fato negro tipo mortalha, com a cara espadanada com quilos de pó-de-arroz, transformado numa espécie de Drácula urbano sem pinga de sangue e com um pescoço que mais parece o de um frango depenado, apareceu falando com voz cava de cadáver embalsamado para dizer mais baboseiras e coisas sem sentido, e que quando se percebe o que ele diz é para se ouvir que VAI PRIVATIZAR TUDO, VAI REDUZIR O ESTADO, vai isto e vai aquilo ― tudo asneiras e disparates dos maiores.
Talvez também um destes dias ainda nos venha dizer que vai à merda no que fará muitíssimo bem no meu entender.