sexta-feira, 22 de dezembro de 2006

VISTAS CURTAS

Não gosto de dizer “afinal eu tinha razão”; mas não posso deixar passar em claro o facto de só agora, passados mais de três meses, o Governo vir concluir que afinal o diploma que aprovara em conselho de ministros, alterando a forma de justificação de faltas pelos funcionários públicos, é inexequível nos moldes em que foi feito .

Eu chamara aqui a atenção para esse disparate logo na mesma semana em que os fabulosos crânios do Governo conceberam aquela grossa asneira. Então escrevera:

«A partir de agora o funcionário doente irá engrossar a bicha dos Centros de Saúde e entupir as já saturadas urgências hospitalares à procura de uma “baixa” para justificar a falta ao trabalho.»

Tenho vindo a chamar a atenção para várias outras medidas de puro recorte economicista, tomadas na área da Saúde, que penalizam profundamente os utentes e os doentes e que essencialmente visam extinguir a prazo o Serviço Nacional de Saúde.

Desenha-se no horizonte um autêntico desastre que levará ao cerceamento quase total do direito à saúde por parte dos mais pobres e desfavorecidos e à oneração incomportável das despesas de saúde para a restante população trabalhadora.

Os que hoje pateticamente aplaudem as medidas ditas de «equilíbrio das contas públicas», que consistem tão-só em cortes de despesa e nada mais, medidas ditas «iguais para todos» (o que é refinada mentira), ainda hão-de ficar, como todos nós, de calças na mão.

A propaganda deste Governo é fortíssima e bem montada. Mas ela está hoje bem à vista de quem tem olhos para ver, pelo que é preciso ter-se uma boa dose de estupidez para se continuar enganado por essa propaganda e a apoiar quem nos está depenando e empobrecendo.

Essa propaganda assenta fundamentalmente em truques baratos: a estimulação da ancestral inveja dos portugueses; atirar grupos profissionais uns contra os outros; falar em corte de «privilégios» quando se trata de corte de direitos; dizer que o ataque ao cidadão «toca a todos» quando na verdade não toca nos grupos económicos para quem, aliás, se está a trabalhar, sendo disso exemplo modelar o que se passa na área da Saúde.

Repare-se que hoje já nenhum governante, muito menos o Sr. Ministro da Saúde, fala em listas de espera para consultas ou cirurgias. Esse mal deixou de ser um mal. E sambem porquê? Porque o combate a essas listas aumenta a despesa. Portanto, deixem aumentar as listas porque isso significa que a despesa diminui ou não aumenta. O que prova que o que interessa não é governar para os mais desfavorecidos e carenciados; que o que interessa não é governar para o Bem comum. Que, no fundo, o que interessa é, mas é: governar para reforçar e manter o poder. E isso consegue-se de duas maneiras: primeiro, enganando o povinho com propaganda e truques de feira para que em futuras eleições ele vote de novo em quem o tem enganado; e segundo, protegendo e facilitando a vida aos grupos económicos para que este verdadeiro poder seja aliado do poder político na hora das eleições e da governação.

No fundo, com o voto do povo se vai lixando o povo. Que é burro.