domingo, 17 de dezembro de 2006

CAÍDO DO CÉU

Depois de duas décadas sem ir ver futebol ao vivo, ontem lá aceitei um amável convite de um amigo para um camarote VIP em Alvalade e lá fui ver o Sporting Académica.

Jogo medíocre na primeira parte, e mau na segunda; mais por culpa de um Sporting molengão, sem fibra e sem ideias, do que de uma Académica esforçada e aplicada que mais não fez porque já lá não moram o talento e a visão de jogo de um Rui Rodrigues no meio campo, ou a inteligência e a técnica de um Artur Jorge na frente de ataque.

A observação in loco desta equipa de miúdos ingénuos do Sporting (excepção feita a Moutinho), fez-me recordar e desejar ver ali no relvado Vítor Damas na baliza e, bem lá na frente, Hector Jazalde ou a dupla Jordão Manuel Fernandes. Estes sim ― jogadores capazes de dar uma cabazada memorável a esta Académica.

Mas não é bem disto que eu queria falar-vos. Quero é dizer-vos o quão chocado fiquei quando soube que o lugar que ocupei ― uma vulgar cadeira de napa, almofadada e sem braços, pouco melhor que as cadeiras de plástico das bancadas ― custa, por ano, a módica quantia de €4.700. É isso mesmo: quatro mil e setecentos euros por ano.

Mas a coisa não fica por aqui. É que o camarote tem sete cadeiras dispostas em duas filas em degrau: a primeira fila com três cadeiras, e a segunda, atrás, com quatro; e se destina a um único comprador (particular ou empresa), que tem que pagar a ninharia de €33.000 (trina e três mil euros) para ter direito a uma época de futebol em Alvalade.

Para além da desmedida exorbitância (passe o pleonasmo) do preço a pagar para ver futebol de refugo europeu, o que ainda me chocou mais foi constatar a inexistência de quaisquer condições de conforto e privacidade nos ditos camarotes: que mais não são que pequenos espaços das bancadas delimitados das cadeiras vizinhas por um pequeno muro em “U” de cerca de 50 cm de altura, espaço para onde se acede, vindo do interior do estádio, por uma porta de vidro individual.

É isso que se paga tão caro: a faculdade de ir para a bancada do estádio apanhar frio e ver mau futebol, não em magote andando escadaria abaixo ou escadaria acima à procura do nosso lugar, mas calmamente como quem, de dentro de um edifício, espreita o relvado por uma porta de vidro que lhe permite aceder à bancada para uma zona de sete cadeiras cercadas pelo dito muro de 50cm.

No camarote, a sensação que se tem é a de se estar na bancada normal do estádio (pois as cadeiras do camarote estão, ao ar livre, na continuação das outras que compõem o anfiteatro), tendo connosco a turba toda ali a pedir-nos, ou a exigir-nos ― sei lá ―, solidariedade na hora de chamar f.d.p. ou c..... ao árbitro.

Convenhamos que há muito de absurdo em tudo isto.

E depois de ter ido conhecer um dos novos estádios do Euro 2004 ― coisa que eu tinha curiosidade em fazer ― creio que nunca mais entrarei num estádio de futebol!

Ponto Final.

Ah! Esquecia-me disto: Há um pequeno frigorífico logo à entrada do camarote onde estão bebidas não alcoólicas que o camarodono pode consumir à vontade e “sem pagar”; pode encharcar-se até mais não em coca-cola ou laranjada que “não paga nada” (também se pagasse não seria grande o rombo). E o camarodono até tem uma chave do frigorífico, chave que lhe é entregue quando "compra" o camarote. Suponho que para lhe dar a única sensação de posse que os €33.000 pagos lhe permitem ter: uma chave de um mini frigorífico.

Beleza! Não é?

Paraíso!... Nirvana!...

Bolas! Que há gente para tudo.

Isto sem ofensa para o meu anfitrião. Discordo. É tudo.