domingo, 3 de junho de 2012

(3º) Estudo ensaístico Terceiro:


 Continuação...

(I):
            Na verdade (et pour cause), DU BOIS sabe, além disso, se mostrar pioneiro, em matéria psiquiátrica. Eis (com efeito), como (ele) descreve, um pouco, mais adiante, o “Desvio do homem negro entre fins contraditórios”. Atentemos (então), no acutilante conteúdo de verdade do extracto seguinte:

                        “O artesão negro está dilacerado por esta alternativa-por
                        um lado, escapar ao desprezo que têm os Brancos para
                        uma nação de simples lenhadores e pulsadores, por outro,
                        lavrar, pregar e cavar para uma horda miserável. E a sua
                        luta só pode terminar num único resultado: Fazer dele um
                        operário pobre, visto que ele apenas coloca metade de
                        coração em cada uma das causas. (...) O pretenso sábio
                        negro era confrontado com o paradoxo seguinte: O
                        conhecimento do qual o seu povo tinha necessidade era só
                        contos e lendas para os seus vizinhos Brancos, enquanto o
                        conhecimento ensinado pelo mundo branco era o hebreu
                        para os da sua carne e do seu sangue. O amor inato da
                        beleza e da harmonia que carreia as almas do seu povo,
                        mesmo as mais grosseiras, à dançar e à cantar, apenas
                        suscitava dúvida e confusão na alma do artista negro. De
                        feito, a beleza que lhe era revelada era a beleza espiritual
                        de uma raça, que o seu público mais vasto desprezava,
                        porém lhe era impossível formular mensagem de um outro
                        povo. Dezenas de milhares de pessoas esgotaram-se nesta
                        contradição, no esforço para satisfazer ao mesmo tempo,
                        dois ideais irreconciliáveis-esgotamento que causou tristes
                        devastações na sua coragem e na sua fé, que os enviou
                        adorar falsos deuses e invocar vias de saudação
                        perniciosas e que, por vezes, pareceu mesmo sobre a ponte
                        de lhes fazer vergonha de elas mesmas”. (DU BOIS).

(II):
            Pode-se, lendo estas linhas, descobrir numerosos pontos comuns com a situação do double blind (ou “duplo vínculo”), “duplo constrangimento” -tal como o teorizou o antropólogo inglês, GREGORY BATESON (1904-1980), autor, aliás, da “Teoria do double blind”, na década de 1950. Seja qual for, o seu estatuto sócio económico, o indivíduo Negro americano se encontra (com efeito), segundo DU BOIS submetido à injunções contraditórias e se encontra (destarte), apanhado na ratoeira de diversos duplos vínculos”, que se poderia resumir, no seguinte modelo. Ou seja.

(1)           Ele deve trabalhar arduamente, porém o seu labor não merece o nome de trabalho.
(2)           O seu povo tem necessidade de conhecimento, mas, existe para ele, para além de contos e lendas, outro conhecimento disponível.
(3)           O seu povo pode ser educado, mas a Educação é demasiado difícil para o seu povo.
(4)           O Negro é um artista, porém, a arte do Negro não é arte.
(5)           Ele deve transcender a arte do seu povo, todavia, não pode formular a mensagem de um outro povo.
E, já agora, se impõe, sublinhar (antes de mais e com ênfase), que (na verdade), no plano prático, estes duplos vínculos geram toda uma série de dilemas insolúveis. Ou  seja:
            --- Para ser um Americano, é preciso trabalhar, mas isto não é uma regra que valha para o Negro. Ou melhor: O trabalho é a integração e a dignidade, Todavia, os que trabalham (unicamente), para a dignidade ou para a integração, não são dignos de serem integrados.
            --- A dignidade é (neste termo), o reconhecimento Jurídico e Político. No entanto, não é (ser, verdadeiramente), como exigir o reconhecimento ou, não é (verdadeiramente), digno como pretender sê-lo a fim de obter o reconhecimento.
            --- O Negro é também um Americano, mas o Negro permanece (antes tudo), um Negro.
            --- É  um Negro! Por conseguinte (ele) deve progredir. No entanto (ele) não pode progredir porque é um Negro!

(III)
            Poder-se-ia declinar (muito tempo), as situações de duplo constrangimento. Todavia, o que convém, reter de tudo isso, segundo DU BOIS, é bem um único e mesmo processo, sempre em atividade: “Cada Negro americano (perante) viver uma dupla vida, como Negro e como Americano-a sua confiança nele só pode ser moralmente abalada” (DU BOIS) e, pois que, no duplo vínculo “seja o que faça um indivíduo, ele não pode ser ganhador”, nos assevera (avisadamente), BATESON. Demais, “a sua luta só pode finalmente terminar num único resultado: Fazer dele um operário pobre”. E, no plano social e, no plano individual, arrisca-se a esquizofrenia.

(IV)
            DU BOIS revela-se (aliás), todo ao longo do seu livro, um feroz adversário da estratégia da conciliação, visto que a sua política de reconhecimento é algo de mais profundo, sobretudo quando se (a) examina de perto. Ela se indexa (em primeiro lugar), uma vez de mais, e no género das “Luzes negras”, no âmbito do dispositivo jurídico do Idealismo Republicano.
                                    “Por todos os meios civilizados e não-violentos
                                    possíveis, devemos lutar para os direitos que o
                                    Mundo acorda aos homens, devemos se agarrar
                                    sem falhar a estas palavras sublimes que os filhos
                                    dos pais fundadores teriam de bom grado
                                    tendência a esquecer: “Tenhamos como
                                    evidentes por elas mesmas as verdades seguintes:
                                    Eles são dotados pelo Criador de alguns direitos
                                    inalienáveis; entre estes direitos se encontram
                                    a vida, a liberdade e a demanda da felicidade”
                                    (DU BOIS, Ibid).

Continua (...).
KWAME KONDÉ
(Intelectual/Internacionalista --- Cidadão do Mundo).