“Ser culto es el único modo de ser libre”
José MARTÍ (1853-1895).
“Africa aliquid semper novi”
Plínio, O
Velho (23-79)
“São as pessoas que fazem o Mundo;
O
mato possui feridas e cicatrizes”
Provérbio do MALAWI.
Tem estes Estudos
ensaísticos, o desígnio de relevar
O Magistério de Figuras ilustres da nossa Galeria (pessoal),
Figuras que “Por obras valorosas
da morte
se libertaram” (...)
NP:
Com efeito (et pour cause), “Se a relação e a razão
coloniais puderam determinar certas ideologias Africanas, tais como o Pan-africanismo,
a Negritude ou o Afro-centrismo, os Africanos
e os seus descendentes das Antilhas ou da América contribuíram (em compensação), amplamente para a história
intelectual e política do Ocidente”. Este reconhecimento revela-se central para superar as heranças da história colonial e para tentar
construir uma universalidade concreta,
pós-racial e pós-colonial.
É
este devir
que nos move, nestes Estudos, apresentando o nobre Magistério das proeminentes
figuras do Pensamento Negro, que vamos estudar, neste conjunto de Peças
ensaísticas.
(I)
No início do Século XX (pretérito), a interdisciplinaridade preocupava (pouco ou quase nada), os universitários dos Estados Unidos,
enquanto a Sociedade americana (maioritariamente),
não imagina outro futuro que a segregação, no âmbito “das relações raciais”.
Todavia, novos projetos sociais, culturais
(se elaboravam na sombra), se
apoiando (audaciosamente), em pesquisas
que desembaraçavam de barreiras
os saberes. Esta promissora
iniciativa vinha de “Intelectuais Negros”, que, se definindo (explicitamente), como tais,
assumiam doravante, a sua situação no
género de um paradoxismo: “Americanos e Negros, Intelectuais e Negros” (orgulhosos desta dupla pertença),
movidos por profundas exigências de rigor e de universalidade, porém, enérgicos
(identicamente), de singulares heranças, transmitidas sem
testamento, vencidos de uma espoliação.
Entre eles, duas brilhantes
figuras (dentro de pouco tempo),
são chamados à servir de proa. Estamos, a referir (concretamente), a:
--- WILLIAM EDWARD BURGHARDT DU BOIS (1868-1963,
futuro pai do Pan-Africanismo) e de ALAIN LEROY LOCKE (1885-1954, futuro mentor do Renascimento de Harlem).
Posto isto,
vamos (então), dar início, ao Estudo
destes “Dois percursos excepcionais”.
(1)
Licenciados ambos, na Universidade de HARVARD, florão
da IVY LEAGUE, após uma primeira formação ambiciosa (Um à FISK,
o outro
na Escola normal de Filadélfia), DU BOIS e LOCKE
vão seguir caminhos paralelos (identicamente),
pluridisciplinares
e transnacionais. À exemplo do mentor deles, WILLIAM JAMES (1842-1920),
vão (com efeito), estudar na Europa
e, se inscrevem (designadamente), na Universidade
de Berlim (respectivamente),
em 1892-1894
e 1910-1911.
(2)
DU BOIS, historiador,
apaixonado pela Filosofia, publicará a sua Tese sobre A supressão do Trafego dos Negros na América, em 1896,
antes de abrir a via da Sociologia urbana, com um notável Estudo sobre a condição
dos Negros no Norte (The
Philadelphia Negro, 1899). Feito professor na Universidade
de Atlanta (ele) fará aparecer, em 1903, um singular ensaio: “As Almas do Povo Negro”, em que
delineia, entre História, Sociologia, Autobiografia e Crítica Cultural, a
Aventura Colectiva dos Negros americanos até a aurora do Século XX.
O jovem universitário funda (então),
um movimento
de luta para o reconhecimento dos direitos cívicos que tornará, em 1910, a “National Association for the Advancement of Colored People” (NAACP).
(3)
De anotar (por outro), que, neste mesmo ano, ALAIN LOCKE encontra-se
na Universidade
de Berlim, após três anos de Estudos, na Universidade de Oxford.
Redige (aí), uma primeira Tese de Filosofia:
“Um ensaio sobre o conceito de valor” e segue (entre outros), os cursos de GEORG SIMMEL (1858-1918), antes de
ir a Paris, na Primavera de 1919, para assistir as Lições de HENRI
BERGSON (1859-1941), no Colégio de França. No seu regresso
aos Estados Unidos é recrutado para a Universidade de HOWARD (Washington
D. C.), para ensinar a Literatura e a Filosofia.
(4)
Na sequência, ALAIN LOCKE, sob os
auspícios da NAACP profere, em 1915 e 1916, uma série de cinco
conferencias públicas e interdisciplinares (entre Sociologia, História e Antropologia), sobre a Temática que se
prende com “Os Contactos de raças e as relações inter-raciais” (LOCKE,
1992),
depois volta à HARVARD para obter, em 1918, o seu doutoramento
em Filosofia com uma nova Tese sobre
a Teoria dos valores (LOCKE,
1917).
(5)
Alguns anos mais tarde, LOCKE coordena a Antologia do New Negro (1925). Polimorfo e polifónico (que reúne), sem distinção nem pré-sessão, homens e mulheres, Negros e
Brancos, escritores, artistas, jornalistas e investigadores, este volume
se oferece (ao mesmo tempo),
como um novo corpus (de poemas,
ficções, peças de teatro...) e como uma primeira coleção de ensaios críticos
sobre o mundo Negro (via a
Sociologia, a História, a Crítica
Literária, musical ou artística).
Transcrições de contos ou de negro
spirituals, reproduções de arte
tradicional ou contemporânea, bibliografias
e discografias completam (inteligentemente),
o conjunto,
marcando (destarte), a entrada
dos “Novos Negros” na
cena cultural e intelectual Internacional. No entanto, DU
BOIS (por seu turno), terá
lançado a ideia Pan-Africana,
dirigindo a Revista da NAACP (The
Crisis), que servirá de caixa de ressonância, em todas as reivindicações e formas de expressão dos Negros Americanos.
(6)
E, encurtando razões (por motivos óbvios), vamos, passar a estudar (numa perspectiva eminentemente pedagógica), o eloquente e profícuo Magistério de
DU BOIS e de LOCKE, com ênfase, para o vector didático. Ou seja: A “Indisciplina Intelectual” da lavra
destes dois eruditos pensadores do Século XX, indisciplina essa, que
consiste em infletir (mudando o curso),
“às Ciências Humanas e Sociais, para pensar com elas, os problemas específicos
da experiência Afro-Americana”, sem (para
tanto), os privar do seu alcance universal. Trata-se (numa palavra), de testar (pragmaticamente), o que WILLIAM JAMES denomina (ironicamente), o seu “Valor a pronto”.
(7)
Vale a pena, sublinhar (antes de mais), os seguintes pontos:
a.
As “Disciplinas” são apenas “unidades ou cortes
do saber”. Elas denominam (outrossim),
regímenes
conceptuais e os hábitos cognitivos que
os caracterizam.
b.
Eis porque, a Indisciplina equivale (desde então), à inflectir/reunir vários saberes (ao mesmo tempo), que os regímenes
de pensamento que os atravessam.
c.
Enfim (na
verdade), estas “Indisciplinas” testemunham um processo original que
consiste (neste ponto e sentido),
a
torcer/estrangular elóquios, teorias e conceitos para explicar as
situações, aspirações e expressões dos povos oprimidos.
Continua
(...)
Lisboa, 14
Maio 2012
KWAME KONDÉ
(Intelectual/Internacionalista
--- Cidadão
do Mundo)