Prática
de ACTUAÇÃO QUINQUAGÉSIMA PRIMEIRA:
“Ser culto es el único modo de ser libre”
José MARTÍ (1853-1895)
Acerca
da Tese da alienação...
E para principiar, esta nossa peça
ensaística, de modo consentâneo, eis algumas Marcas, assaz pertinentes:
(1)
“Le tiraillement entre interprétations divergentes est au fondement même
de la recherche anthropologique sur le monde noir”. (...)
(2)
“Les peuples africains
ne permettront plus désormais d’être culturellement, économiquement,
politiquement et intellectuellement kidnappés pour fournir aux universitaires
européens les symboles de leur statut intellectuel (...) et la matière de leur
cours injurieux et hors de propôs (Déclaration du BLACK CAUCUS, citée par HOWE,
1999, p.60).
(3)
“Quand je dis “noir”, ce mot, n’a pas de contenu biologique et je ne
l’emploie pas non plus au service d’une cause raciale. Quand je dis “noir”, je
nomme une expérience historique unique d’hommes et de femmes bien définit, dont
la présence dans ce monde était destinée à changer la vision et l’oreille du
monde et dont la libération finale sera une contribution décisive à la
libération de l’humanité”. GEORGES LAMMING, discours d’ouverture au festival Carifesta, 1981, publié et traduit par le Progressiste, 1982, suplément au numéro 974.
NP:
São
três
as teorias/teses que enformam o húmus dos relevantes Estudos do universo
cultural negro das Américas, designadamente:
---
A Teoria ou Tese da continuidade de uma herança Africana.
---
A Tese da “Crioulização” e
---
A Tese da alienação, que vamos abordar, nesta nossa Peça ensaística.
(A)
Os escritos de investigação,
elaborados, no âmbito das Ciências Humanas sobre as Antilhas francesas são
(aliás), os que mais insistiram nesta
temática
da alienação. Donde (antes de
mais), se impõe avançar com a seguinte interrogação. Ou seja: É preciso relacionar uma tal verificação com a situação das Ilhas que acabaram por fundir com a
Nação Francesa? Pode-se (quiçá),
supô-lo! O processo antigo de assimilação
em Guadalupe e Martinica põe em
jogo conexões
dissemelhantes que tornam mais complexas que algures os andamentos/cadências
da identificação cultural.
(B)
Não há dúvida nenhuma, que o
investigador Jean Jacques FREDJ (1983...) mostrou muito bem quanto a
integração num modelo republicano encetado, desde os dias seguintes da revolução
de 1789, tinha tornado “impossível a expressão de algumas contradições
sob o aspecto da diferença racial”. De feito, as sociedades antilhanas viam
sobrepor-se à partir do término do século XVIII uma lógica colonial, a que contribuiu para a manutenção de uma “plantocracia branca” face à uma massa negra e uma lógica de cidadania (que reconhece), indivíduos livres e
iguais em direito. Para os Antilhanos, lutar para a liberdade passa (paradoxalmente), por uma aproximação
com os ideais republicanos da metrópole, que permanece, contudo, o centro/sede
do empreendimento esclavagista e colonial.
(C)
Trata-se, com efeito (evidentemente), de estar ao lado da
França revolucionária contra a França do Antigo Regímen. Deste modo, as etapas da emancipação e da aquisição dos
direitos de cidadão nas Antilhas correspondem (exatamente), às da marcha para a estabilidade republicana em França. Destarte, portadoras de
igualdade que (elas) tenham podido
obter, esta etapas (abolições, sufrágio
universal, departamentalização), baralham
as pistas da consciência das relações sociais, não deixando se exprimir a
oposição fundadora destas sociedades. Esta fusão colonizadores/colonizados
operada no domínio político e que permanece desigual
nas Ilhas anglófonas, constitui já a marca de uma primeira dificuldade para
as identidades à se construir à partir de um reconhecimento claro dos termos da sua própria história.
(D)
Com efeito (et pour cause), face à esta situação particular, a investigação,
no âmbito da Língua francesa se mostrou (por
conseguinte), sensível a tudo quanto
podia criar obstáculos à edificação de uma cultura
“produzida” pelo grupo dos escravos e dos seus descendentes.
Vale a pena, neste ponto, trazer à colação o húmus do trabalho do médico e
antropólogo francês, Jean BENOIST (1972), que inaugura (verdadeiramente), a investigação antropológica nas
Antilhas francesas e, que (aliás),
indica já pelo seu título – “L’Archipel
inachevé” – a orientação outorgada às interpretações acerca da cultura. É (com efeito), um período intelectual de uma
vintena de anos que se abre, quase (exclusivamente),
consagrado à analisar o mal-estar/penúria destas sociedades edificadas sobre o
tráfego e a escravatura.
(E)
Como se pode ver e perceber (na verdade), a dificuldade em consolidar as identidades sociais aparece (aí), quão imensa, em relação com as violências
simbólicas herdadas da instituição esclavagista. Inacabadas, estas
sociedades o são na opinião da referência
que lhes é necessário (sempre),
procurar no exterior de elas mesmas para se edificar. Ou seja: “Depuis longtemps par
d’autres qu’eux-mêmes, les Antillais ont eu, eux aussi, tendance à se définir
et à se situer en fonction d’autres, à exister par reference” (BENOIST,
1972).
A
interiorização do preconceito da cor em
que se mesclam atributos sociais e
caracteres somáticos está na base da
rejeição/renegação das pertenças culturais e produz “retentissements graves sur la psychologie et
sur la construction de l’image de soi” (Ibid
...).
(F)
Eis porque, no âmbito desta dinâmica, assevera (avisadamente), a erudita oriunda da Martinica, Julie LIRUS-GALAP (1948-2011),
reconhecida psicóloga/antropóloga e investigadora em Ciências Sociais, em 1971,
que se trata para o Antilhano de um “preconceito contra si mesmo”. Já agora (por seu turno), falando do confronto
permanente entre dois modelos culturais normativos (o Europeu e o Africano), do qual um
é sobrevalorizado em relação ao outro,
o sociólogo francês, François GRESLE (1971),
conclui o seu Estudo sobre a Martinica,
afirmando: “Finalement, le Martiniquais paraît ne devenir lui-même qu’en
renonçant à sa condition, en brisant tout lien communautaire, en refusant son
héritage et à la limite sa personne”. Enfim, outros, como (por exemplo), o dramaturgo e poeta
natural de Martinica, Auguste ARMET (n-1939), acabaram por
falar (em 1982), de Sociedades Krazé (“esmagadas”),
ou seja, Sociedades sufocadas pelo peso da sua história, sujeitas à uma
morbidez/definhamento geral (que
suporta) a ideologia do domínio colonial, ao ponto que a sua dinâmica
interna se encontra (fortemente), alterada, os seus membros
desenraizados, dispersados/separados e impotentes,
a sua organização desequilibrada...
Lisboa, 09 Abril 2012
KWAME KONDÉ
(Intelectual/Internacionalista
--- Cidadão
do Mundo).