terça-feira, 22 de setembro de 2009

ELOCUBRAÇÃO QUINTA:

“Ser culto es el único modo de ser libré”
José MARTI (1853-1895)

Cada Sociedade tem o Governo que merece…

Prosseguindo:

Identicamente, se pode asseverar acerca dos efeitos da voz dos candidatos. De feito, a comparação dos jogos de voz dos candidatos dominantes, pode ser conduzida como o seria de comediantes comprometidos numa idêntica performance.
Deste modo, se pode asseverar, que a voz de campanha eleitoral de Sócrates é, quiçá, grave, melhor dominada, colocada diferentemente, conservando o candidato o mesmo timbre e procurando uma tonalidade que “visa conseguir” um falar que complementa “gestos menos simples, mais refreados”. No fundo, no fundo, “é o que pretende segredar nos ouvidos” dos Portugueses.
Em contrapartida, a voz da Manuela, se pode avaliar, em função do timbre que muda “evoluindo para os graves” e da diferença introduzida “no campo léxico”. Todavia, a característica, que merece, sobretudo valorizar, seja: “uma forma de se exprimir” que desconcerta, “destacando vocábulos e sílabas”, enquanto, ela “introduz um elemento de proximidade”. É a resposta a constrangimento novo que se impõe na competição aos dois actores em confronto político: engendrar proximidade, introduzir acentos pessoais, fazer ressaltar o autêntico.

Os Actores, segundo os Médias são definidos, enquanto tais, imediatamente identificáveis, pelos traços pessoais, que enformam a sua fala e o seu jeu, pelos lugares de retirada e de preparação para a performance que assumem os seus Quartéis-Generais.
Ele deve, quiçá ir à conquista do eleitorado popular, procurar um contacto que lhe pode ser recusado até à rejeição.
Ela, por sua vez, quão populista, portadora de uma “certeza” (absoluta) da sua “popularidade”, obter a escuta das pessoas, se lhe afigura, assaz relevante, porquanto pretende manifestar, sobremodo que só a ela, se deve esta ampla adesão.

É, efectivamente, em torno, destes focos, em que cada acontecimento da campanha eleitoral se talha, em que circulam estratégias, amigos e pretendentes, que a informação se difunde e, outrossim o rumor. O apoio dos entusiastas, dos convencidos e dos simpatizantes aí se manifestam, sobretudo, nos momentos excepcionais, aquando das aparições organizadas de cada um dos actores principais. Estes locais são os sobre os quais os jornalistas e os produtores de imagens mediatizadas procuram elementos, se tornando centrais, na sua construção narrativa da campanha eleitoral.
Para o maior número de pessoas, são os movimentos dos candidatos, as suas deslocações que os levam ao encontro dos seus eleitores e dos notáveis que lhe são próximos, os seus meetings promotores de enormes ajuntamentos “teatralizados”, que conferem a impressão de uma relação directa, de uma presença física propícia para um conhecimento emocional, mais afectivo na relação de afinidade com o actor político em “tournée”. Todavia, o conhecimento indirecto é sobremaneira preponderante e se efectua via médias, Internet e as trocas informáticas. É na batalha assumida por intermédio dos ecrans que a vitória pode parecer acessível ou em vias de se apagar, anunciando uma derrota, quase certa.

A imagem restitui o momento de intensidade de uma conexão, a que se urde, de modo efémero, entre um actor/candidato e um público numeroso ou uma multidão e uma colocação em situação por um local significante, uma cenografia, um espaço cénico e um ambiente. O lugar, pela sua história e pela sua função principal, se concilia, acentuando o que será a dominante da prestação, o que vai singularizar a argumentação dramatizada e adestrar limites à liberdade de improvisação. A demonstração pela escolha do espaço político e o ordenamento político do espaço se edificam, diversificando os aspectos de uma mesma candidatura (sobrecarregada) a sua própria “pigmentação” na aparência e no estilo argumentante dos candidatos…

Estes momentos, que se podem asseverar, de “teatrocráticos”, que servem para forjar poder imediato, da confiança oriunda do entusiasmo colectivo, do estado de união, são construídos, de forma a ser vividos directamente, no mesmo local e lugar e ressentidos indirectamente por intermédio de médias. Teatro vivo (live) e Teatro de imagens montadas, concomitantemente. São concebidos para ser eventualmente reiterados e adaptados aquando das prestações efectuadas nas cidades de Província, nas digressões em que cada candidato leva na sua comitiva, gentes da caravana Manuela Ferreira Leite, ou do séquito José Sócrates. De anotar, por seu turno, cada cidade se encontra associada, pela sua própria história à uma inflexão ideológica, à uma temática, à uma provação… cujo húmus vem ao de cima e, que é aproveitado pelos candidatos, de molde enviesado, ou seja, ao sabor das conveniências eleitorais, visando uma mera caça ao voto, obviamente…

De feito, a prática da dramatização política “pelas cidades”, cada vez melhor, acertadas pelos peritos em comunicação, se vincula particularmente à boa escolha da cidade, onde se realiza o derradeiro meeting, antes da votação. Este lugar/local é onde são construídas as últimas imagens (quiçá) decisivas.
Todas estas cenas, repartidas consoante uma geografia política atenta e ponderadamente estudada pelos referidos peritos em comunicação e marketing eleitoral do meio social, constituem espaços dramáticos, onde o jogo da confrontação se desenrola, de modo, quão espectacular, onde os actores políticos são avaliados em função da sua aparência, da sua conduta, do “papel” e do seu savoir-dire, em que os participantes julgam estar “em directo”, em condições emocionais, relevando da psicologia das multidões. O candidato, a candidata como personagem apanhado numa história assume, cada vez mais e mais, como uma autêntica pressão a que é necessário se conciliar…
Aqui, concretamente, neste lugar/local, se nos depara uma epidemia de fotojornalistas, seguindo, sem parar (sem dar tréguas) os meetings e as deslocações, na província, enredados entre o desejo de surpreender o candidato ao natural e o controlo dos responsáveis de campanha. Na verdade, é preciso repetir as imagens, evitando a repetição, sublinhando as diferenças, sustentando a impressão de participação, em momentos históricos.
Demais, todos os candidatos sabem que os instantâneos já não existem, que a imagem é “predeterminada, predestinada” e, ainda mais (muito mais, aliás) que determinadas imagens são “aferrolhadas”. A personagem torna, simultaneamente actor e director de imagens. (…).

E, já agora, no atinente, às emissões televisivas entram, com um efeito maciço, no jogo de imagens, com menos de credibilidade duradoira que outorgada às imagens (em life) tiradas da proximidade física…
Ante a profusão de imagens, ante os confrontos televisivos orientados pelos canais, controlados pelos agentes de comunicação dos actores, confrontados, ante a profusão das actualidades de campanha postas em imagens, a questão do verídico é permanente. Se coloca, obviamente, a propósito de toda a imagem veiculada, porém, no caso das imagens políticas de robusta parada (o que é levado ao extremo, aquando de uma eleição importante), a questão se coloca, com uma acuidade, de enorme e relevante intensidade.
Donde e daí, obviamente, se impõe, atentar nas seguintes interrogações:
--- Trata-se de um parecer verdadeiro?
--- De um falar verdadeiro?
--- De um prometer verdadeiro? Enfim!...

E, rematando:
--- A “dramatização” releva da política -espectáculo, adentro de uma realização mais ordinária, quando se inscreve no interior de um programa concebido para divertir e ser transmitido numa secção horária de grande audiência. Atente-se bem nos telejornais das três estações televisivas…
--- Por seu turno, os canais da rádio utilizam, de forma análoga, o jogo das vozes e músicas, o das imagens áudio e tão pouco, imagens visuais pelas quais são substituídas (…).
--- Outrossim e, ainda: o jogo por televisões interpostas se torna brutal, implacável, em momentos estimados de elevado risco.
Estamos, sim, como sempre, ante uma campanha, quão confusa, estéril, por um efeito de “telecracia” que visa a colocar o eleitor sob a influência deletéria, em detrimento de uma prestação e de um programa integralmente credíveis. Por outro, por uma relação ambígua com os jornalistas, menos claramente identificados: as ideologias políticas geradoras de identidade óbvia recuaram perante as motivações do interesse pessoal e êxito fácil, do marketing político armado de novas tecnologias, criando, assim, as condições de uma confusão dos papéis.
Eis porque, a resposta à estas causas do afastamento e de dúvida foi procurada no recurso à “política do contacto próximo” (political close contact). Em suma: o recurso às situações de co-presença e de diálogo (os painéis), antes que a porta fechada dos candidatos e dos jornalistas sozinhos.

E, para finalizar avisadamente:
--- Este modelo de campanha assumido numa feição, um tanto ou quanto deturpada (campanha, soit disant, participativa), pelos “políticos” portugueses, de apelo para a consciencialização dos “verdadeiros problemas das verdadeiras pessoas”, não elimina (não eliminou, aliás) a dúvida da assunção em espectáculo e da manipulação postuladas pelos conselheiros em comunicação.
--- E nem, tão pouco, destes jogos que orientam a dinâmica das emoções, designadamente.
Estas práticas se afiguram ante os olhos dos críticos como procedimentos da ilusão, associada à trivial curiosidade para o mundo das pessoas.

Finalmente, a campanha se desenrolou, sob o signo de “anedotas”,”fait-divers”, “intrigas” e demais quejandos do género, o que faz (e fez, aliás) distrair, mais uma vez, os portugueses, no atinente aos verdadeiros debates!...Existiu debates? To be or not to be that is the question! …Obviously!

Lisboa, 20 Setembro 2009
KWAME KONDÉ
(Intelectual/Internacionalista --- Cidadão do Mundo)
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