OU POEIRA PARA OS OLHOS DO PÚBLICO
Luís Graça, presidente do colégio da especialidade de Ginecologia e Obstetrícia da Ordem dos Médicos, referindo-se à falta de médicos obstetras para manter abertas todas as maternidades existentes no país, terá declarado ao Diário de Notícias, em forma de aviso «a quem garante que conseguirá médicos» para manter os blocos de partos abertos: «A Ordem vai estar atenta aos médicos turbo. Não podemos aceitar que cada um faça mais de uma urgência de 24 horas por semana.»
É preciso dizer aqui claramente que esta declaração de Luís Graça é apenas uma fantasia; é poeira lançada ao vento; e só como fantasia faz sentido. Luís Graça não deve desconhecer que o próprio Estado tem, neste preciso momento que o leitor me lê, obstetras contratados, através de contratos de empresa, os quais têm contratos válidos com mais de uma maternidade ou hospital do Estado onde prestam mais de 24 horas semanais de serviço de urgência obstétrica. E Luís Graça não pode desconhecer que a única forma que teria de fiscalizar o horário de trabalho desses obstetras seria seguir-lhes o passo, quotidiana e individualmente, para ver onde cada um entra para trabalhar em cada dia da semana. Isto porque os contratos são feitos em nome de empresas e não em nome individual; e a empresa, em teoria, tanto pode mandar hoje um trabalhador (obstetra), como amanhã outro. Claro que o trabalhador é sempre o mesmo; mas como, em teoria, não é obrigatório que o seja, a Ordem dos Médicos aí nada pode fazer porque sequer tem meios para averiguar a situação.
E mais: se porventura a Ordem viesse um dia a conseguir fazer uma fiscalização efectiva e proibisse os obstetras de realizarem mais de 24 horas semanais de urgência, TODAS AS MATERNIDADES DO PAÍS, sem qualquer excepção, teriam que fechar as portas. Mesmo depois de executado o anunciado encerramento das 11 maternidades.
É que não há obstetras em número suficiente no país.
E os únicos culpados desta situação são:
O Estado e a Ordem dos Médicos.
Que durante mais de uma década estabeleceram numerus clausus irrealistas para as Faculdades de Medicina e forneceram escassas vagas para formação de especialistas de Ginecologia e Obstetrícia, impedindo com isso que se formassem médicos e se formassem obstetras em número suficiente para as necessidades do país.
Tanto a Ordem dos Médicos como o ministro da Saúde estão agora aflitos e desorientados sem saberem como justificar o descalabro actual aos portugueses.
E ninguém diz a verdade.
Como nota de rodapé acrescenta-se mais este pormenor interessante em forma de pergunta: vai a Ordem dos Médicos proibir os médicos que façam 24 horas semanais de urgência, de trabalharem, de urgência, em maternidades privadas?
Vai mesmo?
Não brinquem comigo! . . .