(2) Estudo ensaístico Segundo
Continuação
do Estudo Primeiro...
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Com efeito (et pour cause), as críticas
do “Renascimento de Harlem”
colocaram (frequentemente), em
relevo, a influência profunda que
exerceu WILLIAM JAMES sobre DU BOIS e LOCKE. Em contrapartida, o impacto que tiveram alguns pensadores
europeus sobre as suas reflexões e
os seus escritos permanecem (relativamente),
menosprezados. Muito mais ainda, enquanto se ouve mesmo sublinhar os seus pontos
comuns, se deixa de lado, a forma em que (eles) inflectiram e
vincularam (em conjunto), conceitos
e disciplinas.
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Explicitando (adequadamente), o arrazoado,
acima avançado, temos (então) que:
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Vamos principiar esta nossa elocubração, estudando a célebre abertura
das “Almas do Povo Negro” (1903),
obra, em que, DU BOIS define a sua identidade, como “Uma dupla consciência”. Atentemos no seguinte extracto:
“Entre o outro mundo e eu se insurge
perpetuamente uma questão formulada. (...) “Que efeito isto faz ser um
problema?”(...) Ser um problema é uma
experiência singular-singular mesmo para alguém que jamais foi nada de outro,
salvo talvez quando era muito novo, ou quando ele se encontrava na Europa. Foi muito cedo, nos primeiros dias de uma infância à alegria exuberante, que tive a revelação fulgurante. (...) Então me apareceu com uma repentina certeza
que eu era diferente dos outros, ou
como eles, talvez, no meu coração, na minha vida e nos meus desejos, mas cortado do mundo deles por um
imenso véu. (...) O Negro nasceu com
um véu e dotado de dupla visão neste mundo americano-um mundo que não lhe
concede nenhuma verdadeira consciência de si, mas que, pelo contrário, só o deixa apreender através da revelação do
outro mundo. É uma sensação singular,
esta consciência desdobrada, este sentimento de constantemente se
observar pelos olhos de um outro, medir
a sua alma pela vara de um mundo que nos considera como um espetáculo, como um divertimento colorido de piedade
desdenhosa. Cada um sente
constantemente a sua natureza dupla-um Americano, um Negro; duas almas, dois pensamentos, duas lutas inconciliáveis, dois
ideais em guerra num único corpo, que
só a sua força inabalável previne rompimento. A história do Negro Americano é a história desta luta-desta aspiração à
ser um homem consciente de si mesmo, desta
vontade de fundir o seu eu duplo num único eu melhor e mais verdadeiro”. (DU
BOIS).
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Tem-se o hábito interpretar (em termos hegelianos), esta “dupla consciência” e a sua vontade de síntese, todavia, se negligencia (com isso), a relevância do “véu” na
experiência do desdobramento e, se
olvida que (ela) se vê menos como uma
antítese que sobre o nosso
modo da coexistência.
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E, para compreender o que é a dupla consciência, vale a pena (por conseguinte), estudar (de modo dialecticamente consequente),
que conexões DU BOIS entretinha com as teorias psiquiátricas da sua época (em particular), com as análises do conceituado filósofo
alemão, GEORG SIMMEL (1858-1918), sobre os constrangimentos da socialização ou
de (as), de W. JAMES sobre as perturbações
da personalidade.
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De feito (et pour cause), o filósofo
alemão, desde 1894, tinha insistido sobre o papel fundamental do “olhar de
outrem”, no âmbito das relações sociais. E, para uma melhor elucidação da nossa
asserção, nada melhor, que atentar, no seguinte extracto sacado da notável obra, de SIMMEL: “Sociologia: estudo sobre as
formas da socialização”.
“Somos todos fragmentos, não unicamente do homem em geral, mas também de nós próprios. (...) Porém, o olhar do outro completa este
aspecto fragmentário para formar o que jamais somos total e unicamente.
(...) Ora este princípio atua no interior
da Sociedade como o a priori das ações recíprocas suplementares entre os
indivíduos. (...) A base vital comum
dá nascimento à certas hipóteses através das quais se vê mutuamente como
através de um véu. Evidentemente,
a singularidade da pessoa não é pura e
simplesmente velada, mas na medida em
que a sua existência completamente individual, se funda com este a priori numa
unidade, este véu lhe dá uma forma
nova. Não vemos o outro simplesmente
como um indivíduo (...). Por toda a
parte, a generalização social vela os traços da realidade (...)-visto que a generalização é sempre, ao mesmo tempo, mais e menos que a individualidade-porém todas estas categorias a
priori: O seu tipo humano, a ideia (...) do grupo social ao qual pertence”.
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E, já no atinente à influência de W. JAMES (assaz
robusta), junto do qual (aliás), DU
BOIS, em Harvard, iniciara os seus estudos, no âmbito da Psicologia
empírica em que (ele), num artigo datado
de 1890,
consagrado às experiências hipnóticas, conduzidas pelo neurólogo e
psicólogo Francês, PIERRE JANET (1859-1947), dizíamos, tinha estabelecido a coexistência,
em certas pessoas, de várias personalidades situadas em níveis dissemelhantes de consciência. JAMES e JANET
distinguiam (destarte), a
“Consciência primária”, com certos atributos sensoriais, memoriais
e afectivos, de uma “Consciência secundaria”, que possuindo outros, mas permanecia (completamente), dissociada da primeira.
E, que, pela transe ou pela hipnose se
podia (finalmente), atingir uma Consciência terciária, mais (profundamente), enterrada e que reunia (então),
as dissemelhantes
personalidades, possuindo
todos os atributos. Era
necessário admitir, sugeria JAMES,
nestes termos: “Em certas pessoas, pelo menos, a totalidade da consciência que nos é possível, pode ser dividida em partes que coexistem,
mas que se ignora mutuamente e que se
partilham os objetos do saber entre elas e-coisa mais notável ainda-que são
complementares”. W. JAMES, In (Essays in Psychology).
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DU
BOIS realiza (por conseguinte),
uma evidente
torsão dos conceitos de véu e de dupla consciência, aplicando-os à sua própria situação e, para além, à de todos os Negros. Todavia, a sua apropriação
se torna (por seu turno), paradigmático:
A “dupla consciência” e o “véu” tornaram-se conceitos maiores da sua própria
Obra, no entanto (eles) circularam e permitiram (identicamente),
à numerosos
pensadores (um dos quais, Paul
GILROY (n-1956), Professor no London School of Economics, autor da notável obra: The
Black Atlantic (1993) e de
diversos críticos pós- coloniais),
elaborar
um novo quadro teórico para analisar os efeitos da dominação cultural.
Contínua (...).
Lisboa,
16 Maio 2012
KWAME
KONDÉ