Prática
de ACTUAÇÃO QUINQUAGÉSIMA SEGUNDA:
“Ser culto es el único modo de ser libre”
José MARTÍ (1853-1895)
(1)
A tese da alienação atinge o seu ponto
culminante (em termos de
coerência intelectual), no início da década de oitenta do século XX pretérito,
quando dois autores franceses: Francis AFFERGAN (Professor de Etnografia na Universidade de
Nice e autor de Pluralité Des Mondes) e Édouard GLISSANT (Escritor, romancista, poeta, teatrólogo e
ensaísta), propõem uma abordagem teórica substancial donde
se emana um verdadeiro modelo de comunidade privada da sua capacidade para se
estruturar.
(2)
É (deste
modo), que a obra: “L’Anthropologie à la Martinique”, da autoria e lavra de
Francis
AFFERGAN (1983), desemboca sobre a proposta
de dois conceitos (robustamente) privativos, que são os
“modos de improdução” e a “associatividade”. Na verdade, a história da
Sociedade Martiniquesa é a de uma “deréalisation” que é preciso compreender, na acepção estrita do
termo, como uma ausência de empresa/cometimento sobre a realidade.
(3)
Aliás (não
há dúvida nenhuma), que os Martiniqueses jamais puderam se apropriar de um espaço
(como bem próprio, leia-se como algo de particular), e (destarte), se inscrever, num processo
de produção finalizado para si mesmos. E, como “seul appartiendrait àl’histoire le peuple que produit les causes et les
effets de ses besoins”, os Martiniqueses – nada produzindo para si próprios
– se encontram na impossibilidade de se historizar, ou seja, de ter acesso
ao domínio das suas orientações culturais e do seu devir.
(4)
E, no atinente à “associatividade”, ela
decorre (em toda lógica e coerência),
destes “modos de improdução”. Ela exprime a ausência do que (aliás), contribui para gerir as bases
comunitárias por uma prática económica e material federativa. Ela se traduz por “une rivalité entre les individus au travail, un égoisme
sur le plan économique et affectif et méfiance généralisée” (AFFERGAN,
1983).
E
para exemplificar o seu raciocínio, o antropólogo se apoia
no campesinato negro formado na abolição e do qual nos assevera que (ele)
é feito “d’éléments éclatés qui ne semblent obéir qu’à des pulsions et des
effets individualistes ou atomisés” (Ibid).
(5)
Por seu turno, o ponto de vista de Édouard
GLISSANT (1981), se vincula à trajetória desde a longínqua África para
declinar o percurso de um desapossamento que começa com o arrancamento brutal à
África e se prossegue (todo ao
longo) da escravatura e se repercute nos elos/vínculos de uma dependência
acrescida com a metrópole.
(6)
Eis porque, no âmbito desta dinâmica, se pode
asseverar, que a história dos Antilhanos
é (destarte), feita
de rupturas e de negações/denegações. Ela é sofrida. Ela é
“não-história”, visto que os Antilhanos, enquanto sujeitos-produtores, constituintes/constitutivos (que constitui), da sua vida
social permanecem ausentes. Donde, de anotar, que (na verdade), a concepção de GLISSANT mantém uma familiaridade com o modelo da “história imóvel”, visto
que nenhuma mudança (nada mesmo), o
de 1848,
não intervém para romper este esquema do desapossamento. A abolição
não permitiu esta conquista esperada do espaço insular para que o
povo pudesse “produire par et pour lui-même”. O país não é um! Ele não é
nem espaço ancestral nem espaço apropriado: “La légimité de cette
possession collective n’est pas même amorcé” (GLISSANT, 1981).
(7)
Enfim e, em suma: Donde
e daí, estamos ante uma sociedade onde “Les
groupes sociaux ne sont pas ressentis dans leur structuration comme le résultad
d’une histoire intrinséque”. (Ibid).
A memória colectiva é “raturée” e a
consciência colectiva privada da sua capacidade para “sédimenter” a comunidade. Esta permanece dispersada e fragmentada. Lá ainda, o campesinato conforta a
demonstração. E, se GLISSANT julga esta como
um dos raros testemunhos de resistência, (ele) o vê, a despeito
disso, como um “agrupamento”, mas nada, como uma “nação”,
estes camponeses que não conseguem “consacrer en traditions des habitudes
communes” e “à générer de l’unité
tout court”. (GLISSANT, 1981).
Lisboa, 11 Abril 2012
KWAME KONDÉ
(Intelectual/Internacionalista
--- Cidadão
do Mundo).