sábado, 7 de abril de 2012

(L) Alors que faire?


Prática de ACTUAÇÃO QUINQUAGÉSIMA:

Ser culto es el único modo de ser libre
José MARTÍ (1853-1895)


(1)           Fazendo da inovação cultural o elemento primordial das Sociedades negras do Novo Mundo, MINTZ e PRICE (1992), não assumem o risco de ignorar ou de minimizar as condições nas quais se efetuou o encontro”. Reintegram (com efeito), a experiência negra americana no universo coercivo das plantações para insistir no monopólio do poder dos senhores, nas condições de desumanidade/barbárie nas quais estes pretendiam manter os escravos.
(2)           De anotar (entretanto), por outro, os autores convidam a não minimizar os interstícios, as transgressões que fazem que a instituição jamais foi coagulada/congelada. No interior da estrutura codificada e rígida da sociedade escravista existiam sectores que davam conta de interações sociais entre os dissemelhantes blocos. Os autores resgatam (destarte), “uma figura esquemática das sociedades profundamente divididas pelos estatutos – ao mesmo tempo que pelos tipos físicos e mais ainda – mais complicadas pela contínua interação dos membros dos dois grupos à vários níveis e consoante dissemelhantes momentos (...), em outros termos, o sistema dos estatutos jamais deu conta, nem controlou o conjunto das interações específicas entre os indivíduos”.
(3)           Donde (deste modo), MINTZ e PRICE postulam a existência destes lugares incontornáveis (inclusive), no cerne do empreendimento esclavagista, em que a troca se produz entre dissemelhantes grupos em presença, troca que alimenta a dinâmica cultural de crioulização, para explicar a lógica da “criatividade”, os autores sublinham (identicamente), uma outra dimensão: (a), para as sociedades do Novo Mundo, de evoluir  (continuadamente), numa dinâmica de contactos que predisporia à aceitação da diferença cultural e faria da aptidão para a mudança, uma característica dos sistemas culturais em presença. É (deste modo), que “no interior dos estritos limites determinados pelas condições de escravatura, os Africanos-Americanos aprendem a dar muita importância à inovação e à criatividade individual”.

(4)           Explicitamente, levado à considerar, nas condições assaz particulares da escravatura, o “encontro” entre os mundos como o substrato das culturas negras Americanas, o modelo de crioulização integra bem o que poderá faltar no da continuidade, à saber o contexto no qual foram levados a evoluir (“não, não senhor”), as culturas africanas, mas os indivíduos portadores destas culturas. A evidência da necessidade de uma tal tomada em consideração não escapa (em última análise), a todos os que desejam (de forma rigorosa), reconstituir uma genealogia africana das culturas afro-americanas.
(5)           Antes de mais, se impõe sublinhar, que face à diversidade das teses, se afigura plausível perguntar se não está tudo simplesmente colocado numa impossibilidade a resolver definitivamente entre o argumento da continuidade e o da mudança, pois que, ambos não são (em última análise), constitutivos das culturas negras do Novo Mundo? De anotar (aliás), que a sobreposição no seio de cada interpretação de afirmações devedoras à uma e à outra tese (designadamente as noções quase intermutáveis de “estruturas profundas” ou “níveis profundos”) parece confirmar a asserção acima enunciada...
(6)           Enfim e, em suma: É necessário (então), virar para o escritor antilhano de expressão inglesa e conceituado professor universitário, EDWARD KAMAU BRATHWAITE (natural de Barbados, onde nasceu em 1930), para assumir toda a dimensão desta necessidade de ultrapassar a clivagem aparente entre teorias. Autor de um trabalho de referencia da Sociedade Jamaicana, no curso do qual descreve a “crioulização” como “processo cultural” em que “o confronto entre duas culturas foi cruel, no entanto, outrossim criativo” (BRATHWAITE, 1971).
(7)           Já agora, vale a pena, elucidar (adequadamente), que este conceituado historiador e universitário é outrossim, conhecido (simultaneamente), pelo seu interesse pelo Jazz e pela sua relevante obra poética, obra poética essa consagrada em restabelecer os elos/vínculos entre as Caraíbas e a África, o que o faz ser (geralmente), percebido à partir do “empenhamento africanista”. Donde, esta questão, assaz oportuna e quão pertinente:
a.     Deve-se ver uma contradição neste conúbio, sob uma forma ou sob outra, entre estas duas interpretações? Todavia, é o próprio BRATHWAITE que nos convida à responder pela negativa à uma tal questão, quando afirma: “C’est durant cette période (de l’esclavage) que nous pourrons voir comment l’Africain importé depuis le lieu de sa grande traditionen est venu à s’établir dans un nouvel environnement, utilisant les outils disponibles et les souvenirs de traditions heritées pour fonder quelque chose de nouveau, quelque chose d’antillais, mais quelque chose reconnaisable malgré tout comme africain”.
(8)           Finalmente e, em jeito de Remate assertivo: Na verdade, ter-se-á compreendido que as teses da continuidade e da criatividade não podem (verdadeiramente), se opor quando a primeira reconhece a presença das memórias da herança africana na criação do novo e quando a segunda encara a criação cultural à partir da preservação de uma gramática culturalantiga...

Lisboa, 06 Abril 2012
KWAME KONDÉ
(Intelectual/Internacionalista --- Cidadão do Mundo).