terça-feira, 3 de agosto de 2010

RICOS MAS ESCRAVOS

Um jovem de 24 anos, numa noite das suas férias ou folgas, não pode beber uns copos com os seus amigos, fumar umas cigarradas, cantar e urinar na rua, enfim: dar largas a manifestações próprias da sua idade, sem ser largamente exposto à curiosidade e julgamento públicos, por um jornal tablóide, apenas pelo facto de ser jogador de futebol de um grande clube mundial.

Falo de Wayne Rooney, jogador do Manchester United, fotografado numa noite de folga, em Londres, na companhia de seus amigos e da mulher, em que frequentou um pub de que saiu às 5:30h da manhã depois de uma certamente boa noitada, cantando, abrindo os braços, tendo urinado na rua.

E eu a lembrar-me dos meus 17 anos para a frente em que, durante as minhas férias, fiz serenatas até às sete da manhã, bebendo um litro de brandy por noite, urinando por tudo quanto era beco, cantando e tocando violão a noite toda, sem que nada disso tenha prejudicado terceiros e me tenha afectado a vida de estudante e posteriormente a vida profissional.

Antes pelo contrário ― por paradoxal que pareça, esses “excessos” da juventude constituem a melhor e mais segura prevenção ao desenvolvimento de uma personalidade adulta desequilibrada e muitas vezes violenta, que resulta frequentemente da frustração por se ter vivido uma juventude vigiada, reprimida nas suas manifestações naturais, censurada pelos adultos e castrada pelas instituições e pela sociedade pérfida, manhosa, castradora e mentirosa, cínica e filha-da-puta que conhecemos e que funciona ao sabor dos interesses de várias “máfias” organizadas em confederações, grupos, associações e partidos que se apresentam angelicamente ao público como se fossem as melhores damas da comédia da vida que vivemos.

Ainda há poucas semanas li no New York Times a legenda de uma fotografia de Cristiano Ronaldo numa piscina, que rezava mais ou menos isto (cito de memória): “Um futebolista multimilionário que passa 15 dias de férias num hotel em Nova York entre o quarto, a piscina e o restaurante”.

Julgue por si em que constitui a vida de Cristiano Ronaldo durante esta sua juventude e diga depois se Wayne Rooney não faz muitíssimo bem em viver as suas folgas e férias como muito bem lhe apetece e sem medo de ser “descoberto” pelo fotógrafo de qualquer tablóide que viva desses “escândalos”.

Nunca mais me esqueço de George Best, um génio que jogou também no Manchester United, nos anos sessenta, talvez o primeiro futebolista da história a mandar às malvas a disciplina escravizante do futebol. Best frequentava diariamente bares e pubs com os amigos, bebia muita cerveja e fazia aquilo que lhe dava na real gana. Mas o seu génio impediu sempre que o clube prescindisse do seu trabalho, mesmo fazendo manchetes diárias nos jornais londrinos que o perseguiam retratando obscenamente a sua vida fora dos campos de futebol.

«Eu sou o tipo que levou o futebol das páginas internas para a capa dos jornais», teria dito.

Best teve uma carreira de 15 anos no futebol (12 dos quais no top) e morreu com 59 anos, vítima de cirrose hepática, após um transplante de fígado que não aguentou a sua forma de viver, pois, mantivera o hábito de frequentar pubs e beber o seu copo.

Mas viveu como quis e lhe apeteceu e certamente morreu em paz consigo próprio e sem remorsos de não ter adoptado uma vida de clausura e de santidade que não era certamente adequada à sua personalidade.

Fiquem com esta frase banal: NÃO SE VIVE DUAS VEZES.


*** Este texto NÃO foi escrito ao abrigo do novo acordo ortográfico. ***