segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

ELOCUBRAÇÃO TRIGÉSIMA SEGUNDA:

“Ser culto es el único modo de ser libre”.
José MARTÍ (1853-1895)


QUATRO MARCAS:

(1) O desenvolvimento do desemprego mostrou, que Trabalhar é uma norma. Nas sociedades Ocidentais, o trabalho constitui o principal meio de subsistência, outrossim, porém, uma parcela fundamental das ocupações de cada um. Eis porque, deste modo, a Ordem Social se organiza em torno dele. Donde e daí, a necessidade imperiosa de interrogar acerca da nossa conexão com o trabalho, visando repensar, de modo dialecticamente consequente, a sua natureza respectiva, assim como, o lugar que assume, no âmbito das nossas vidas.
(2) O Cidadão consciente vive o Trabalho e o Repouso como um dom transcendental, livre da ansiedade de produzir e da avidez de possuir, que cegam o coração e levam a explorar os mais fracos. Partilha, generosamente os seus bens com os outros. Empenha-se por que a dignidade e os direitos da Pessoa Humana sejam considerados a Base da Ordem económica e por que se respeite a Ordem harmoniosa da Natureza.
(3) O Trabalho é, concomitantemente, necessidade vital e afirmação de Liberdade, sinal de dependência e Transcendência em relação à Natureza. Só o Homem trabalha porque, ao contrário, dos demais outros animais é Sujeito inteligente, capaz de projectar e operar criativamente. Enquanto “produz” coisas úteis, desenvolve, outrossim, a sua Humanidade e um conjunto de valores relevantes, como a iniciativa, a coragem, realismo, tenacidade, ordem e solidariedade. Sim, efectivamente: Exprime e realiza a sua Dignidade de Pessoa.
(4) Enfim e, em suma: “O Trabalho é para o Homem e não o homem para o trabalho”. O Homem não vale pelo que produz, possui ou consome. Sim, efectivamente, por si próprio.


(I)
Por muito, que se queira ou não, a REALIDADE se encontra, sempre, na calha dos Acontecimentos. É a lei da Verdade Universal a se impor, assertivamente os seus ditames.
Demais, não há dúvida nenhuma, que pressões contraditórias se exercem sobre o Trabalho. Ou seja:
---Por um lado, numerosos elementos se conjugam para ir para um trabalho mais “moderno”, isto é, um Trabalho de conteúdo mais interessante, permitindo aos trabalhadores desenvolver trajectórias ascendentes, fazendo mais apelo às suas competências e, permitindo-lhes continuar a aprender, todo ao longo da sua vida, um trabalho melhor integrado na vida e, de algum modo, mais formulado, no âmbito da sua organização, mesmo, tomando em conta os outros papéis dos assalariados, um Trabalho dotado de mais sentido e, susceptível de permitir aos indivíduos de poder exprimir os seus talentos respectivos.
E, explicitando assertivamente:
a) Na qualidade dos elementos que militam para tais mudanças, para um trabalho mais “moderno”, mais decente, mais sustentável, temos em consideração a irresistível vontade das mulheres de se inserir, se manter e progredir no emprego (enquanto são portadoras de uma conexão, necessariamente mais equilibrada no trabalho por causa das outras funções que lhes foram, até aqui, incumbidas) e a necessidade de elevadas taxas de actividade feminina para financiar a protecção social e contribuir para o crescimento.
b) Consideremos, identicamente como um elemento favorável as possibilidades as quais abrem as mudanças demográficas anunciadas que poderiam transmitir aos assalariados margens de negociação e incitar os empregadores a propor postos mais em conformidade com as aspirações das pessoas. Neste mesmo tipo de argumentação, temos em conta, por conseguinte, outrossim, o desejo das jovens gerações de possuir um trabalho “interessante”, permitindo um verdadeiro equilíbrio entre vida profissional e vida familiar com a recusa relativa dos jovens, desde presentemente, de assumir qualquer tipo de trabalho, designadamente os que em que as condições de trabalho e os salários respectivos são pouco alternativos, os ofícios em cadeia, fatigantes, repetitivos, dotados de pouco sentido ou permitindo pouca oportunidade para desenvolver a criatividade.

(II)
De anotar e sublinhar, por outro, que numerosos elementos se conjugam, identicamente para fazer do trabalho uma mera variável de ajustamento, cada vez menos protegida e, cada vez mais e mais, dócil, flexível, maleável. De acrescentar, que a globalização, o financiamento da Economia, a persistência de um desemprego massivo, a inadaptação do direito, o predomínio das lógicas económicas, a ausência de demonstração dos custos humanos e sociais engendrados pelo facto de tratar o trabalho como uma “coisa”, alimentam esta tendência.

(III)
De feito, aparece (claramente), presentemente que o novo rosto do Trabalho dependerá para muitos da capacidade dos países europeus em construir novo modelo social virado para bens e serviços de elevado valor acrescentado, a mobilização de trabalhadores altamente educados e, tanto mais produtivos como o seu próprio trabalho será bem integrado na sua vida, apoiado em trajectórias e mobilidades profissionais facilitadas, realimentadas por etapas de formação todo ao longo da vida, permitindo garantir a sua prospecção. Todavia, dependerá, outrossim, da capacidade da Europa em relançar o crescimento, um crescimento de qualidade durável, por conseguinte, da sua capacidade em se tornar efectivo um verdadeiro direito ao trabalho para todos, direito objectivo apoiado em instituições e políticas activas, como acontece, por exemplo, no caso concreto, nos Países do Norte.

(IV)
Conquanto, alguns países europeus, designadamente, a França se esforça, por vezes, em considerar o que se faz nos países do Norte, como uma curiosidade impossível de se aclimatar num “grande País”, estes últimos constituem uma oportunidade para reflectir, visto que apresentam elevadas taxas de actividades femininas, uma verdadeira integração do trabalho e da vida e uma capacidade para assegurar, ao maior número um direito real ao trabalho ao longo da vida: As razões desta excelência são, evidentemente a procurar, por um lado, na elevadíssima taxa de sindicalização dos assalariados e na capacidade em passar amplos compromissos sociais e, por outro, do lado do modelo específico de protecção social, modelo “social-democrático”, modelo, aliás, que visa não unicamente a indemnizar as pessoas na ocorrência de um risco, outrossim, porém, em “equipá-las” para toda a sua vida, outorgando-lhes a possibilidade concreta para exercer um trabalho através de políticas activas e de uma oferta importante, no âmbito de serviços sociais.
Dos três (3) tipos de regímen de protecção social, é o que acorda aos indivíduos a mais elevada capacidade para se libertar da dependência do mercado, por direitos sociais amplos. Neste modelo, as prestações são financiadas por imposto, sendo o objectivo central deste regímen de protecção social: o de uma redistribuição igualitária.
Exerce, por conseguinte, um efeito unificador sobre a estrutura social. De consignar, todavia, neste particular, se permite a cada (homem e mulher) exercer o seu direito ao trabalho, não se afirma menos excessivamente preocupado com reconhecer aos indivíduos a possibilidade concreta de possuir outras fontes de identidades, outras ancoragens para exercer outras actividades.
Paradoxalmente, a promoção de um trabalho de qualidade poderá, obviamente, ser obtida, concomitantemente que uma determinada relativização do trabalho, considerado menos como uma fonte de prestígio e de poder, uma arena, onde os indivíduos se confrontam e estão em competição, que (como um dos modos de participar na vida social) se realizar e ser útil.

(V)
O Conteúdo de verdade, que emana, em substância, do arrazoado, ora, acima, enunciado, significa que não se atinge, sem dúvida, a uma visão mais cooperativa e mais apaziguada do trabalho se não revemos, em profundidade, os indicadores que servem para medir a riqueza das nossas sociedades e os progressos do seu desenvolvimento respectivo. De feito, não estar a par das evoluções de uma sociedade que pelo auxílio do único PIB (por conseguinte, do único incremento do volume e do preço dos bens e serviços permutados no mercado), dá, evidentemente uma ideia substancialmente empobrecida do que é a vida social e a vida “tout court”. De consignar, no entanto, que possuir um robusto PIB, ou uma robustíssima produção jamais permitirá, a cada momento, ter uma sociedade relativamente igualitária, possibilidades para todos de ter acesso ao emprego, possibilidades reais de tempo para participar na vida pública ou na vida familiar, um ambiente de qualidade, relações sociais pacificada, um elevado nível de Educação e de Cultura para todos.
Com efeito, mensurar os Progressos de uma Sociedade (apenas pelo aumento da produção), é olvidar que esta pode, concomitantemente deteriorar ou destruir uma parcela da riqueza desta sociedade. A actividade, que faz a produção, o Trabalho, importa, no mais elevado grau. Todavia, as demais outras actividades, outrossim e, ainda, os outros “patrimónios colectivos”, identicamente e, quiçá é preciso que a lógica se saia bem e se recordar que, no fim de contas, o Trabalho é para o Homem e as Sociedades nas quais vive, apenas um meio e não um fim.

(VI)
Donde e daí, de sublinhar, que ele importa, por conseguinte, absolutamente, não apenas para tornar o Direito ao Trabalho (e, ao trabalho decente), efectivo e melhorar, continuadamente as condições de trabalho das pessoas (sendo este expressão, entendida, na sua acepção mais lata). No entanto, ele importa, identicamente se desfazer de uma ilusão que poderia nos ser fatal, que consiste em pensar que, graças em melhorar estas condições, quiçá, repelindo o TAYLORISMO, poder-se-ia reencontrar o TRABALHO, na sua pureza, que seria o equivalente do lazer e, para melhor dizer, que seria pura potência de expressão de si, pura cooperação, pura produção da sociedade, sem constrangimentos.
(Em tempo útil, de anotar que TAYLORISMO é sistema de organização do trabalho concebido pelo engenheiro norte-americano, Frederick Winslow TAYLOR (1856-1915), com o qual se pretende alcançar o máximo de produção e rendimento com o mínimo de tempo e de esforço)
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Trata-se, no caso presente, nada mais, nada menos que uma ilusão, visto que atrás do TAYLORISMO e as actuais condições de trabalho, nenhuma época áurea que se poderia encontrar, em que o trabalho seria exclusivamente manual, exclusivamente intelectual ou totalmente autógeno e mudaria, desde então de natureza.

Continua na próxima ELOCUBRAÇÃO, ou seja na TRIGÉSIMA TERCEIRA.

Lisboa, 07 Fevereiro 2010
KWAME KONDÉ
(Intelectual/Internacionalista --- Cidadão do Mundo).
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