sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

ELOCUBRAÇÃO VIGÉSIMA SEXTA:

Parte Segunda:

“Ser culto es el único modo de ser libre”
José MARTÍ (1853-1895)


(1) Se aceitarmos uma tal abordagem das fases de mundialização como relevando desta Sinergia entre a “expansão geográfica” e a “mudança institucional” conducente à mais Mercado, é então, sem dúvida, possível relevar, antes mesmo dos meados do século XIX, outros processos de mundialização: E, explicitando, adequadamente:
a) Parece um dado adquirido que a Revolução Industrial, na sua primeira fase (1750-1830) deve muito ao novo domínio dos mares conquistado pela Grã-Bretanha (a qual rentabiliza as inovações técnicas, fornecendo as matérias-primas, em quantidade significativa e, oferecendo novos destinos, trazendo um capital substancial à primeira Economia Industrial).
b) Para o economista e sociólogo alemão, Max WEBER (1864-1920), esta Revolução Industrial é nada mais, que a chegada à maturidade do Capitalismo (as seis condições WEBERIANAS necessárias conducentes a uma procura racional do lucro, estando, enfim, reunidas), em outras palavras (servindo-se de outra expressão, para melhor dizer), uma etapa decisiva na progressão da regulação mercantil. Donde e daí, no âmbito desta configuração histórica, a sinergia actuaria, sem dúvida, mais no sentido de uma influência determinante da expansão geográfica no aprofundamento da regulação mercantil (sobretudo, ainda assim, no interior da economia nacional britânica).
c) Todavia, outros períodos revelariam, sem dúvida, uma idêntica influência unívoca, designadamente:
1) Os Países Baixos criam, deste modo, as instituições da sua economia nacional de mercado graças à um evidente domínio nos comércios na Europa e na Ásia, pelo menos, na primeira metade do século XVII.
2) Demais, de anotar, que formas de mundialização são, quiçá, observáveis, muito mais cedo, desde o nascimento do Estado na Mesopotâmia que se acompanha do impulso de um comércio de longa distância, com a Anatólia e o Golfo Pérsico, de um aumento da produção, de uma diversificação da divisão social do trabalho.
d. Enfim e, em suma: estas formas, enunciadas manifestam uma primeira procura racional do lucro e mostram o desenvolvimento de um mercado da terra e do assalariado, no IIIº milenário, em tudo, em conexão com o advento do interesse sobre dívidas e empréstimos comerciais (paralelamente ao veículo monetário que representa o metal prata…).

(2) De feito, a História Global, tal como aparece na Literatura se assume à evidência, muito mais rica, que a história dos processos de mundialização, designadamente reduzida à sua dimensão económica. Trata-se, com efeito, das redes de permutas globais, pacíficas ou violentas, em função dos seus fluxos característicos (bens, serviços, capitais, informação, populações) e consoante a sua morfologia (extensão, configuração hierárquica ou rizómica), tendo em conta, formas de interacções instituídas entre os parceiros de permutas.

(3) Eis porque, o Estudo destas últimas formas (acima enunciadas), relevam, deste modo, sob dois (2) registos
a) Por um lado, a sua frequência, a sua intensidade, o seu carácter directo ou indirecto, a sua temporalidade;
b) Por outro, a sua lógica interna (reciprocidade, redistribuição, comercialização, depredação, protecção, transmissão, etc.).
c) Deste modo, o mercado só representa uma das modalidades da permuta com o exterior (os tributos milenários próprios no âmbito da esfera Chinesa, o imposto devido à Roma pelas suas periferias, as permutas diplomáticas entre Estados, as permutas à preço administrado pelos poderes políticos Egípcio e Carolíngio, as permutas de rapina de algumas companhias comerciais ocidentais, no século XVII ou ainda, o comércio a “tiros de canhão” do século XIX), não relevam do Mercado. Neste sentido, a História Global se assume, por conseguinte, mais ampla que a mera análise dos processos de mundialização e dos progressos da regulação mercante.
d. De feito, de anotar, que ela toma em conta a natureza das conexões do poder e, se interessa, assim como, às redes religiosas, como outrossim, às transferências de técnicas para longa distância e às reaquisições tecnológicas resultantes destas transferências, obviamente.

(4) A História global trata, outrossim da adopção de certos consumos (e, designadamente dos desvios de uso de alguns produtos, caso do chocolate ou do açúcar), ou ainda da difusão de plantas e culturas alimentares com os efeitos DESESTRUTURANTES ou REESTRUTURANTES que os acompanham, tanto na sociedade de partida, como na de chegada.

(5) Procura identicamente, a delimitar os fluxos planetários de matais preciosos e os seus determinantes, mostrando, por exemplo que a produção de prata no México e na Bolívia, no século XVI, corresponde à uma solicitação Chinesa mais que Europeia. Estuda os Actores destes elos/vínculos de longa distância, em particular as “Diásporas” (Judaica, Arménia, Dioula, Swahilie…) que fizeram o Comércio Afro EUROASIÁTICO durante cinco (5) milenários e cujas as práticas estão muito longe de se identificar às dos membros das “companhias das Índias orientais”, Britânica ou Holandesa do período mercantilista.

(6) Enfim e, em suma: À História Global se interessa, aliás, outrossim e, ainda, as Inovações Institucionais. Concretamente, neste particular, vale a pena, consignar, que o Professor H.G. NIEMEYER mostrou, que os poleis Gregos emprestaram aos Portos fenícios o alfabeto, reelaboraram, outrossim, determinados princípios organizacionais “quiçá a ideia mesma de polis”. De feito, não existe, todavia, um campo de pesquisa, que não seja susceptível de constituir o objecto de um estudo histórico global. É a articulação de esferas dissemelhantes de actividades sociais, na encruzilhada de escalas de interacções geográficas e de temporalidades múltiplas, que caracterizam fundamentalmente este tipo de abordagem.

(7) E, rematando, de modo dialecticamente consequente, experimentando identificar as sinergias entre os dissemelhantes contactos, permutas ou transferências, a História Global, se assume, por conseguinte algo de mais amplo que a história dos processos da mundialização. Pode, deste modo, pela sua perspectiva contribuir para esta. Analisando, as Instituições das trocas, no quadro de monografias precisas e, numa intenção de cotejo, traz um material precioso para o Estudo dos vínculos/elos entre expansão geográfica e construção do Mercado. Demais, mostrando as vias pelas quais se constitui um embrião de Sociedade global (homogeneização relativa das técnicas, difusão dos modelos de consumo, circulação dos significantes culturais ou religiosos, cruzamento das populações), a História Global elucida os processos de “mundialização cultural”.

Lisboa, 31 Dezembro 2009
KWAME KONDÉ
(Intelectual/Internacionalista --- Cidadão do Mundo).
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