quinta-feira, 11 de junho de 2009

KWAME KONDÉ

INTERVENÇÃO QUADRAGÉSIMA QUINTA:


Para Principiar:

A emergência da África homicida é uma responsabilidade de Porvir. Compreender para explicar e tratar as problemáticas relevantes do nosso Continente passam pela equação de uma infinidade de variáveis. Isto exige e necessita, ipso facto, um hercúleo trabalho de reflexão e de implantação de propostas acerca do nosso devir colectivo. Deste modo, aliás, no âmbito desta dinâmica, ora enunciada, lançar um olhar, sem complacência, sobre a história africana e sobre a sua alma profunda devolve duas imagens contraditórias, designadamente:
-- Por um lado, uma imagem “papão” e funesta restituída pelos médias de massa;
-- Por outro, a portadora de esperança e selo de dignidade inspirada da maat faraónica e da mogoya bambara.
A despeito dos imensos desafios e reptos, despontam no horizonte, sinais anunciadores de renascimento. Renascimento tanto mais possível, pois que a “Mundialização”, apesar dos efeitos negativos, oferece a oportunidade e o ensejo para a construção de um outro destino e desígnio respectivo com a condição de se adaptar, resistindo, com uma eficácia consequente.
De consignar, que esta dupla dinâmica ora enunciada, na aparência, assimétrica, visa um único objectivo: O reforço solidário. Este, por seu turno, não é uma ideologia, ainda menos, uma concepção congelada. De feito, o uso, os contextos e as experiências conseguidas em África e algures fixarão as regras e o modo de funcionamento. Este se deseja evolutivo e aberto, pois que a sua essência, de fundo e primordial é inspirar para a acção.
Trata-se, enfim, de uma oportunidade de transportar solidariamente uma ambição inovadora, melhor adaptada aos egrégios desafios/reptos da nossa época. Por outro, não poderia, aliás, pôr em causa as identidades nacionais robustas. Muito, pelo contrário, abre-lhes uma outra avenida menos caótica. Ainda por cima, coloca ao seu serviço um poderoso vector de alerta/aviso da consciência africana e da democratização, na sua assunção, mais elevada e genuína, da própria governação.

(1)
Durante, mais de meio século, aproximadamente, a África viveu numa miragem de certezas quase instintiva cuja a mais distinta corresponde à noção do “cada um por si”. De feito, um tal individualismo, ingenuamente mais confiante, edificado sobre as bases de uma ascensão, mais célere, releva de uma ilusão evidente, tanto mais que cria as condições para um exercício absoluto do poder.
Esta visão ilusória, assaz redutora, conduziu ao impasse institucional e à inércia, ao naufrágio económico, à exacerbação da fragmentação territorial e a desigualdades intra nacionais e inter-regionais.
Engendrou, por outro, com efeito, um contexto inédito em África, onde se telecopiam desafios avultados e apreciáveis de natureza e de escala dissemelhantes. Eis porque, se afigura, quão difícil restituir os múltiplos efeitos e interacções respectivas oriundos, como corolário lógico, de tais reptos, que participam de uma idêntica mecânica global da derrota/falência/ruína generalizada.

(2)
Donde, para responder a estes desafios, concomitantemente, estratégicos e urgentes, em tempo útil e oportuno, com uma eficácia, quão assumida, requer muita audácia, vontade férrea e humildade respectiva. Não se trata menos que de pôr em causa, o nosso modo de ver, de actuar, agindo e de prosseguir sobre o longo prazo para crer, acreditando em futuros, assaz melhores. O que supõe, aliás, obviamente, a assunção em nosso proveito, da acertada visão do conceituado filósofo alemão (um exímio historiador do gnosticismo), HANS JONAS (1903-1993), ou seja: “a responsabilidade para outrem”. O que significa, acima de tudo, que devemos ser dextra e abertamente audacioso (s) e determinado (s) e dar a voz a vontade para falar, o mais eloquentemente possível.

(3)
Não há dúvida nenhuma, efectivamente que é possível, renascer das cinzas, dotando-se de ambições vastas e amplas, aliando o progresso social à prosperidade económica e “governá-las doutro modo, aliás”. A este respeito, uma governação baseada na edificação de novas territorialidades concertadas e aprazadas e, outrossim e, ainda, uma restauração completa da integralidade das novas conexões com a comunidade internacional, abre, ipso facto, uma outra avenida portadora de esperança.
De feito, se impõe sublinhar, que as demagogias incessantemente destiladas nos precipitaram numa anfractuosidade abissal. Donde e daí, urge desarraigar do declive da decadência, propondo uma alternativa apta a responder, com eficácia aos desafios/reptos convergentes que interpelam a África contemporânea.
No fundo, no fundo, hoje mais que nunca, temos necessidade de ter coragem assumida, quite para virar de baixo para cima, assertivamente as verdades impostas pelo pardo tempo, o mimetismo cego e o conformismo contra-produtivo.

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E, finalmente, em jeito de remate assertivo: Uma nova África é necessária. Deve ser, obviamente a filha eleita de uma vontade comum, esteando, numa robusta convicção partilhada, de uma visão estratégica luminosa e, outrossim, de uma definição judiciosa das respostas coordenadas aos desafios/reptos e às ameaças respectivas susceptíveis de as de levar de vencida, se não forem domadas e, bem assim, as barragens, as mais betonadas possíveis. Eis, sim, efectivamente, o sentido da restauração e renovação, a levar a cabo, ao serviço da esperança e da grandeza africana.
Constitui, seguramente, outrossim, uma forma inteligente de se revoltar e de fazer uma introspecção apropriada a respeito dos nossos percursos, assaz caóticos.
Na verdade, são os fundamentos, ora enunciados que outorgam o nosso Continente, o berço da Humanidade e, outrossim e, ainda berço da Escrita, uma oportunidade única de transportar colectivamente uma ambição prestigiante, acelerar as indispensáveis mutações estruturais e, quiçá poder desempenhar um papel fulcral à altura da sua real dimensão e envergadura respectiva, no âmbito da História da Humanidade.

Lisboa, 10 Junho 2009
KWAME KONDÉ
(Intelectual Internacionalista — Cidadão do Mundo).
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