INTERVENÇÃO QUADRAGÉSIMA QUARTA:
(…)
(…)
“Deixemos de histórias: toda a gente sabe que
os cabo-verdianos, negros, mestiços ou de pele branca,
são africanos de uma colónia africana de Portugal.
Para aqueles que porventura não saibam onde fica
Cabo Verde basta que olhem bem para um mapa.
Para aqueles que não conhecem Cabo Verde, basta
dizer-lhes que a sua população é constituída de 97%
de negros e mestiços e apenas 3% de gente branca,
Incluindo os europeus”. (…)
“Mas não é demais lembrar que a população de
Cabo Verde provém fundamentalmente de escravos
levados da Guiné e da costa ocidental africana”. (…)
“É bom afirmar sem rodeios que, mesmo que em
Cabo Verde houvesse uma população nativa cuja maioria
Tivesse pele branca, como acontece nos países da
África do Norte (Argélia, Marrocos, Tunísia, etc.) os
Cabo-verdianos não deixariam de ser africanos”. (…)
Extractos respigados do Manifesto (Carta Aberta) “Aos Cabo-verdianos residentes na República do Senegal”, da autoria de
Amílcar CABRAL, vindo a lume no ano de 1961.
(II)
“J’appartiens au grand jour”proclama eloquente e veementemente o Poeta camaronense/camaronês, Paul DAKEYO (Doutor em Sociologia, identicamente Editor), nascido no ano de 1948, um dos críticos mais ácidos da Négritude de SENGHOR.os cabo-verdianos, negros, mestiços ou de pele branca,
são africanos de uma colónia africana de Portugal.
Para aqueles que porventura não saibam onde fica
Cabo Verde basta que olhem bem para um mapa.
Para aqueles que não conhecem Cabo Verde, basta
dizer-lhes que a sua população é constituída de 97%
de negros e mestiços e apenas 3% de gente branca,
Incluindo os europeus”. (…)
“Mas não é demais lembrar que a população de
Cabo Verde provém fundamentalmente de escravos
levados da Guiné e da costa ocidental africana”. (…)
“É bom afirmar sem rodeios que, mesmo que em
Cabo Verde houvesse uma população nativa cuja maioria
Tivesse pele branca, como acontece nos países da
África do Norte (Argélia, Marrocos, Tunísia, etc.) os
Cabo-verdianos não deixariam de ser africanos”. (…)
Extractos respigados do Manifesto (Carta Aberta) “Aos Cabo-verdianos residentes na República do Senegal”, da autoria de
Amílcar CABRAL, vindo a lume no ano de 1961.
(II)
No entanto, o que mais importa, obviamente, é que, na verdade, para além do essencialismo das teorias raciais e da ilusão da solidariedade vinculada à cor suposta da pele, existe, sobretudo a activa e imparável erosão do tempo que passa. Donde e daí, a pertinência das questões seguintes:
--- Com efeito o que existe entre a filosofia de vida da multimilionária afro-americana de Chicago, a OPRAH WINFREY e a das senegalesas emigradas que vendem bibelots nas ruas de Nova Iorque ou de Dacar?
--- Outrossim, o que existe de comum entre um Barach OBAMA (nascido de um pai queniano, que praticamente não conheceu) e de uma mãe norte-americana do Kansas, que o educou no Hwai e na Indonésia e os seus irmãos e sobrinhos de Nairobi, que nem sequer ele sabia da respectiva existência e com os quais jamais manteve relações familiares?
--- Enfim, o que significa a biologia num mundo, onde o negro e o branco se declinam numa paleta infinita de cores?
E, concluindo avisadamente, na verdade, o mito da homogeneidade racial do mundo negro e das visões do Mundo, que supostas daí emanam não resiste à análise, e, por que não, outrossim à uma exegese objectiva.
E, prosseguindo, dextramente esta nossa elocubração, se nos afigura pertinente, consignar, que os Africanos actualmente são amiúde, autênticos cidadãos do Mundo, mesmo quando não abandonaram o seu território de nascimento. E, explicitando um pouco melhor as nossas ideias, temos que:
-- Deste modo, eis porque, os progressos tecnológicos e os desenvolvimentos da comunicação permitem (doravante, de hoje em diante, para o porvir) a camponeses cabo-verdianos conhecer, concomitantemente, as decisões e comportamentos respectivos dos agricultores zimbaubianos ou indianos.
-- Identicamente, os estudantes camaronenses podem acompanhar através da Internet todos os cursos de economia que ministram os professores do Massachussetts Institute of Technology em Bóston.
-- Enfim, militantes dos direitos humanos no Gana podem seguir praticamente em directo nas cadeias de televisão, a evolução da situação política no Darfur ou na Etiópia.
Na verdade, verdade, o Mundo se encontra, realmente, muito, muito mais, mesmo, acessível que há meio século atrás. E, como corolário lógico de tudo isto, os nossos imaginários extraem, muito mais que não se acredita, no património filosófico desse Mundo, de que todos nós, sem excepção, fazemos parte integrante, absolutamente. Eis porque, a Négritude, como filosofia de vida não poderia, hoje, nos nossos dias, ser o que fora outrora, por motivos óbvios.
Aliás, é no âmbito desta dinâmica e perspectiva respectiva, que o insigne historiador camaronês, Achile MBEMBE (n-1957) fala de um “afropolitanisme” que designaria a emergência de uma nova sensibilidade cultural, histórica e estética, da “conscience de cette imbrication de l’ici et de l’ailleurs, la présence de l’ailleurs dans l’ici et vice versa, cette relativisation des racines et des appartenances primaires, et cette manière d’embrasser, en toute connaissance de cause, l’étranger et le lointain, cette capacité de reconnaître sa face dans le visage de l’étranger et de valoriser les traces du lointain dans le proche, de domestiquer ‘in-familier, de travailler avec ce qui a tout l’air des contraires ».
Eis porque, como milhões de demais outros Africanos, sentimos sobremaneira, o herdeiro desta longa tradição de permutas que invalida todo feitichismo (idolatria/veneração) biológico e racial. De feito, não há dúvida nenhuma, que as civilizações não são partículas químicas estanques. Dito isto, algumas gerem melhor o processo de fusão absorção do que outros. Destarte, aliás, ninguém diria, por exemplo, que a China já não é “chinesa” porque, em cinco mil anos de história, integrou costumes e hábitos da Ásia Menor ou do Japão.
Na verdade e, na realidade, a imbricação do aqui e do algures em cada um de nós é um facto óbvio e inegável, porém, não se opera com idêntica intensidade, por toda a parte, e, os seus resultados não são, ipso facto, uniformes. Demais, por motivos e razões assaz óbvios, o fenómeno que consiste em se fundir em culturas oriundas de algures não atinge toda a gente e, decerto, não em idêntico grau. E de resto, aliás, se todos os cidadãos tivessem os mesmos backgrounds culturais, acabaríamos rapidamente por tornar idênticos. Deste modo, no âmbito desta dinâmica, a mestiçagem cultural já não teria razão de ser.
Donde e daí, como remate pertinente, definimos, por conseguinte, como autêntico cidadão do Mundo, obviamente, porém, Cabo-verdiano/ Africano, a despeito de tudo. Sim, efectivamente, é a partir da perspectiva desta “africanidade” sincrética que agimos, actuando, o mais conscientemente possível, outrossim e, ainda, observamos os nossos semelhantes e interpretamos os seus Pensamentos respectivos.
Lisboa, 05 Junho 2009
KWAME KONDÉ
(Intelectual Internacionalista - Cidadão do Mundo).
.
(Intelectual Internacionalista - Cidadão do Mundo).
.