Desde os primeiros tempos de Luís Filipe Pereira como ministro da Saúde do Governo de José Barroso; passando pelo mesmo Luís Filipe como ministro do Governo surreal de Santana Lopes; e continuando, nos três primeiros meses do actual Governo, com o ministro Correia de Campos; a palavra de ordem para o sector da Saúde parece ter sido sempre:
Toca a trabalhar malandros!
Toca a aumentar a produtividade, seus mandriões de uma figa!
E toca de gastar menos dinheiro, seus esbanjadores!
Para conseguir esse desiderato, os dois primeiros governos acima nomeados engendraram e nomearam para dirigir, com sucesso comercial, as linhas de produção das fábricas, perdão, dos hospitais públicos, autênticas administrações fabris - com experiência reconhecida na EDP, na GALP, em fábricas de salsichas, de parafusos, etc. - administrações essas que, na sua acção, primaram pela eficácia (a sério, isto é verdade) adoptando como uma das primeiras medidas a exigência do aumento do número de consultas externas. Outra medida emblemática foi o ultra propagandeado PECLEC (programa especial de combate às listas de espera cirúrgicas).
Atente-se na palavra combate que, no nosso entender, mostra bem o voluntarismo, a certeza, a determinação, a fúria com que se arrancou rumo à vitória e à poupança do erário público.
Agora é que era! Agora é que a produtividade hospitalar ia mesmo aumentar e atingir números mágicos que talvez até os levassem a conseguir lucros fabulosos no mercado da Saúde.
...
As coisas começaram a funcionar como o previsto:
aumentou-se o número de consultas
e aumentou-se o número de intervenções cirúrgicas (que passaram a também poderem ser realizadas pelo sector privado, com o Estado a pagar).
Tic-tac, tic-tac, tic-tac.
O tempo foi passando...
Até que...
- Aqui d’el rei que a despesa está a aumentar!
- Mas afinal o que é isto?!
- O que é que se está a passar?
Foi então que se ouviu uma voz funda vinda lá do cimo da copa de uma azinheira da Quinta Pedagógica:
«O que se passa é muito simples, senhores gestores industriais, salsicheiros e de ferragens.
O que se passa é que:
Mais consultas significam mais receitas médicas.
Mais receitas médicas significam mais medicamentos.
E mais medicamentos significam mais despesa.
Mais consultas significam mais exames complementares de diagnóstico.
E mais exames complementares de diagnóstico significam mais despesa.
Mais cirurgias significam mais gasto de material cirúrgico e de medicamentos;
e significam mais dias de internamento.
E tudo isso junto significa mais despesa.»
«Ai é!? E nós que julgávamos que o aumento de produtividade levava sempre ao aumento dos lucros!» - Disseram em coro as bocas das cabecinhas pensadoras das administrações.
E desde esse dia nunca mais se pronunciou a palavra produtividade nos hospitais.
E as administrações de tipo fabril começam lentamente, e bem, a ser substituídas por outras: talvez menos "eficazes", talvez menos voluntariosas, talvez menos "produtivas". E talvez menos gastadoras.