quinta-feira, 20 de abril de 2006

UMA HISTÓRIA PARA CRIANCINHAS

Desde os primeiros tempos de Luís Filipe Pereira como ministro da Saúde do Governo de José Barroso; passando pelo mesmo Luís Filipe como ministro do Governo surreal de Santana Lopes; e continuando, nos três primeiros meses do actual Governo, com o ministro Correia de Campos; a palavra de ordem para o sector da Saúde parece ter sido sempre:

Toca a trabalhar malandros!

Toca a aumentar a produtividade, seus mandriões de uma figa!

E toca de gastar menos dinheiro, seus esbanjadores!

Para conseguir esse desiderato, os dois primeiros governos acima nomeados engendraram e nomearam para dirigir, com sucesso comercial, as linhas de produção das fábricas, perdão, dos hospitais públicos, autênticas administrações fabris - com experiência reconhecida na EDP, na GALP, em fábricas de salsichas, de parafusos, etc. - administrações essas que, na sua acção, primaram pela eficácia (a sério, isto é verdade) adoptando como uma das primeiras medidas a exigência do aumento do número de consultas externas. Outra medida emblemática foi o ultra propagandeado PECLEC (programa especial de combate às listas de espera cirúrgicas).

Atente-se na palavra combate que, no nosso entender, mostra bem o voluntarismo, a certeza, a determinação, a fúria com que se arrancou rumo à vitória e à poupança do erário público.

Agora é que era! Agora é que a produtividade hospitalar ia mesmo aumentar e atingir números mágicos que talvez até os levassem a conseguir lucros fabulosos no mercado da Saúde.

...

As coisas começaram a funcionar como o previsto:

aumentou-se o número de consultas

e aumentou-se o número de intervenções cirúrgicas (que passaram a também poderem ser realizadas pelo sector privado, com o Estado a pagar).

Tic-tac, tic-tac, tic-tac.

O tempo foi passando...

Até que...

- Aqui d’el rei que a despesa está a aumentar!

- Mas afinal o que é isto?!

- O que é que se está a passar?

Foi então que se ouviu uma voz funda vinda lá do cimo da copa de uma azinheira da Quinta Pedagógica:

«O que se passa é muito simples, senhores gestores industriais, salsicheiros e de ferragens.

O que se passa é que:

Mais consultas significam mais receitas médicas.
Mais receitas médicas significam mais medicamentos.
E mais medicamentos significam mais despesa.

Mais consultas significam mais exames complementares de diagnóstico.
E mais exames complementares de diagnóstico significam mais despesa.

Mais cirurgias significam mais gasto de material cirúrgico e de medicamentos;
e significam mais dias de internamento.
E tudo isso junto significa mais despesa

«Ai é!? E nós que julgávamos que o aumento de produtividade levava sempre ao aumento dos lucros!» - Disseram em coro as bocas das cabecinhas pensadoras das administrações.

E desde esse dia nunca mais se pronunciou a palavra produtividade nos hospitais.

E as administrações de tipo fabril começam lentamente, e bem, a ser substituídas por outras: talvez menos "eficazes", talvez menos voluntariosas, talvez menos "produtivas". E talvez menos gastadoras.